“LEVIANO”: Um filme que encanta a vista, mas que não enche o coração
Visualmente falando, “Leviano” é um trabalho notável. No que à banda sonora diz respeito, esta é dotada de um bom gosto tremendo. Já no que toca ao conteúdo, é demasiado oco.
A primeira longa-metragem do realizador Justin Amorim convida-nos a mergulhar na problemática da história da família Paixão – composta pela mãe Anita (Anabela Teixeira) e pelas suas filhas Adelaide (Diana Marquês Gomes), Júlia (Mikaela Lupu) e Carolina (Alba Baptista).
«Não vais vestir preto?» é a primeira frase que ouvimos em “Leviano” e aquela que mais informação revela. Ainda que de forma inconsciente, associamos a cor preta à ideia de morte ou de tragédia. E, de facto, acertamos na muche.
«Não há dúvida de que a nação parou com esta notícia, é difícil ficar indiferente a uma tragédia desta magnitude» – é a frase que nos deixa com a dita pulga atrás da orelha. De que notícia estamos a falar? O que terá acontecido? Ficamos imediatamente sedentos de informação. Infelizmente, continuamos assim até aos últimos minutos do filme.
“Leviano” começa in media rés com uma entrevista à mediática Família Paixão. No decorrer da conversa, somos convidados a mergulhar nas memórias desta peculiar família e a entrar num mundo onde a loucura e a irreverência têm o papel principal.
A mãe apaixona-se pelo típico rapaz bonito e perfeito e, numa crise de meia idade, decide fugir com o seu (suposto) amor eterno. Assim, de um momento para o outro, o alegado mundo glamoroso das mulheres Paixão entra numa dramática espiral decadente. Podemos dizer que a história foca a forma como as três irmãs vivem, cada uma à sua maneira, o desaparecimento da mãe, enquanto, em simultâneo, travam as suas próprias batalhas – exclusivas e individuais.
De forma sucinta, a «mana mais velha», Adelaide, é a típica adolescente rebelde que faz tudo para desafiar a autoridade. Se tivéssemos de escolher apenas uma personagem principal, seria, sem margem para dúvidas, esta jovem de 19 anos – por variadíssimas razões, mas, acima de tudo, pela profundidade da sua história.
Temos também a Júlia, a «mana do meio» e a voz da razão – um papel desempenhado de forma exímia por Mikaela Lupu. Talvez a personagem menos problemática de todo o enredo e aquela que, além do envolvimento com Eduardo (João Mota) e da sua sensatez, pouco acrescenta à trama.
Por fim, a mais nova da família é Carolina Paixão – uma jovem que faz tudo para agradar a mãe e, consequentemente, a mais abalada pelo seu desaparecimento; a personagem brilhantemente interpretada por Alba Batista vai descobrindo, aos poucos, a sua verdadeira identidade, enquanto, de pé atrás e a medo, explora o universo da sexualidade.
Podemos dizer que “Leviano” não peca na construção das personagens, mas na forma com as explora. Dá-nos a conhecer tão pouco da história de cada uma das filhas – como se da mera ponta do iceberg se tratasse – que, inevitavelmente, nos «sabe a pouco».
Namoros, sexo, violação, intimidade, (descoberta da) sexualidade e inseguranças – “Leviano” toca em temas extremamente interessantes, mas não desenvolve nenhum deles. A dada altura, ficamos com a sensação de que o filme é um trailer demasiado longo e extremamente lento.
Sabemos que alguém morreu, mas é rara a altura em que este pequeno (grande) detalhe é mencionado. Sabemos que a mãe fugiu, mas o seu desaparecimento passa rapidamente para segundo plano. Às tantas, o foco perde-se. E, infelizmente, o nosso interesse, enquanto espetadores, também.
Antes de qualquer coisa, o filme cativa pela sua estética irrepreensível. Filmado por terras algarvias, onde Justin Amorim (realizador) cresceu, trouxe – ao grande ecrã (2018) e à HBO (2020) – uma panóplia de imagens encantadoras, caracterizadas por tons quentes que fazem jus à característica luz do Algarve. Uma coisa é certa: todas as abordagens visuais foram minuciosamente escolhidas and it shows. No entanto, o que se nota, também, é o historial de videoclipes produzidos pelo realizador de “Leviano“, porque são vários os momentos em que, tanto por questões visuais como pela banda sonora, nos sentimos num autêntico videoclip.
Sem spoilers, o fim é polémico. Se, ao longo de uma hora, pouco ou nada acontece; na última meia hora, pouco ou nada fica por acontecer. Já dizia o mítico António Variações: «quando a cabeça não tem juízo, o corpo é que paga» – e, neste caso, vários corpos pagaram pela falta de juízo de uma certa cabeça. E mais não digo.
O elenco é composto por vários nomes conhecidos da televisão portuguesa, como Anabela Teixeira, Alba Baptista, Diana Marquês Gomes, Alda Gomes, João Mota, José Fidalgo, Pedro Barroso, entre tantos outros. “Leviano” nasceu de uma mera brincadeira de amigos e tornou-se numa produção cinematográfica de que ainda hoje, dois anos depois da sua estreia, se fala. Para «primeira vez» de muitos intervenientes – desde o realizador a alguns atores –, foi uma obra muito bem conseguida e uma bonita forma de perder a «virgindade» artística e cinematográfica.
Para os interessados, os atores e o realizador de “Leviano” protagonizaram uma live no Instagram da HBO, que ainda se encontra disponível na página, onde conversaram sobre a recente aquisição da plataforma de streaming e sobre aquilo em que andam a trabalhar.
Uma ótima ideia com demasiadas pontas soltas. “Leviano” é relevante, mas não necessário. Encanta a vista, mas não enche o coração. Resta saber: será “Leviano” um filme fracassado ou uma obra prima incompreendida?
Artigo escrito por Bruna Gonçalves
Artigo revisto por Rita Asseiceiro
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