The Good Place: uma série que marca pela diferença
The Good Place é um conteúdo que marca pela diferença. Depois de várias provas dadas, Michael Schur criou a solo esta série, que se situa num imaginário onde a filosofia, a cultura pop e a comédia se encontram. Estreou a 19 de setembro na NBC e terminou a 30 de janeiro de 2020. Atualmente, é possível assistir a todos os episódios na Netflix.
Esta é uma série que aborda um tema particularmente interessante, focado no que acontece quando uma pessoa, depois da sua morte, vai parar ao céu por engano. Através desta base, aborda questões como o que significa ser uma boa pessoa, ou como se está sempre a tempo da redenção.
A história gira em volta de Eleonor Shellstrop (Kristen Bell), que, no momento em que acorda, percebe que entrou na vida após a morte. Nesse momento, é levada ao encontro de Michael (Ted Danson), que lhe explica que ela está no “lugar bom” devido às suas ações, principalmente por ter ajudado pessoas inocentes. Depois desse esclarecimento, Eleonor percebe que foi cometido um erro e que está a ser confundida com uma homónima.
Presa num mundo em que tudo o que acontece é bom, esta entra no dilema de confessar a verdade e ir parar ao “lugar mau” ou de permanecer ali e tentar passar o mais despercebida possível. Ao longo do tempo, vai percebendo que não foi só com ela que foi cometido esse erro, e começa à procura de outras pessoas que também tenham ido ali parar por engano.
Esta é uma série que sempre dividiu opiniões. Por um lado, as referências temporais são muito bem feitas, remetendo sempre para eventos do quotidiano, o registo e a diversidade de discursos étnico-raciais mostram que o século XXI modela cada fibra desta comédia e, ainda, são atacadas as questões mais complexas e antigas da existência humana. A derradeira dúvida (a morte) e o derradeiro medo (o desconhecido). Por outro lado, não obstante, a sua criatividade atípica não deixou de se pautar por algum desequilíbrio entre temporadas e até ao longo de cada uma delas. Episódios fortíssimos contrastaram por vezes com alguma repetição desnecessária – muitos “reboots”, muitas aulas de ética e alguns avanços e recuos narrativos que, por vezes, se tornavam cansativos. Isto pode ser percetível principalmente na segunda temporada, que se torna demasiado previsível, fazendo com que o espectador perca o interesse.
Uma caraterística interessante do avanço de temporadas é a inserção de reviravoltas e conversas filosóficas. As menções de Emmanuel Kant e John Locke alinham-se ao lado de piadas contemporâneas. No penúltimo episódio, há até uma participação especial de Hypatia of Alexandria, interpretada por Lisa Kudrow.
The Good Place nunca atraiu muito público, nem muitos prémios, mas termina a sua exibição como uma das melhores séries de televisão da década. Ao longo das temporadas, a equipa de Schur desafiou os telespectadores a lidar com grandes ideias e elaborou uma leitura surpreendentemente nítida da natureza humana – que não é excessivamente ingênua nem deprimente.
O final da série foi algo que suscitou alguma controvérsia. Eleonor Shellstrop assume o seu lugar de protagonista e guia o espectador pelo caminho final de cada personagem. O primeiro momento envolve deixar ir e aceitar a decisão de Chidi de passar pela última porta. O segundo consiste em ajudar alguém a aprender a desistir, convencendo o único morador do Middle Place, Mindy St. Claire, a entrar na vida após a reconstrução. E, por último, guia Michael para o único final que o faria realmente feliz: uma vida mortal.
Artigo revisto por Mariana Coelho.