A arte de publicitar
O antigo escsiano regressou às suas origens para mostrar que, apesar do estado do mercado de trabalho em Portugal, nem tudo está perdido. Mais que não seja porque é sempre possível mudar de país.
Quando o simples amor pela arte não consegue preencher a lacuna provocada pelas necessidades económicas, há que optar por alternativas. Hugo Veiga, 33 anos, antigo aluno da ESCS e autor da campanha publicitária que percorreu o mundo – Dove Real Beauty Sketches – sonhava ser “um artista pago”. “Desde pequeno sabia que ia fazer alguma coisa ligada às artes”, afirma. “No entanto, sempre que me deparava com a figura do típico artista – homem meio barbudo, mal vestido – percebia que eram pessoas que, na sua maioria, não estavam bem na vida. E eu pensei: Fogo! Isto não dá nada!” A área da publicidade veio concretizar o seu desejo e, agora, mesmo com alguns dissabores, encara uma carreira de prémios e reconhecimento.
Mesmo assim, para o copywriter – actualmente a trabalhar no Brasil para a empresa Ogilvy – os seus projetos vão para além da tão importante barreira monetária. “Existe, cada vez mais, uma procura por diferentes formas de expressão no ramo que fujam aos meios tradicionais de um anúncio de revista, de um filme de televisão ou de um spot de rádio. Vamos para onde as pessoas vão. Tentamos quebrar os paradigmas da publicidade convencional para fazer algo que as surpreenda”, afirma. Tal como em qualquer forma de arte, é fundamental a existência de um forte elo de ligação entre o produto e o consumidor. “Quando as nossas ideias partem de uma informação verdadeira, uma informação proveniente da vida concreta das pessoas, existe uma grande probabilidade de essas mesmas pessoas criarem um vínculo forte com o projeto”, afirma. “ É necessário pensar mais como um artista e menos como um publicitário.”
No interior do estúdio de televisão da ESCS ouve-se apenas a voz de Hugo Veiga. Sem dúvida, um lugar mais tranquilo em contraste com a sua manhã de rock star, recheada de entrevistas e encontros com antigos conhecidos. Veio até à escola, que o formou em Publicidade e Marketing há 12 anos, no âmbito de inspirar, com o seu trabalho, os futuros profissionais na área. “Portugal, neste momento, não é um mercado atrativo. A minha ideia sempre foi ter uma experiência fora e depois regressar para implementar os conhecimentos que conseguisse adquirir no estrangeiro. Só que neste momento o mercado está deprimido, está em crise”, afirma. O publicitário defende que cabe aos jovens alterar esta situação. “É possível fazer muito com pouco. É possível marcar a diferença com nada. Não é um investimento que vai fazer com que consigas mostrar o teu talento. Só é necessária uma boa ideia. Em qualquer que seja a área, esse é o segredo. Tens de te conseguir vender da melhor forma que souberes. Tens de olhar para ti como uma marca e pensar: Como é que eu vou conseguir gerar interesse no meu trabalho?”. Neste sentido, considera que a ESCS é um apoio fundamental, uma vez que, em princípio, esta oferece aos seus alunos todo um leque de experiências. “Os estudantes têm de perceber que durante o seu percurso pela faculdade é fundamental rentabilizar ao máximo o tempo. Não ser um simples aluno, que vem somente assistir às aulas e que apenas se distingue dos outros pela sua nota. Ter uma boa média, neste momento, não adianta de nada.”
A sala é pequena e parcialmente iluminada. A figura de Hugo Veiga assemelha-se à de um santo no altar, repleto de luz e venerado pelos jornalistas. Contudo, o seu ar descontraído não parece ser minimamente afetado. O sorriso sempre presente rasga-se ainda mais quando o tema de conversa gira em torno do termo ”criatividade”.
“ Tens de fazer a diferença até quando é uma empresa a fazer um pedido. Mesmo que se trate de um trabalho mais teórico, podes ser criativo na forma em como o apresentas. No entanto, se te derem liberdade para criares algo, tens de tentar dar o teu máximo. É verdade que existe uma limitação de tempo, mas essa é uma máxima ao longo de qualquer carreira. Já trabalhei em campanhas em que comecei a criar à uma da manhã e apresentei o resultado às nove da manhã”, afirma. Não será portanto de estranhar que este publicitário tenha sido galardoado, o ano passado, com um dos maiores prémios da área da criatividade – Cannes Lions. “ Subi ao palco de calções. Toda a gente me gozou por causa disso. Supostamente deveria ter ido mais arranjado. Mas olha, este ano, se ganhar, acho que vou de calções outra vez”, afirma por entre uma gargalhada.
Com o seu sotaque nortenho limado pela longa estadia no Brasil, Hugo Veiga lamenta que os actuais estudantes não se foquem tanto na parte da criação. “ Quando eu estava na ESCS este era o objectivo da maioria dos alunos. Hoje em dia, parece que não. Já não têm tantos projectos nem uma dinâmica criativa tão forte, no que respeita aos núcleos. Mas é importante compreenderem que isso é essencial uma vez que é aquilo que os vai diferenciar dos alunos de outras faculdades.” Apesar de ter a noção de que criar um projecto na faculdade pode não ser algo assim tão fácil, explica que “existem os alunos e os escsianos. Os escsianos são aqueles que aproveitam todas as coisas que a escola tem para oferecer. Os alunos que se tornam escsianos só têm a ganhar com isso, uma vez que saem da faculdade com projectos palpáveis. Vão ter mais do que uma folha de word com uma nota.”
Pensar em Hugo Veiga como uma pessoa sem projectos futuros é quase uma calamidade. Imaginação não falta. Falta sim, vontade para além da sua. No entanto, gerir o seu próprio negócio não se encontra entre os seus próximos planos. “Neste momento prefiro trabalhar para ter ideias. É isso que me faz levantar da cama de manhã”, afirma. Mais tarde, quem sabe, volta para território nacional. “Portugal é sempre o plano B.”
Fotografia: Gabcom