“Perfume de Mulher” (1993): entre a cegueira física e a cegueira social
Apesar de terem como objetivo premiar os melhores dos melhores da indústria cinematográfica, os Óscares da academia parecem por vezes teimar em “fugir” de alguns nomes sonantes do grande ecrã.
Um desses exemplos é Al Pacino, um dos nomes mais conhecidos da sétima arte, que apesar de ter sido nomeado para os Óscares oito vezes, só em 1993 alcançou o tão ambicionado (e merecido) galardão. “Perfume de Mulher” foi o filme que lhe permitiu granjear tal reconhecimento e é acerca deste que vou escrever.
Realizado por Martin Brest, o filme tem como protagonistas Al Pacino, Chris O’Donnell e o elenco conta ainda com nomes como Philip Seymour Hoffman ou James Rebhorn.
Al Pacino protagoniza um antigo oficial do exército, Frank Slade, que é cego e de difícil trato. Chris O’Donnell encarna o jovem estudante de uma prestigiada escola, Charlie Simms, que se vê obrigado a procurar emprego para custear a sua viagem até casa no Natal. Assim estas duas personagens cruzam caminhos quando Charlie é contratado para cuidar de Frank durante o fim de semana de Ação de Graças.
No entanto, o que à partida parecia ser um simples trabalho de fim de semana, revela-se não só uma enorme aventura como uma lição de vida para o jovem estudante – o Coronel Frank Slade tinha, afinal, outros planos para o fim de semana – planos esses que envolviam mulheres, boa comida, bom vinho, o tango, limousines e uma arma; e, para o ajudar, decide levar Charlie consigo.
Assim, ambos partem para Nova Iorque, onde vivem um fim de semana de loucos, com jantares em restaurantes de luxo, encontros familiares, test-drives a carros de sonho e tentativas de suicídio. No entanto, no meio de tanta azáfama, um problema atormenta Charlie, pois antes de deixar a escola para aproveitar a época festiva, testemunhou a planificação de um ato de vandalismo. Vê-se agora a braços com um dilema que pode definir todo o seu futuro (académico e profissional): ir contra os seus princípios e denunciar quem o fez, ou manter-se fiel aos mesmos e recusar-se a contar quem foi, arriscando perder a bolsa que lhe permite estudar, ou até mesmo ser expulso.
Ao longo do filme podemos ver diversas temáticas serem abordadas de forma hábil, como a dificuldade de um jovem bolseiro em inserir-se numa escola de elite ou as dificuldades e dilemas que um cego enfrenta no seu dia-a-dia.
E é no papel de cego que Al Pacino se supera a si mesmo, assinando uma extraordinária performance que nos faz criar empatia com a sua personagem deprimida, angustiada, que se depara com todas as limitações que a cegueira lhe causa, e que à partida seria mais fácil odiar do que adorar, dado o seu difícil feitio. A personagem do Coronel Frank Slade faz-nos, desta forma, ficar com uma ideia bastante realista (e ao mesmo tempo algo assustadora) do que é perder a visão e o que é ter que adaptar a vida a essa nova condição.
Assim sendo, este é mais um filme que recomendo, uma vez que aborda temas como a fragilidade da condição humana, a dificuldade em manter a integridade moral numa sociedade cada vez mais movida por interesses, e, por fim, porque Al Pacino assina (como já referi) uma soberba interpretação, sendo que por vezes até é difícil de acreditar que não se trata mesmo de um ator cego, tal é a forma de como ele assimilou os movimentos e as características dos invisuais.