Editorias, Opinião

É sempre tempo de (não) mudar

Pensaste tudo o que tinhas a pensar. Equacionaste todos os teus movimentos, todo o teu futuro. Ele chegou. E agora descobres que já não te faz sentido, recusas essa tua projeção cuidada e polida em detrimento da realidade, esse traiçoeiro e incoerente aglomerado de incerteza. Voltas a pensar, desta vez a olhar para o chão e não para trás; percebes como as circunstâncias mudaram, como tu mudaste. As tuas cartas já não dão o mesmo jogo, e está tudo bem. Não fazeres nada também é uma escolha, difícil por sinal. Importante. Imprescindível.

A consciencialização de que às vezes é preciso não fazer nada, não trocar o bem de agora pelo talvez do depois, é a melhor coisa que podes aprender. Aceita a imutabilidade, a imobilidade, a petrificação do ato. Aceita o congelamento, e, mais importante, aceita que a tua vida não é uma estória de um livro, que não tens uma linha de sentido definida e impressa. Podes virar à esquerda quando era suposto ires em frente, podes fazer inversão, podes voar se te apetecer. Para. Percebe se este é o momento de avançar ou de ficar suspenso nas coisas que te dão prazer, nas coisas que te fazem sentir vivo. Sê um equilibrista se é isso que te faz feliz e que te permite encher a coisa mais bonita que podes ter: o teu sorriso.

Não temas dizer que não após aceitares, aceita que o compromisso se faz primeiro connosco e só depois com os outros. Não leves algo até ao fim quando te perdes durante esse caminho, não aceites fazer cair pedaços de ti para manteres os dos outros. Compreende que navegamos num oceano sem mapa, e que os ventos não sopram sempre para o mesmo lado, têm mudanças: às são vezes cruzados, outras vezes são contrários. Por favor, não te forces sempre contra o vento, não insistas só porque sim, porque és um homem de palavra, se todas as tuas palavras pensadas e não ditas dizem exatamente o oposto.

Decidi ficar, agarrar-me ao que tenho, e é tanto, é tudo. A nossa natureza ordena uma insatisfação constante e impossível de expelir. É essa rejeição do mundo que permitiu grandes avanços e a nossa própria sobrevivência, mas nem sempre ceder ao instinto humano é produtivo, temos demasiados casos que o provam. Às vezes é necessário dizer que não internamente, rejeitar essas construções fictícias, utópicas, destrutivas. Gritar essa decisão cá para fora, expeli-la como se de uma purga se tratasse, como se corrompesse cada artéria do teu corpo, e fosse enfim possível expulsá-la de ti.

Não. Não. Se te faz adormecer mais tarde e te acordar durante o sono, não. Se quando acordas o dia parece opressivo, como se te pressionasse contra a cama, contra essa oportunidade irreparavelmente única que é a vida, se te força a desejar esse estado de dormência, então não. Definitivamente e irrevogavelmente não.

Pensaste tudo o que havia a pensar. Equacionaste todos os “agoras”, todas as dimensões inerentes ao próximo instante. Ele chegou. E finalmente faz sentido.

“O João Garrido escreve ao abrigo do novo acordo ortográfico”