Women in Horror: A Evolução da Representação Feminina nos Filmes de Terror
Apesar de controverso, não há qualquer dúvida que o terror está entre os géneros mais populares do cinema. E não, isto não é uma tendência recente. Desde o seu nascimento em 1896, quando Georges Méliès apresentou a curta Le Manoir du diable, que os filme de terror têm cativado plateias com histórias que desafiam os nossos medos mais profundos.
Este género foi também pioneiro na introdução de personagens femininas em papéis centrais nas suas narrativas, apesar de na altura estas não serem consideradas heroínas, muito menos vilãs. A realidade é que a figura feminina surgiu no terror como uma escapatória perversa para a projeção de fantasias sombrias — mulheres frágeis, vulneráveis e aprisionadas, representadas apenas para atrair a compaixão ou os desejos obscuros do público masculino.
Mas, como qualquer outra arte, o terror mudou. As scream queens frágeis e vítimas inescapáveis deram lugar a protagonistas complexas e antagonistas multifacetadas, podendo considerar que atualmente vivemos um “renascimento do terror feminino”, onde se dá espaço a narrativas mais profundas e envolventes em especial para um público feminino.
A evolução da “Final Girl”
O conceito de “Final Girl”, introduzido por Carol J. Cloverno artigo Her Body, Himself: Gender in the Slasher Film” (1987), remete à ideia da protagonista feminina que, contra todas as probabilidades, acaba por derrotar e sobreviver ao assassino. Este conceito popularizou-se no terror clássico em personagens como Laurie Strode em Halloween (1978), Nancy Thompson em A Nightmare on Elm Street (1984) e Sidney Prescott em Scream (1996).
Apesar de à primeira vista nos parecer uma figura de sobrevivência feminista, a narrativa restritiva da clássica “Final Girl” é integralmente enraizada em ideais misóginos. A sua coragem e resiliência, embora inegáveis, eram cercadas de limites — as “Final Girls” eram raparigas que mantinham comportamentos “moralmente corretos” e apresentavam padrões de “inocência” e “pureza”, destacando-se das restantes personagens femininas por não entreterem comportamentos “indecentes”, como o consumo de álcool e drogas ou atividades sexuais.
No entanto, também a “Final Girl” evoluiu de uma personagem passiva e reativa para protagonistas que desafiam diretamente o mal e reivindicam um papel central na narrativa. Atualmente, a sobrevivência destas personagens deixa de estar vinculada a um código de regras conservadoras, ao invés disso, reflete uma exploração da resiliência e complexidade psicológica de cada protagonista. Cada vez mais, vemos a mulher a assumir um papel de poder em vez de submissão, como podemos ver através da personagem Louise Daltonem Speak No Evil (2024) na qual podemos ver a figura feminina a tomar as decisões e a desafiar o assassino em detrimento da figura masculina presente no filme.
Heroína vs Vilã
Como mencionei, mais do que nunca, vemos personagens femininas a inverterem o papel de vítima e tornarem-se figuras centrais da narrativa, onde não só enfrentam, mas, por vezes, também aceitam o mal. O terror moderno desafia as representações de heroínas clássicas, como, por exemplo, Laurie Strode em Halloween que passa de uma adolescente indefesa (1978) para uma sobrevivente proativa (2022).
Ao contrário do que muitos acreditam, as personagens em filmes de terror não enfrentam apenas monstros, assassinos e maldições. Atualmente, exploram-se temas profundamente psicológicos e sociais, onde os próprios traumas e complexidades pessoais são o foco das narrativas, personagens como Margot Mills em The Menu (2022) exemplificam esta transformação.
Nesta nova onda de terror, as mulheres podem também assumir o papel de “monstro” — personagens como Dani Ardor em Midsommar (2019) e Adelaide Wilson, ou Red, em Us (2019) redefinem o papel da vítima ao revelarem protagonistas que encontram libertação em circunstâncias trágicas. Estas histórias não procuram redimir a protagonista nem forçá-la a adotar comportamentos tradicionalmente aceitáveis como vimos no terror clássico. A complexidade das suas trajetórias é o que torna o terror feminino numa experiência tão inquietante e inesperada.
É perfeitamente claro como os conceitos de género evoluíram no mundo do terror, os clichês e excesso de jumpscares foram deixados de lado para abrir espaço a novas abordagens, valorizando as narrativas femininas. O terror passa a ser um espelho da complexidade da experiência humana, transcendendo as narrativas tradicionalmente masculinas.
Fonte da capa: oito milímetros
Artigo revisto por Joana Gonçalves
AUTORIA
Completamente apaixonada pelo mundo e todas as artes que o mesmo lhe pode proporcionar, a Bia viu-se a candidatar ao curso de Publicidade e Marketing na ESCS. Todas as suas paixões levaram-na a perder-se pelo mundo do design enquanto membro de multimédia, ainda no seu primeiro ano, e hoje atreve-se como escritora da editoria "Cinema e Televisão".