13 Reasons Why – Por Detrás das Cassetes
Nesta segunda parte desta análise, vamos fugir um pouco dos temas centrais da série e dar ênfase a outros problemas e temáticas que vão sendo, de forma igualmente direta e crua, apresentados e desenvolvidos na série.
Em primeiro lugar, a estratégia utilizada para contar a história. A alternância entre dois tempos distintos: o passado, relatado nas cassetes pela voz de Hannah, e o presente, onde Clay se dirige aos locais referidos nas cassetes, à medida que as vai ouvindo, e ainda o impacto que esses relatos têm na vida das pessoas que as ouvem. Isto contribui para que a história não seja ouvida apenas de uma perspetiva, a de Hannah, ou seja, são-nos apresentadas as reações, as razões e as perspetivas das restantes personagens, mostrando assim a realidade e a verdade de cada um. Isto permite-nos ficar a conhecer melhor todas personagens, perceber o porquê das suas ações e até criar alguma empatia para com algumas delas, apesar de os erros que cometeram.
Isto leva-me a outro ponto que acho ser fulcral: o rompimento das personagens-tipo. Sempre que ouvimos falar de filmes americanos que se passam durante o secundário estamos sempre habituados a ver o mesmo tipo de personagens: os populares, os atletas, os nerds e os “invisíveis”. E estes tipos dividem-se em duas categorias: os bons e os maus. Mas em 13 Reasons Why não há bons nem maus. Cada personagem tem os seus problemas, tem uma forma de pensar, background, emoções, essência. Desta forma há uma maior imersão por parte do público nas personagens e no enredo.
Para além disso, 13 Reasons Why não se mostra indiferente à comunidade LGBT e aos seus problemas apresentando até uma nova perspetiva aos problemas de quem pertence a esta comunidade. É representada ao longo da série de forma já natural e sem ser necessário a personagem dizer explicitamente: “Eu sou gay/lésbica/bissexual”. Contudo, além das dificuldades sempre presentes no que respeita ao facto de terem de assumir a sua sexualidade, especialmente na idade adolescente, é apresentada uma nova vertente, que é o facto desses adolescentes terem sido criados por pais homossexuais. É apresentada a ideia de que os pais desses jovens já lutaram tanto para terem os seus direitos reconhecidos e aceites, e numa altura em que tudo está mais calmo, a homossexualidade dos seus filhos traria de volta o problema pelo qual os pais tiveram tantas dificuldades em ultrapassar, trazendo à superfície todos esses anos complicados que os pais tiveram que enfrentar. É uma perspetiva muito interessante, que admito nunca ter tido em conta antes.
E, como estamos a falar de adolescentes, é impossível não se falar de tecnologia. Até aqui, 13 Reasons Why deixa uma mensagem e, consequentemente, uma crítica. Quando vi o primeiro episódio da série, admito que fiquei extremamente confuso. Senti que estava a ver algo na mesma linha temporal de Stranger Things, ou seja, década 70 ou 80. Isto aconteceu por coisas pequenas e simples, como o facto de Clay andar de bicicleta, de Tony Padilla (Christian Navarro) conduzir um Mustang em perfeito estado e de só ouvir música em cassetes dentro do carro e no walkman fora do mesmo. O facto de a Hannah ter gravado as suas mensagens em cassetes e não em simples ficheiros de áudio mp3 é também uma forte razão, bem como o facto de Tyler Down (Devin Druid) preferir revelar as suas fotografias através dos negativos em vez de recorrer ao simples processo de impressão. Mas depois percebi que esta antagónica mistura entre o atual e o antigo é uma crítica à tecnologia, cada vez mais indispensável à nossa rotina: é-nos apresentada a “sociedade de stalkers”, uma sociedade construída e alimentada por nós ao estarmos a partilhar e a atualizar os outros da nossa vida pessoal ao minuto nas redes sociais. Abrimos a porta da privacidade ao mundo e, mais do que isso, gostamos da atenção que ele nos dá. Já não conseguimos viver sem ela.
No entanto, nem tudo em 13 Reasons Why é perfeito. Por vezes, a série torna-se demasiado longa. Consigo compreender a ideia de “13 cassetes em 13 episódios”, mas a verdade é que algumas das cassetes não tinham conteúdo suficientemente forte ou interessante para preencher um episódio de 50 minutos, o que acabou por deixar a sensação de que algumas partes estavam ali só para “fazer tempo”. Um excelente exemplo disso é o número exagerado de vezes que ouvimos Clay afirmar que não é capaz de continuar a ouvir as cassetes e ameaçar contar a alguém, como os seus pais, da sua existência. Percebo que a ideia aqui era tentar aumentar o drama e o suspense em torno de cada cassete mas recorreram tanto a esta estratégia que a certo ponto a nossa reação já era igual à dos personagens: “Apenas ouve as cassetes, Clay.”
Para terminar, e para aqueles que adoraram a série tanto como eu, há a feliz notícia de que a segunda temporada já está confirmada e, embora ainda não haja data oficial, sabemos que sairá já em 2018. Admito, no entanto, estar desapontado com esta informação. Criar uma segunda temporada é tirar o impacto todo que a série teve. A série gira em torno da história de Hannah. A história dela foi contada. Todos nós a ouvimos e adorámos.
Sei bem que a série acaba de forma demasiado aberta e deixa mais perguntas do que respostas, mas, a meu ver, essa é ainda mais uma razão que torna esta série tão única e especial!
A maioria das séries, quando acabam, deixam sempre aquele sentimento de: “e agora?”. 13 Reasons Why deixou-nos tanto material para refletir. Será que Jessica (Alisha Boe) irá apresentar queixa contra Bryce (Justin Prentice)? Será que Alex sobreviveu? Para onde vai Justin? Para onde vão Clay e Tony? O que dirá Clay no seu julgamento? Que farão os pais de Hannah, agora que finalmente têm acesso às cassetes?
É certo que teremos as respostas a todas essas perguntas na próxima temporada.
Na primeira conhecemos as razões e agora é altura de descobrir as consequências.
Vamos apenas esperar que não estraguem esta maravilhosa série que é 13 Reasons Why.
AUTORIA
Num universo tão vasto como o nosso, quantas são as pessoas que são açorianas (micaelenses), ouvem música todos os dias, não falham um jogo do Sporting, leem livros e veem wrestling? Algumas, reconheço. Mas a pessoa que está a redigir este pequeno texto introdutório chama-se André Medina, tem 20 anos e, há dois anos, embarcou na maior aventura da sua vida.
Sair de casa nunca é fácil, e fazê-lo quando não se sabe cozinhar nem dobrar roupa é ainda mais complicado. Mas, muitas saladas de atum, pizzas do Pingo Doce e noodles depois, aqui estou eu: vivo e no último ano do curso de Jornalismo.
E, em jeito de recompensa por ter sobrevivido a estes duros anos, tive o privilégio de poder ser o primeiro editor da secção de Deporto na MAGAZINE. Eu, uma pessoa que ainda não sabe dobrar uma t-shirt como deve ser.
De qualquer forma, espero poder retribuir a confiança depositada em mim e quero que todos se sintam bem-vindos a esta escola e a este magnífico projeto, que é a nossa querida ESCS MAGAZINE.