O preço da independência
Quando somos pequenos, tudo aquilo que mais queremos é crescer. Idealizamos sermos donos de nós próprios e podermos tomar as nossas próprias decisões sem termos a obrigação de responder a terceiros. No fundo, ansiamos pela independência.
A verdade é que o conceito de independência é muito mais complexo do que aquilo que a palavra em si sugere. Atrevo-me a dizer que estarmos despojados de aprisionamento não nos torna necessariamente livres. Irónico, não?
A vida confronta-nos rapidamente com a cruel e avassaladora realidade envolvente que em nada se assemelha àquela que o nosso olhar ingénuo percecionava. Aos poucos, tudo se desvanece.
Foi-nos vendida esta falsa promessa de que, se estudássemos mais do que os nossos pais e avós, teríamos um futuro garantido. Isto criou expectativas difíceis de corresponder, com o panorama atual em que vivemos. Isso revolta-nos, indigna-nos e entristece-nos.
Nas últimas décadas, proliferou-se a ideia de ser bem-sucedido. Se há coisa que marca esta nova geração é a incessante procura de estabilidade e realização. Como é que tal será possível se cada vez mais são erguidos altos muros neste nosso caminho para o sucesso?
A idade adulta tem vindo paulatinamente a dissociar-se de autonomia e equilíbrio. Os jovens adultos deparam-se, mais do que nunca, com a dificuldade em obter rendimentos que permitam concretizar as suas ambições. À primeira vista, pode parecer que passaram a ser mais exigentes. Talvez sejamos, no sentido em que aquilo que pretendemos alcançar difere daquilo que se verificava em gerações anteriores. Mas a verdade é que estamos absortos num sistema que não nos permite triunfar.
Acaba por se viver a vida cada vez mais tarde. Já não existe uma ordem mais ou menos previsível: estudar, arranjar emprego, sair de casa, casar, ter filhos. Em vez disso, verifica-se uma “adolescência prolongada”.
Estatísticas referem que Portugal é o país da União Europeia em que os jovens saem mais tarde de casa dos pais, aos 33,6 anos, em média. Fomos apelidados de “geração canguru”. Há quem diga que tal se prende com o facto de gostarmos de estar confortáveis no casulo que é a casa dos nossos pais, em que as responsabilidades não recaem sobre nós. A decisão de sair de casa é um projeto de vida, que acarreta um elevado nível de responsabilidade. À partida, não se tenciona voltar.
Muito se fala daquilo que faz dos países nórdicos modelos de excelência. Ainda que as cargas fiscais sejam elevadas, há um retorno por parte do Estado, ao contrário do que acontece em Portugal. Não admira o descrédito que os jovens depositam nos políticos.
Não pode deixar de ser referido o facto de Portugal estar direcionado para o turismo. É inegável a contribuição deste setor. Mas surge a questão: até que ponto é que isso beneficia verdadeiramente os portugueses? Além de os salários não acompanharem o preço da habitação, muitas são as residências transformadas em habitações para receber turistas, diminuindo substancialmente o alojamento para quem cá vive.
Tudo isto acaba por comprometer o papel dos jovens adultos enquanto membros ativos da sociedade. É uma autêntica bola de neve: as contribuições à Segurança Social ficam em risco e a taxa de natalidade desce abruptamente.
Para muitos, resta apenas uma solução: sair de casa dos pais diretamente para outros pontos do globo. A procura por melhores condições de vida leva-os a deixar para trás a expectativa de viver em Portugal – pelo menos até encontrarem estabilidade.
Vivemos numa derradeira corrida contra o tempo, que teima em não cessar. Tentamos remar contra a maré, mas avistar a ilha está cada vez mais difícil e o naufrágio parece estar iminente.
Fonte da capa: Grant Ritchie em Unsplash
Artigo revisto por Beatriz Cardoso