EuroCine Parte III: O Cinema Alemão
Prosseguimos a nossa procissão cinéfila rumo a um país que ao longo das últimas três décadas cresceu no universo da Sétima Arte. O terceiro destino é uma nação conhecida pela fábrica de talentos com bola no pé, mas que nos últimos anos tem introduzido uma nova linhagem de qualidade com claquete na mão. Chegámos à Alemanha, onde vamos celebrar o cinema deste país, destacando cinco obras que enaltecem a sua grandeza cinematográfica. Aconselho-vos, no entanto, a selecionarem as legendas em português. Isto, se nunca testemunharam o raro fenómeno de aprendizagem da língua germânica no secundário ou não sabem as letras das músicas dos Rammstein de cor.
Adeus, Lenine! (2003), de Wolfgang Becker
Uma mulher, que também é mãe, acorda de um longo coma em 1990, um ano após a queda do muro de Berlim. Um rapaz, que também é filho, tenta esconder a inevitável verdade da sua recém-acordada progenitora, ainda crente na existência de uma Alemanha dividida. O resultado? Uma divertida comédia com uma forte componente afetiva que relata a estranheza e frenesi de um novo mundo, após a unificação alemã, vista pelos olhos de ex-residentes da RDA. Muito aclamada pela crítica internacional, Adeus, Lenine! ficou marcado não só por lançar Daniel Brühl para o panorama internacional, mas também pelos diversos prémios que arrecadou a nível europeu.
A Queda (2004), de Oliver Hirschbiegel
Os últimos dias do regime nacionalista alemão comandado por Adolf Hitler foram transpostos para o grande ecrã através de A Queda. A grande performance de Bruno Ganz no corpo do líder nazi e a brilhante direção de Hirschbiegel levam-nos numa viagem no tempo à tomada de Berlim pelo exército Soviético, que marcou o final da Segunda Guerra Mundial. Uma obra que documenta bem o fim do sonho do Império de Hitler. É uma boa fonte de conhecimento para os interessados pelo tema e para quem tenha curiosidade em aprender mais sobre este evento histórico.
A Vida dos Outros (2006), de Florian Henckel von Donnersmarck
Um agente da Stasi, polícia secreta do estado da República Democrática da Alemanha, é incumbido de investigar a vida de um casal através de escutas colocadas na sua residência. Todavia, com o passar do tempo, descobre que a sua missão está longe de ser transparente. Altamente realista, afastando-se da teatralidade exagerada de Hollywood, As Vidas dos Outros documenta com precisão os esquemas soberanos da Stasi e a opressão imposta sobre o povo da RDA. Uma obra prima que foi laureada com o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2007. Este filme é um dos mais credíveis e genuínos retratos do leste germânico. Ajudou em muito o realizador von Donnersmarck ter crescido na zona oriental de Berlim.
A Onda (2008), de Dennis Gansel
Quando um professor decide encetar uma experiência social numa das suas turmas, simulando um ambiente de ditadura, esta atinge proporções catastróficas que se alastram muito além das quatro paredes da sala de aula. A Onda demonstra as bases de um sistema autoritário e a facilidade com que as pessoas podem ser levadas a acreditar em valores diferentes dos seus. Trata-se de um filme com um alto cariz social e político que, assustadoramente, ou não, está em conformidade com o atual paradigma mundial. A sua visualização devia ser obrigatória, mas, como não gosto de impor ou ditar ordens, fica ao vosso critério.
Toni Erdmann (2016), de Maren Ade
Um pai, preocupado com a ocupadíssima vida da sua filha empresária, decide criar uma personagem absurda que agite as rotinas stressantes da progénita. Para o efeito, segue-a numa viagem de negócios a Bucareste, onde se instalam os ingredientes para um dos melhores filmes de 2016. Toni Erdmann tem a capacidade de equilibrar comédia e emoção na dose certa. Isto faz com que o público sinta a empatia necessária em relação aos protagonistas, tolerando o ritmo lento e a extensão da obra. Apaixonante e genuíno, esteve entre os nomeados para o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro no ano transato, acabando por perder para The Salesman.
Concluímos a viagem pelo cinema alemão. Cada vez mais reconhecido e com temas muito característicos, é mais um exemplo de que a Europa nada deve aos estúdios de Hollywood. Até a própria Netflix já se convenceu de tal situação, ao ter incluído, há umas semanas, a sua primeira série original alemã, Dark, no pacote do serviço. A conjuntura parece, portanto, favorável à evolução do cinema na Alemanha, especialmente se continuarem a exibir a qualidade demonstrada até então, capaz de convencer até o mais cético dos céticos.