Para lá do plástico
Nós criamos e usamos o plástico, descartamo-lo irresponsavelmente, e este chega a rios e oceanos onde são uma pandemia para os seres vivos. Estes foram os temas abordados no artigo do mês passado. Este mês vamos explorar o que acontece aos plásticos que não são ingeridos pelos animais e como o futuro poderá vir a ser se nada mudar.
A maioria dos plásticos presentes nos oceanos são denominados como microplásticos, podendo ser primários ou secundários.
Os microplásticos primários são os microplásticos produzidos pela indústria em tamanhos quase invisíveis e que usamos no nosso dia-a-dia. Estes podem ser encontrados em alguns produtos de cosmética, produtos de limpeza, tintas, pastas de dentes, shampoo e detergentes de roupa, entre muitos outros, e nem temos consciência de que os estamos a usar. O problema destes microplásticos primários é que eles foram desenhados para ir pelo ralo abaixo e pelos canos, e acabam no meio aquático, onde se juntam aos microplásticos secundários.
Os produtos que descartamos irresponsavelmente como sacos e garrafas de água e que acabam nos oceanos são enfraquecidos com a luz solar e partidos com a ajuda das ondas e do vento em pequeníssimos pedaços de plástico (cinco milímetros ou menos) – os microplásticos secundários.
Apesar de tanto os microplásticos primários como os secundários serem de pequeníssimas dimensões, continuam a ser super resistentes e, tal como os restantes, não desaparecem do ambiente, apenas se espalham pelos oceanos com a passagem do tempo. É por esta razão que somos capazes de encontrar microplásticos em qualquer parte dos oceanos. Ao contrário das consequências fáceis de observar dos plásticos grandes, as consequências dos microplásticos são tão subtis e difíceis de identificar como os próprios microplásticos.
Os microplásticos podem sufocar pequenos organismos marinhos que os confundem com comida, ou podem ser ingeridos por animais maiores como os peixes que comemos. Assim, estes microplásticos que são capazes de absorver substâncias tóxicas são introduzidos na nossa cadeia alimentar. Sim, nós consumimos plástico através da comida marinha que comemos, mas não só. Os microplásticos estão em todo o lado: no sal, na cerveja, na água engarrafada e, apesar de ter em média 65 vezes menos microplásticos, a água canalizada também não está imune.
Para piorar, os microplásticos conseguem-se penetrar nas raízes das plantas e viajar até às partes que são consumidas pelo homem. Esta é a ironia do ciclo do plástico, é fabricado pelo ser humano e acaba inevitavelmente nos organismos dele, e a pior parte é que ainda não se sabe ao certo quais os efeitos que os microplásticos que consumimos diariamente têm no nosso organismo.
Se não mudarmos nada na nossa maneira de viver, é certo que irão existir trágicas mudanças no nosso planeta, mas para entender o futuro é importante conhecer o passado – como o plástico surgiu no nosso planeta.
A palavra plástico deriva do grego plastikós que significa flexível e a razão da sua existência deriva das bolas de bilhar. Há alguns séculos atrás as bolas de bilhar eram feitas de marfim, das presas dos elefantes e então, em meados do século XIX, os elefantes começaram a extinguir-se. De modo a impedir a sua extinção, as empresas tentaram encontrar alternativas para a produção de bolas de bilhar.
Em 1863, John Wesley Hyatt juntou-se à busca e criou um material chamado celuloide. Infelizmente, o material era muito leve para fazer bolas de bilhar, porém era capaz de se modificar, ser pintado e padronizado de modo a imitar materiais caros. Este homem, sem querer, criou o primeiro plástico.
O tempo foi passando e a evolução do plástico também. Até aos anos 30, o plástico sofreu variadas mutações para o tornar menos inflamável, como era a celulóide, mais resistente e, ao mesmo tempo, flexível. Em 1933, o polietileno tornou-se um dos plásticos mais versáteis que ainda hoje usamos.
A indústria também se desenvolveu e inventou a técnica de moldagem por injeção, que consiste em injetar o plástico derretido em moldes de qualquer formato. Esta é a razão de termos tantos produtos de plástico de todas as formas possíveis.
O objetivo principal da comercialização do plástico era tornar acessível às pessoas objetos que eram antes inacessíveis em termos de preços. Por exemplo, uma pérola não terá o mesmo valor que uma imitação de pérola feita de plástico. Contudo, o plástico foi altamente produzido e utilizado durante a 2.ª Guerra Mundial. As empresas que surgiram durante a guerra passaram a focar-se em produtos de consumo. Assim começam a surgir as intermináveis embalagens para tudo, seja para charcutaria, legumes ou fruta, sacos de lixo, papel aderente e entre muitos outros produtos, dando início à Era do Plástico.
Esta descoberta foi considerada revolucionária, já que pela primeira vez o Homem criou algo independente da Natureza. Ironicamente, achavam que este desenvolvimento vinha ajudar não apenas o ser humano, mas também o ambiente por poupar os materiais fornecidos pelos escassos recursos naturais.
Desde que a produção em massa de plástico começou, hán60 anos atrás, o Homem já produziu mais de oito biliões de toneladas de plástico, apenas 9% foi reciclado e 12% incinerado, os restantes 80% encontra-se em aterros, lixeiras e nos nossos ecossistemas.
Hoje em dia, cerca de 360 milhões de toneladas de plástico são produzidas por ano, dez milhões de toneladas acabam nos oceanos.
Estima-se que 100 milhões de toneladas de plástico se encontrem nos oceanos, sendo que a maior concentração de plástico no oceano é a ilha de plástico do Pacífico, que tem 17 vezes o tamanho de Portugal.
Em 70 anos conseguimos criar estes danos no ambiente e nos oceanos e, se não pararmos agora, os enormes estragos e catástrofes ambientais já existentes irão apenas piorar e as estatísticas vão ser ainda mais assustadoras, sendo que as existentes já são bastante preocupantes:
O Banco Mundial calcula que, em 15 anos, os resíduos sólidos urbanos, maioritariamente plásticos, dupliquem mundialmente.
Estima-se que, em 2050, teremos mais plástico do que peixes no mar.
Estima-se que, em 2050, 99% de todas as espécies de aves marinhas esteja a ingerir plástico.
Ninguém quer que estas previsões se tornem realidade, mas muito poucos parecem querer realmente mudar o presente. Todos os pequenos atos contam: substituir garrafas de plástico por uma reutilizável, passar a usar escovas de dentes de bamboo, apanhar plástico que esteja no chão e pôr no contentor correto, usar sacos reutilizáveis nas compras, entre outros. Se cada um de nós fizer apenas uma destas coisas, já está a ajudar o planeta para que no futuro a consciência não nos pese por aquilo que estamos a ser hoje.
Artigo redigido por Beatriz Morgado
Artigo revisto por Carolina Rodrigues