Opinião

Gracinha Brilhantina

Apresento-vos a Gracinha. Moçoila pequena. Muito pequena. Tão pequena, mas tão pequena, que chegar à prateleira do meio, de uma estante, já é motivo de alegria para ela. Conhecendo-a como conheço, já se deve ter aleijado umas quantas vezes durante este processo. Ah, sim. Para além de ser pequena, a Gracinha também se aleija constantemente e das formas mais estranhamente estúpidas de sempre. É, a miúda tem um quê de queda para a estupidez… Queda… Por falar em queda… Isso é-me familiar…

Não sei se já vos aconteceu… Muito provavelmente não, porque não têm o dom da queda que a Gracinha tem. E ainda bem. Enfim, continuando… Não sei se já vos aconteceu ficar sem um chinelo no meio da rua. Não? Pois bem, a Gracinha sabe. Aliás, tudo o que cai para a parvoeira, a Gracinha sabe. Não sabe como sabe, mas sabe.

Vou recomeçar, que isto já está a ficar confuso. Ora bem… Estava um belo dia de Verão e a Gracinha, para variar um bocadinho (ou não), tinha de ir fazer análises. Há que não ser egoísta, sim? A Gracinha não podia ficar com tanto sangue dentro dela. Há que partilhar. Mas isto não interessa… A Gracinha tinha de sair de casa e como calçar os tennis dava demasiado trabalho (admitam, já tiveram preguiça de calçar os sapatos), ela decidiu calçar as suas havaiannas brancas. Confiando na marca e no respectivo produto, a Gracinha seguiu alegre e contente pela estrada fora, bem sozinha (não, não levava bolos para a sua avozinha, calma). E lá ia a miúda a andar, calmamente, quando, do nada (sim, é que foi mesmo do nada), a Gracinha sentiu o seu pé direito mais solto que nunca. O seu pé sentia-se demasiado livre e arejado, a calçada estava mais forte e presente… E o chinelo estava… Pois… Como é que eu hei-de explicar isto? Partido? Rompeu-se? Quinou? Sim, foi algo desse género. O chinelo soltou a franga e a Gracinha teve de arregaçar a manga. E arregaçou. Mas antes ainda teve de andar a cambalear pelo meio da rua, arrastando, de uma forma deficientemente atraente, o seu pé direito descalço. Quer dizer, semi-descalço, visto que metade estava dentro e a outra metade estava de fora (ok, admito. Este trocadilho foi propositado).

Até poderia dizer que a solução para o problema foi simples, não quebrando o mínimo de dignidade que ainda restava à pequena moçoila. Mas isso não teria graça. Sendo que não seria viável e confortável ir até ao laboratório das análises e ainda fazer o caminho de regresso a casa, a pé e daquela forma… A Gracinha viu-se obrigada a ir comprar, aos chineses, uns chinelos quaisquer. O cerne da questão é que não foram uns chinelos quaisquer… Foram uns chinelos lilases… Atenção, esta é a parte que dói… Com brilhantes. Sim, a Gracinha teve de andar com uns chinelos lilases com brilhantes no meio da rua, porque, por algum motivo, só havia chinelos do seu tamanho (quem é que a manda ser pequena?) daquela cor. Por isso, se não querem correr o risco de fazer estas figuras graciosas no meio da rua… Ou não sejam preguiçosos e calcem a porcaria dos vossos sapatos fechados e seguros e bonitos e não lilases e não com brilhantes e não frágeis… Ou vão, simplesmente, logo descalços para a rua. É trabalho que vos é poupado.

 

Joana Ochôa, a Lambreta.

AUTORIA

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Joana Ochôa, a pequena Lambreta, nasceu em 1996 e estuda Jornalismo. A escrita tornou-se um refúgio aos seus 14 anos e desde então que não dispensa pôr os seus pensamentos e sentimentos numa folha de papel. Ou mais. Em maio de 2014 decidiu, finalmente, criar um blog: "A Paragem da Lambreta". É uma rapariga distraída, que diz e escreve «cenas».