“Fazes que fazes ou pões sementes a crescer?”
O Sérgio Godinho lançou um novo álbum, de seu nome Nação Valente, e, de entre as músicas que o compõem, lançou uma chamada: “Grão da mesma mó”, que tem uma frase que me despertou especialmente a consciência: “Fazes que fazes ou pões sementes a crescer?”. Passo então a explicar. Sou utilizadora assídua das redes sociais (Facebook, Instagram e Twitter), sendo que dou por mim a fazer inúmeras reivindicações no Facebook sobre temas que me interessam e que considero que estão errados ou que precisam de uma mudança. Mas é só isso. Reclamações e reivindicações numa rede social que passam pelos olhos de quem me segue e que caem no esquecimento no scroll infinito que todos fazemos.
Às vezes gostava que existisse um espírito coletivo de mobilização, e talvez seja a minha veia “revolucionária” a vir ao de cima, mas cada vez mais me incomodo comigo mesma (e com os outros) por sermos “tão treinadores de bancada”.
Há dias em que caio no fatalismo de pensar que a nossa essência se está a perder paulatinamente. O individualismo e a ganância deste mundo acelerado movem-nos, é um facto, mas nunca nos podemos nem devemos esquecer de que fomos o povo que, entre outros feitos, conseguiu erguer uma revolução sem sangue. Derrubámos um regime ditatorial! E agora? Ainda me lembro da pujança daqueles movimentos sociais que surgiram durante o período da Troika… Onde estão esses movimentos? Onde estão as pessoas que trouxeram para a rua milhares de pessoas que reivindicavam os seus direitos? Voltámos a ser acomodados, pois existe um clima de uma aparente paz económica e social, que, na minha opinião, é temporária.
Com isto não quero dizer que, por cada assunto que nos chateie um pouco, devemos ir para a rua. Estou a querer dizer que estamos adormecidos e temos a ilusão de que fazemos muito quando na realidade mandamos uns bitaites atrás de um ecrã. Posso dar alguns exemplos que me são próximos diariamente: estou inserida num grupo aberto de Facebook da minha terra, Matosinhos. É raro o dia em que não aparece um post sobre algo que está mal na cidade. Ou é o lixo que não é recolhido devidamente, ou é uma árvore que já devia ter sido cortada, ou até mesmo queixas sobre estacionamento indevido, sobre o qual a polícia não atua. Uma infinidade de posts que na realidade não mudam nada. Quando muito agitam a consciência de quem os lê. Por sua vez, as assembleias municipais, onde existe espaço para discutir estes temas, normalmente estão vazias ou, se estão compostas, não há quem discuta com seriedade os temas. Outro exemplo que posso dar prende-se com o ativismo. Atrás de um computador, somos todos apoiantes de inúmeras causas (ambientalismo, feminismo), somos contra o racismo e xenofobia, a favor (ou contra) os refugiados, enfim, mais um sem fim de temáticas que defendemos afincadamente. Mas e na prática? São sempre as mesmas pessoas a dar a cara, são sempre as mesmas pessoas a organizar eventos, são sempre as mesmas pessoas a passar pela desilusão de: “nas redes sociais disseram que vinham “x” pessoas e só cá estão 5 ou 6”.
A minha proposta passa por tirarmos um pouco do nosso tempo, tentando imiscuir-nos em atividades/ núcleos ou grupos de trabalho ligados a temas que realmente gostemos ou que queremos ver mudados na sociedade. Deixemo-nos de bitaites que caem em saco roto. Afinal, muitos de nós só andam aqui a fazer que fazem e o importante é colocar sementes a crescer.