Querer amar, mas tropeçar no apego
O facto de um cadeado fechado simbolizar o amor é algo que já não me faz sentido. Se tivesse de descrevê-lo, diria que é tudo menos isso, uma vez que simbolizaria prisão e posse. No outro dia, li num artigo que “um cadeado é um objeto que prende. E o amor não tem nada a ver com prisão – tudo pelo contrário. O amor é liberdade, é deixar o outro livre. Precisamos de ser livres para tocar melhor no amor”. Devemos abrir-nos ao outro, mas sem cair no erro de nos deixarmos fundir.
Não deve acontecer uma união total, nem uma perda de individualidade, por isso, não nos podemos esquecer de nos diferenciarmos. Assim, o medo e a insegurança são também o oposto do amor. A escolha deve ser vista como o sinónimo deste. Se pensarmos bem, é o mesmo quando mantemos um pássaro preso numa gaiola, tirando-lhe a liberdade – tudo pelo nosso egoísmo de o querer ter. Se gostássemos verdadeiramente dele, não estaria fechado numa gaiola, mas estaria livre, dando-lhe a escolha de querer ficar, partir ou voltar. O amor trata-se de escolha e de altruísmo.
Enquanto eternos aprendizes, temos de ser capazes de aprender rápido, bem como de saber filtrar o que é o melhor e o que é o pior. Caso contrário, estamos condenados a tropeçar em frustrações, desilusões, apego e dependência emocional. A nossa aprendizagem infantil tem um grande peso nesta balança. Nós aprendemos sobre relações através do ambiente que nos rodeia e dos nossos cuidadores primários – progenitores. Noutro artigo que li, esclarecia que “o tipo de relação que se estabelece entre o recém-nascido e os pais, ou cuidadores primários, influencia e define as relações futuras, determinando o próprio desenvolvimento emocional e social do indivíduo”. Comecei a juntar algumas peças interiores e esta frase fez-me todo o sentido.
Assim, à medida que contemplamos a realidade que nos envolve, vamos tendo contacto com preconceitos, crenças e perspetivas daquilo que consideramos “normal”. Até a nossa observação de outras relações próximas de nós permite fazer uma filtragem. Desta forma, vamos moldando-nos e moldando também as nossas relações como se fôssemos um monte de argila a querer formar uma peça de barro. No entanto, essa moldagem pode sofrer percalços antes de ganhar forma, dependendo muito do contexto e de vivências que tenhamos experienciado. Se, por exemplo, na infância nos apercebermos de que não podíamos contar com os nossos progenitores ou um deles, ou se passarmos a vida a sentirmo-nos rejeitados e desvalorizados por eles, isso irá condicionar a forma como nos relacionamos com um parceiro. Aquilo que notei é que, com este contexto de maior insegurança e falta de amor de experiências passadas, temos tendência a apegar-nos mais facilmente ao nosso parceiro e procuramos que ele preencha as lacunas que temos.
Neste sentido, somos também mais exigentes em termos de afeto, presença, cuidado do que se tivéssemos um contexto em que tivéssemos sido amados e valorizados, uma vez que a insegurança e constante aprovação nos consomem. Quase que exigimos a perfeição do nosso parceiro para compensar aquilo que não temos noutros tipos de relações como familiares. Porém, o amor não deve ser um preenchimento de lacunas individuais. Não é suposto a outra pessoa encher o resto do nosso copo, mas transbordá-lo. Não podemos ser metades que se completam – devemos inteiros ser para não ter de depender de um outro e para não permanecer numa relação somente pelo apego. Desejando desesperadamente que aquela pessoa nos dê o que não temos de outras pessoas.
É urgente curarmos as nossas feridas e não esperar que nos curem. Não tem nada de errado o facto de ter cicatrizes. Aquilo que é errado é viver com feridas abertas a vida inteira por nunca ter a consciência de que temos de as sarar. Não vivam presos ao passado – estão sempre a tempo de reescrever a vossa história e de aprenderem a amar-se. Se souberem amar-se a vocês mesmos, o vosso parceiro saberá também amar-vos. No fundo, amem-se como gostariam de ser amados.
Fonte da fotografia de destaque: portalamigodoidoso.com.br
Artigo revisto por Ana Rita Sebastião
AUTORIA
A escrita é uma paixão, um refúgio e a sua forma de se expressar. Observa muito sobre as suas vivências e comportamentos das pessoas e reflete sobre isso. A escrita ajudou-a a superar problemas interiores e o seu desejo é fazer o mesmo com outras pessoas - ser como uma voz amiga. O amor próprio, o empoderamento, a confiança, as fragilidades emocionais e todas as questões do foro mais pessoal são temas privilegiados na sua escrita. É ainda uma RP a tempo inteiro, interessa-se imenso pelo mundo das redes sociais e dançou ballet durante 15 anos. O seu sonho é escrever um livro - um romance.