Monogamia ou Poligamia: haverá certo?
Porquê a necessidade de haver certo ou errado? Porquê a tendência de socialmente criarmos padrões sobre a maneira como nos devemos relacionar? Afinal, não há o “certo” quando se trata de amor (ou pelo menos não devia), o correto será sempre o que deixa as pessoas felizes (sem magoar terceiros, é claro).
Não estará na hora de refletir?
Lembro-me de um amigo meu mencionar: “se estou com uma mulher, ela só deve querer ter relações sexuais comigo, só desejos comigo. Não faz sentido pensar sequer noutro homem”. Bem, fiquei perplexa e questionei: “Mas os homens deixam de sentir desejos? Deixam de imaginar?” e, claramente que não, o típico: “mas eu sou homem”… Após isto, pensei imensas vezes sobre o que torna a monogamia e as restrições mesmo numa relação monogâmica tão naturais. E, lá está, não quer dizer que entramos nós numa relação poligâmica (ou até aberta), mas refletir e perceber como isso até pode influenciar a nossa posição na sociedade. Afinal, aqui a ideia não é levar as pessoas para a monogamia ou para a poligamia, mas para lembrar da importância de fazerem a escolha de forma consciente. Isto para que a nossa decisão não se baseie no que a sociedade espera de nós. Por vezes, estas questões estão tão enraizadas na estrutura da sociedade que achamos que não temos escolha, apenas nos conformamos. Mas… afinal, quando escolhi o curso que ia seguir, tive de pensar e pesquisar, certo? Bem, eu sou adepta de nos analisarmos em ordem a percebermos o que nos deixa mais confortáveis e realizados, em qualquer área da nossa vida.
Afinal, como apareceram estes conceitos?
Segundo o investigador português Rui Diogo, “a poligamia é natural. A monogamia foi criada para a mulher”, pois “não há fundamentos biológicos para a monogamia”.
Sim… podemos dizer que a monogamia nasceu como ferramenta para a opressão da mulher. Não desvalorizando quem se sente mais confortável numa relação monogâmica, mas é um facto. Foi uma forma social criada para limitar a mulher e torná-la numa presa da sua sexualidade e das suas escolhas. Aliás, na Internet podem encontrar diversos testemunhos de investigadores a explicar como não estamos “programados” para uma relação monogâmica (que nada mais, nada menos é do que uma construção social).
Com o nascimento do conceito de “propriedade” na História, dá-se a propriedade da mulher também. Enquanto nómadas, não havia rótulos, sendo que a mulher ajudava na caça, entre outras tarefas que posteriormente passaram a ser tipicamente masculinas. Porém, quando o ser humano começa a assentar, nasceu a ideia de tornar a mulher propriedade de um homem com o estabelecimento da relação monogâmica, baseada no engrandecimento do ego masculino. Vemos como os homens tinham leis protetoras quando cometiam o adultério, enquanto a mulher estava sujeita a situações menos favoráveis – tendo nascido a ideia de “vulgar”, “mulher fácil” e tantos outros adjetivos e expressões que servem para restringir a nossa sexualidade. Tudo isto numa base social, nunca biológica. Porque, biologicamente, a nossa vontade sexual não modifica de acordo com o órgão sexual.
Hoje, a sociedade evoluiu, mas ainda há quem olhe para tal como absurdo. Aliás, se pensarmos bem, não continuamos a ter pensamentos exóticos com outras pessoas, estando numa relação com alguém que amamos? Não continuamos a imaginar situações e a querer executá-las? É nos ensinado a ter relações monogâmicas, vemos isso desde o seio familiar até ao mundo do entretenimento. E, ainda em pleno 2021, vemos como pode ser um tema controverso que muita gente prefere nem discutir. Por vezes, esquecemo-nos de que as pessoas são distintas, por isso, nem todos temos a mesma tendência (e está tudo bem). Como tal, já noutra vertente, quem opta por monogamia não deve, jamais, ser julgado.
Não obstante, temos de nos lembrar de que a poligamia não se baseia só na sexualidade. Há diferentes formas de nos relacionarmos, em termos emocionais ou sexuais (ou os dois), o que seja (sim, há relações estritamente emocionais). Bem, é tudo subjetivo e uma escolha. Falamos tanto em “amor é amor”. Então quem está numa relação poligâmica também não ama? A diferente forma como o fazemos não nos torna inferiores. Desde que haja respeito, consenso e compreensão, quem somos nós para julgar a relação de outras pessoas?
Amor Romântico
É dos maiores motivadores para acreditarem que a monogamia é o único caminho a seguir. Não digo que seja errado, mas o que faz dele também certo? Relembro: é tudo uma questão de perspetiva. No entanto, não podemos negar que os filmes, livros, músicas e todas as plataformas de comunicação, na verdade, têm criado construções em nós daquilo que o amor deveria ser. Deixamos as suas ideias tomarem conta de nós e as histórias, após analisarmos, giram sempre à volta do mesmo (e são o mesmo). Os filmes baseiam-se, com bastante frequência, em relações heterossexuais em que vivem todos felizes para sempre (até como se amor fosse tão fácil e perfeito). As coisas não são assim. Amor é comunicação, amizade e muito, muito trabalho. Não vai ser linear, não vai ser fácil. Além disso, esquecemo-nos da parte sexual. Afinal, estamos numa relação e deixamos de olhar? Não, não deixamos. Deixamos de nos imaginar com outros? Não (na sua maioria). Porquê? Somos humanos e é dever da comunicação parar de romantizar o amor de uma maneira que não deixa margem para diferentes formas de amar.
Mitos
- “Ah, mas isso não é amor, pelo menos com a mesma intensidade” – pode até ter mais, na verdade. Existem tantos tipos de amores que dividimos na nossa vida: da família, dos amigos e das nossas relações… e uma mãe que ama os dois filhos da mesma forma? Não é possível? É. Então porque não acreditar que haja amor numa relação poligâmica?
- “Temos de respeitar o outro” – ora bem, estar numa relação poligâmica não significa trair ou enganar a outra pessoa. Há regras que os envolvidos estabelecem, assim como existe em relações de amizade, familiares, entre outros. Pode ser contar o que fazem, pode ser criar limites… o que desejarem e com o que estiverem de acordo. Comunicação é a chave e é indispensável em qualquer tipo de relação, seja poligâmica, seja monogâmica. Por isso, sim, pode haver traição e ciúmes, as pessoas não deixam de ser humanas e ciúmes têm tendência a ser intrínsecos ao indivíduo (não necessariamente não saudável). Quando isto acontece, as partes das relações devem sentar e abordar a temática, para que todos se sintam seguros na relação (inteligência emocional é essencial).
- “Poligamia é para quem quer «pegar» toda a gente” – não, não é sempre por causa disso. Sim pode haver pessoas que sejam mais sexualmente abertas, mas, na verdade, tende a ser acerca de responsabilidade afetiva e conexão também. Há casos e casos – generalizar, ainda por cima em temáticas amorosas, não faz muito sentido, devido à sua diversidade.
- “Poligamia também aprisiona as mulheres a submeterem-se a um homem que quer estar com outras mulheres” – para começar, nem sempre é um homem com várias mulheres. Por vezes, a teia é bem mais complexa e é dos dois lados a terem vários parceiros ou só uma mistura… no fundo, não há “regra”. Se pode ser usada para oprimir? Pode sim. Daí ter iniciado com a menção da importância da reflexão. Temos de analisar os nossos padrões. E, como quase tudo, há falhas e, em certas zonas do mundo, é imposto. Seja em que tipo de relação, a imposição nunca é o certo – a escolha é importante.
Não esquecer!
É importante ter a consciência de que há locais do mundo onde as pessoas preferem uma relação monogâmica, mas não têm escolha para tal. E, por outro lado, há quem esteja numa relação monogâmica, mas se sentiria mais confortável se fosse poligâmica. Mas aí vem o medo e a reprovação social. A sinceridade, em qualquer relação, é essencial. A traição nunca é a escolha certa e devemos sempre respeitar os limites dos outros. A maneira como escolhemos relacionar-nos só nos diz respeito a nós. Devemos, sim, estar cientes das nossas escolhas e ter responsabilidade emocional para lidar com elas.
Apenas sejam felizes! Não importa como, o mundo terá de aceitar.
Imagem de capa: vogue.pt
Artigo revisto por Ana Sofia Cunha
AUTORIA
Patrícia tem 19 anos e veio do Norte. Criada numa aldeia, desenvolveu um amor pela natureza e animais. Estuda Publicidade e Marketing e pretende trabalhar junto de organizações humanitárias. Mudou-se para Lisboa, mas nunca se esquece do seu Porto. Adora dançar, ler e ouvir clássicos de música. Sempre que pode, anda pelas ruas pronta para explorar algo novo e tirar fotos a cada detalhe artístico.