Death Note – outra adaptação fracassada
Atualmente, tem havido uma crescente aposta do cinema norte-americano na adaptação e produção de animes para a criação de novos produtos e filmes. Para os mais despercebidos, um anime é pura e simplesmente uma animação produzida por estúdios japoneses. E, por mais voltas que tentemos dar, todos nós já vimos, pelo menos, um anime nas nossas vidas. Depois da adaptação (fracassada) de Blame e de Ghost in the Shell, foi a vez da Netflix tentar alterar essa tendência, ao fazer uma adaptação daquele que provavelmente será um dos animes mais globais e populares do mundo: Death Note.
A história original (do anime) retrata de história de um aluno brilhante, Yagami Light, que, certo dia, encontra, por acaso, um caderno no chão (Death Note) e descobre que, ao escrever o nome de qualquer pessoa no caderno, enquanto tendo o rosto dessa mesma pessoa na mente, essa pessoa morreria num curto espaço de tempo. Assim, aborrecido com a vida e farto da simplicidade e inferioridade intelectual das pessoas que o rodeiam, Light encontra um novo propósito: salvar a Humanidade, matando todos os criminosos espalhados pelo mundo. Depois das primeiras mortes, surge-nos uma personagem igualmente genial, L, que trabalha com a polícia e tenta encontrar o assassino por detrás de todas as mortes dos criminosos. E é desta forma que nos é apresentada a corrida mental/intelectual entre gato e rato, que vamos acompanhar no restante anime.
E foi nisso que a produção da Netflix falhou. Mais uma vez, a cinematografia norte-americana não conseguiu decifrar a linguagem própria deste género, acabando por fazer produções com alto valor descartável. E Death Note é apenas isso: mais uma vítima.
Toda a trama em si está mal pensada; muito corre mal neste filme. É sobrevalorizada a ação à razão, coisa que não se verifica no original. As personagens estão mal concebidas e muito afastadas dos seus originais. Light Turner (Nat Wolff) foi transformado num típico adolescente americano, sem genialidade alguma. Por outro lado, no roteiro original, Yagami Light é intelectualmente superior à maioria das pessoas, é frio, é cauteloso, é estrategista e, acima disso, nunca perde a sua compostura. Light é mais perigoso do que o próprio Shinigami (dono do caderno), que se mantém sempre muito neutro. Na produção americana, Ryuk é pintado como um demónio, que tenta sempre influenciar o protagonista a matar mais pessoas. Apesar disto, e a meu ver, Ryuk é a personagem mais bem conseguida de todo o filme, não só pelo seu aspeto físico, mas também pela incrível performance de William Dafoe, que foi a voz do Shinigami.
E a principal diferença e talvez a maior causa para que o filme fracassasse como adaptação foi a forçada inserção de uma história de amor: a notável americanização do filme. Na trama americana, Light Turner conhece Mia Sutton (Margaret Qualley), que se torna na sua parceira de crime e, juntos, criam uma onda de mortes impressionante. No anime, Misa (Mia) é apenas mais um peão no jogo de Light; ele manipula-a e controla-a de forma a conseguir chegar ao seu principal objetivo: tornar-se num Deus.
O filme focou-se tanto nos aspetos já tão batidos e utilizados em todos os outros filmes que acabou por colocar de parte todas as coisas que tornaram Death Note no sucesso mundial que foi. Não é uma história de amor, mas sim um jogo mental entre duas pessoas intelectualmente superiores, um jogo de antecipação e de previsão e uma análise dos conceitos de “justiça”, “juiz” e “executor”; acima disso, põe em causa o conceito de “ética”. És uma boa pessoa por matar criminosos? Devias ser recompensado ou castigado? Até que ponto podes ir até te tornares tu mesmo num criminoso? São estas as questões que nos são apresentadas ao longo do anime e que falham em comparecer no filme produzido por Adam Wingard.
Mas nem tudo foi mau. Como não quero ser o carrasco deste filme, consigo perceber qual era o seu intuito. Death Note não transpõe as principais características do anime, porque não é esse o seu objetivo, mas sim o de facilitar a trama, torná-la acessível e “interessante” ao ponto de qualquer pessoa conseguir ver e gostar do filme. É, de certa forma, uma espécie de introdução àquilo que é o universo de Death Note. E, se fores uma pessoa que nunca esteve contacto com o anime, então até é bem provável que acabes por achar o filme e o seu enredo toleráveis.
Mas, se nunca viste Death Note, então peço-te já que pares de ler este artigo e vás ver o anime. Vale a pena.
AUTORIA
Num universo tão vasto como o nosso, quantas são as pessoas que são açorianas (micaelenses), ouvem música todos os dias, não falham um jogo do Sporting, leem livros e veem wrestling? Algumas, reconheço. Mas a pessoa que está a redigir este pequeno texto introdutório chama-se André Medina, tem 20 anos e, há dois anos, embarcou na maior aventura da sua vida.
Sair de casa nunca é fácil, e fazê-lo quando não se sabe cozinhar nem dobrar roupa é ainda mais complicado. Mas, muitas saladas de atum, pizzas do Pingo Doce e noodles depois, aqui estou eu: vivo e no último ano do curso de Jornalismo.
E, em jeito de recompensa por ter sobrevivido a estes duros anos, tive o privilégio de poder ser o primeiro editor da secção de Deporto na MAGAZINE. Eu, uma pessoa que ainda não sabe dobrar uma t-shirt como deve ser.
De qualquer forma, espero poder retribuir a confiança depositada em mim e quero que todos se sintam bem-vindos a esta escola e a este magnífico projeto, que é a nossa querida ESCS MAGAZINE.