Música

All things must pass ou uma música nova dos Beatles ainda está a valer?

As canções póstumas são cada vez mais um fenómeno dos nossos dias. A inteligência artificial trouxe essa e outras possibilidades, mas, simultaneamente, levantou uma série de questões éticas, morais e jurídicas. Ora, eu não vou abordar essas questões. Não queria defraudar, mas, de facto, essas questões são aquilo que menos me interessa. Não sou advogada e nunca fui a uma aula de Moral. Também não faço música, mas vou tentar falar sobre ela. Desta vez, sobre a nova velha música dos Beatles.

Agora e não depois

Now and Then foi anunciada como “a última canção dos Beatles”. A música composta e interpretada por John Lennon no final dos anos 70 foi desenvolvida e trabalhada por Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr na primeira metade dos anos 90 para os álbuns Anthology. Na altura, como refere o comunicado no site dos Beatles, “as limitações tecnológicas não permitiram que a voz e o piano de John fossem separados, para conseguir a mistura clara e límpida necessária à finalização da canção.

Hoje em dia, a tecnologia não é um impedimento para que estes lançamentos aconteçam. Até aqui em Portugal, onde as tendências parecem chegar sempre mais tarde, surgiu uma maravilha póstuma.

José Pinhal Post-Mortem Experience é um projeto de tributo ao músico popular José Pinhal. Em poucos anos, as atuações do coletivo tornaram-se num fenómeno de culto para os amantes das canções reeditadas a partir de três álbuns deixados para trás. 

Antes apenas em cassetes, agora em vinis, t-shirts e cartazes de festivais por todo o país, o cantor é incapaz de deixar alguém indiferente. Até o seu visual, 30 anos depois, de farto bigode à Quim Barreiros e fato branco à Roberto Carlos, ainda que sempre com um toque original, faz já parte da cultura pop atual. 

Fonte: Bandcamp

Se a curiosidade aguçar, há sempre a possibilidade de ver o documentário A Vida Dura Muito Pouco, disponível no YouTube, onde se fica a conhecer os segredos do cantor.

Agora, voltemos às quatro cabeleiras do após-calypso

Em 2022, a canção foi rematada pela dupla McCartney e Starr, com a incorporação de um solo de guitarra inspirado em George, que faleceu em 2001. Como se as 60 horas de Get Back (documentário disponível no Disney+) não tivessem sido suficientes para conhecermos o processo criativo da banda britânica, surge ainda um outro minidocumentário sobre esta “última canção”.

George Harrison – ‘O beatle injustiçado’

Sempre foi “John, Paul, George and Ringo”, embora essa chamada não se reflita na sua qualidade individual. Temos sempre tendência a estabelecer uma ordem de preferência para tudo e, a meu ver, George é o melhor entre os quatro de Liverpool. Claro está que esta denominação é superficial e rasteira, e não simboliza um desinteresse pelos outros membros face à admiração por Harrison. Longe de mim. Significa apenas que a personagem reservada e calada, na verdade, deveria dar que falar. Poucas músicas exclusivamente da autoria de George foram gravadas na época dos Beatles, embora sejam inegavelmente de grande virtuosismo. Com o fim da banda em 1970, George começou uma carreira a solo. Podemos dizer que acertou à primeira. Nesse mesmo ano lançou a sua obra-prima All Things Must Pass, o primeiro álbum triplo de originais da história do pop-rock. Um álbum mais importante para a história do que qualquer outro lançado pelos seus ex-colegas de estrada.

Fonte: JustCollecting News

O cantor britânico foi ainda pioneiro na intrusão da música indiana com a ocidental. Quando os Beatles fizeram a primeira tour pelos Estados Unidos, foram apresentados a Ravi Shankar, compositor e músico indiano. A cítara começou a estar presente nas criações de Harrison, desde a icónica canção Norwegian Wood, do disco Rubber Soul

No cinema, foi pioneiro no apoio ao cinema independente. Fundou a produtora Handmade Films e produziu dezenas de filmes.

Além das evidências elencadas de que George Harrison era um tesouro desprotegido, em 1971, as suas preocupações humanitárias levaram-no a organizar o concerto The Concert for Bangladesh que arrecadou fundos para os refugiados do Bangladesh. Este lançamento da “última canção dos Beatles” pode ter sido um pequeno doce para a ‘beatlemania’ contemporânea, mas se há alguém que merece uma homenagem póstuma é, sem dúvida, George Harrison.

Fonte da capa: Pitchfork

Artigo revisto por Pedro Filipe Silva

AUTORIA

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A Joana acha que é demasiado nova para ter uma biografia. Tem 19 anos, estuda Jornalismo e vem de Torres Novas. Não, não é a cidade do Carnaval. Nem a das bifanas. A Joana fica irritada quando confundem. Às vezes também lhe chamam Inês. Na ESCS Magazine espera que não tenham feito confusão, porque o que queria mesmo era escrever sobre desporto. Ora bolas, aconteceu outra vez. Lá terá de ser música.