Células como “tinta” 3D: a criação de um tecido cerebral
Cientistas da equipa do Waisman Center, Madison, Estados Unidos da América, liderados por Zu-Chu Zhang, neurologista, conseguiram imprimir em 3D, pela primeira vez, tecido cerebral que funciona como o cérebro humano. Já tinham conseguido incorporar células na impressora e arranjar uma boa estrutura de suporte – um molde. Porém, a reprodução de um tecido cerebral humano realista ainda não tinha sido conseguida.
Uma “tinta” para a impressora feita de células vivas
Quando se pensa em impressão 3D, pensa-se em matérias como o plástico, metal ou até cerâmica como “tinta” do projeto. No entanto, há um ramo da impressão 3D que se distingue não só pelas técnicas usadas, como também pelos materiais usados, inusitados à primeira vista: a bioimpressão tridimensional.
Esta, em vez dos materiais comuns já referidos, usa uma “biotinta”. Trata-se de uma mistura de milhares de células vivas, produtos químicos que estimulam a comunicação entre as mesmas e o seu crescimento, e ainda células ricas em água – o chamado hidrogel -, que funcionam como uma espécie de cola orgânica que une tudo.
A bioimpressão é um processo que surgiu na década de 90 e que se foi aprimorando ao longo dos anos. Normalmente tende-se a usar as células do próprio tecido em causa, que são, posteriormente, replicadas em laboratório. Assim, caso haja algum transplante, a chance de haver compatibilidade do novo órgão no organismo aumenta. Começou por se usar só células do mesmo tipo e atualmente já é possível combinar diferentes tipos de células, numa só “tinta”, para a recriação de estruturas mais complexas.
Um cérebro do tamanho de um fio de cabelo
No Waisman Center, os cientistas decidiram imprimir, separadamente, linhas horizontais de células neurais humanas e células gliais progenitoras. As primeiras são células do sistema nervoso cerebral e estas últimas são apenas células responsáveis por manter essas células nervosas organizadas e por permitir a cooperação entre si. Juntas, estas unidades formam as células cerebrais.
Também as especificidades da “cola” – o hidrogel – foram devidamente consideradas. Não podia ser forte demais, pois deveria possibilitar o movimento das células e a formação de conexões entre elas, assim como acontece no cérebro humano.
Optaram ainda por construir uma camada de cada vez. Todas diferentes entre si, por terem diferentes tipos de células em cada camada. A primeira continha alguns tipos de neurónios que produzem sinais elétricos. Depois, adicionaram astrócitos, células que capturam esses mesmos sinais elétricos emitidos pelos neurónios. Estava feita uma conexão cerebral.
Mais tarde, juntaram ainda outros dois tipos de células diferentes: umas da parte mais profunda do cérebro e outras da parte mais superficial do mesmo. Notaram que a comunicação era feita das células do córtex exterior (as superficiais) até às células mais “escondidas” do cérebro, e não o contrário. Tudo funcionou como se de um cérebro humano se tratasse, mas na proporção de um vigésimo de milímetro.
Ainda muito simples, mas com grandes planos em mente
Foram feitos mais alguns testes. Usaram algumas células que continham mutações associadas à doença de Alexander. Uma doença ainda sem cura e que prejudica as habilidades motoras dos pacientes ao longo do tempo. As células comportaram-se de maneira similar no tecido cerebral impresso, ecoando os comportamentos que teriam num paciente com a doença – esta seria uma forma de estudar melhor a doença.
Mas o cérebro humano é um órgão complexo, como todos os outros. Como painel de controlo de todo o corpo, a compreensão de todas as suas funcionalidades pode ainda ser difícil de ser atingida na perfeição. Esta pequena porção cerebral criada em laboratório pode até imitar algumas dessas funções principais do cérebro, mas ainda não se trata do órgão completo. Linna Zhou, uma bioengenheira que não fez parte do estudo, afirmou à revista Science que, por ser feita “uma camada de cada vez”, a reprodução do tecido cerebral seria “quase como um 2.5D”.
Zu-Chu Zhang acredita que ainda há muito a melhorar. O líder da equipa do Waisman Center diz que o projeto poderá ajudar a transplantar tecidos cerebrais perdidos por vítimas de AVC, outras doenças neurodegenerativas ou quaisquer tipo de lesões cerebrais. Será, pegando nas suas palavras, uma forma de “ajudar a descodificar o cérebro humano”.
Fonte da capa: Deep AI
Artigo revisto por Lourenço M. Ribeiro
AUTORIA
Seria clichê dizer que eu era uma criança irrequieta. Seria clichê e errado, porque nunca fui. O pequeno Bruno gostava de estar no seu canto, sossegado, a descobrir o máximo de coisas possível e a aplicar as aprendizagens para criar o que lhe apetecesse. Hoje em dia, a única coisa que mudou foi a minha altura. Sempre fui um ávido do conhecimento e sempre o espalhei com prazer. Talvez tenha sido por isto que segui Jornalismo e não as outras mil opções que tinha em mente, porque condensa tudo o que mais amo.