Retrospetiva de Fernando de Azevedo – As Razões Imprevistas
Já há algum tempo a habituar-nos a exposições aliciantes, dos mais diversos tipos de arte, o Centro de Arte Moderna, da Fundação Calouste Gulbenkian, apresenta-nos agora uma retrospetiva do trabalho do artista português, Fernando de Azevedo. Intitulada Razões Imprevistas, conta com uma vasta amostra do seu trabalho, realizado ao longo de seis décadas.
Fernando de Azevedo, nascido em 1923, deixou ao mundo da arte um enorme legado de obras com as mais diversas influências, inspiradas em variadas correntes artísticas – desde pintura a colagem, passando por desenhos ou ocultações.
A Galeria 1, onde se encontra exposto o trabalho de Fernando de Azevedo, tem um pouco de tudo: pinturas que se aproximam de “um Magritte entendido conceptualmente” (como escreve, em 1947, Rui Mário Gonçalves), ocultações de caráter igualmente surrealista, colagens que apelam tanto ao onírico como ao macabro, traços mais abstracionistas, mensagens mais poéticas.
Fernando de Azevedo, qual Fernando Pessoa das artes visuais, aparenta ter tido, em si mesmo, diferentes seres, que coabitavam no mesmo corpo e que ganhavam vida nos desenhos em diários gráficos, ou nas colagens feitas a partir de recortes, páginas de revistas, ou fotografias. E a variedade presente na sua obra é algo que ultrapassa a ideia de diferentes tipos de representação artística. Na verdade, não é apenas a diferença de técnicas, materiais, ou estilos, que torna a retrospetiva deste artista tão imponente – aquilo que lhe confere um peso extra é o poder das mensagens em cada uma das suas obras, e a forma como cada uma dessas representações é capaz de chegar ao mais fundo do ser humano e fazer lá morada.
Apesar de todas as suas diferentes representações, são as colagens que aparentam ser o traço mais característico de Fernando Azevedo. Arrojadas, com um toque ora grotesco, ora erótico, focando-se muitas vezes no corpo feminino, umas vezes mais exibido do que outras, estas colagens apresentam-se como algo que seria considerado por Umberto Ego como passível de pertencer à História do Feio – ocultando, no entanto, uma beleza que obriga os observadores a aproximarem-se dela, a desvendá-la, a saboreá-la.
Inquietante, como a arte deve ser, esta retrospetiva manter-se-á no Centro de Arte Moderna até ao dia 7 de junho. Por todas as razões – mesmo as imprevistas.
AUTORIA
Leonor Fernandes é alentejana de gema. Veio para Lisboa para estudar Jornalismo, em 2011, mas não a impede de “tirar o ‘i’ do lête para pôr no caféi”. Editora da secção de Literatura da ESCS MAGAZINE desde o retorno da revista, faz também rádio – na ESCSFM, o programa cultural Sala de Projeção – e faz parte do número f, o núcleo de fotografia da Escola Superior de Comunicação Social. Para além disso, escreveu ocasionalmente para a obvious e publicou um artigo na Hush Magazine. Até escrever um livro que ninguém vai comprar, escreve sobre livros que todos devem ler.