Desporto

Será do Guaraná?

Não é fácil responder a quem nos pergunta o porquê de endoidecermos com a mais bela forma de espetáculo alguma vez inventada. Ninguém deveria ter que responder a uma pergunta cuja resposta se encontra intrinsecamente na própria pergunta. No meu caso, vivo uma paixão tórrida com o futebol e, fazendo um complicado exercício retrospetivo, acabo por encontrar a resposta em dois nomes, que quando conjugados me colocam um sorriso de orelha a orelha: Mário Jardel. Normalmente todos os rapazes no início do seu crescimento consideram que olhar para uma caixa com vinte e dois “pais” a correr atrás de uma bola é muito menos interessante do que correr desenfreadamente atrás do nosso vizinho ou até limpar as cavidades nasais, capacidade presente no currículo de qualquer jovem até aos 6 anos. Lembro-me que, talvez rendido ao cansaço das correrias, decidi dar uma oportunidade àqueles senhores e que um deles festejava como se fizesse anos de 45 em 45 minutos. Aquilo para mim não era normal, aconteceu num jogo, no seguinte, no posterior a esse e assim sucessivamente, até que descobri o meu novo vício: ver aquele senhor festejar.

Pouco me interessavam os clubes e as suas vitórias, aliás, até achava um bocado estranho ser quase obrigatório gostar de onze senhores, quando apenas um festejava e fazia os “amigos” celebrarem. Tornou-se o meu passatempo preferido, apesar de todos os meus amigos acharem aquilo um autêntico desperdício de tempo. Para mim não era e os meus pais sempre me ensinaram que, se quisermos, há tempo para tudo. E eu queria.

No dia em que ele foi embora para a Turquia, levou com ele toda a magia que tinham aqueles momentos, lembro-me de breves memórias em jogos europeus, mas era diferente, e foi com a sua emigração que comecei a nutrir sentimentos de uma maneira especial por uma camisola, deixou de ser apenas o senhor dos golos e passei a apreciar o trabalho de todos os outros que povoavam a relva que faltava no campo da minha escola de então. Não me considero católico, mas um dos momentos que me deixou mais dúvidas sobre a existência do divino foi o destino seguinte do Super-Mário. Como uma espécie de bomba e com o objetivo de reconquistar o título de campeão nacional, o senhor que me tinha feito apaixonar pela redondinha ia vestir o manto sagrado. Parecia um sonho. Agora, começo a acreditar que, se o meu coração tivesse enveredado por outra opção clubística, ele viria dar-me o gosto de celebrar duas vezes sempre que faturava, e houve um ano em que foram 84 vezes, é normal o desgaste ao nível das articulações. 42 golos do Sporting, 42 golos de Jardel.

Isto e bollycaos e não pedia mais grande coisa. Como seria expectável, pelo menos para mim, devolveu a glória naquele que foi o último campeonato nacional conquistado pelos verde e brancos. Motivos alheios à sua vida profissional influenciaram, após esse ano, o futuro da sua carreira e desde então viajou para mais países, de forma a “tentar” exercer a sua profissão, do que muitos comissários de bordo da Ryanair. Eu acho que até tolerava a prática de algumas contra-ordenações muito graves, tal foi a importância que a dado momento Jardel teve na minha vida.  De onde surgiu esta paixão? Não sei, será do Guaraná?