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Artigo de opinião – A “Lage” que suportou o Benfica

No dia 3 de Janeiro, Rui Vitória abandona oficialmente o cargo de treinador do Benfica. O banco das águias ficaria interinamente a cargo de Bruno Lage, à data treinador da equipa B dos encarnados. O Benfica, vindo de uma derrota por 2-0 frente ao Portimonense, encontrava-se nesta altura a 7 pontos do líder, FC Porto, ocupando o quarto lugar. Estando o clube da Luz prestes a atravessar uma das fases mais complicadas e exigentes da época, não se avizinhava vida fácil para Bruno Lage.

Passados sensivelmente três meses, o Benfica anulou totalmente a diferença pontual para o rival do norte, ocupando já o primeiro lugar em igualdade pontual com a equipa de Sérgio Conceição. Derrotou o Sporting por 2-1 e está com meio pé na final do Jamor. Na Europa, a equipa encarnada superou uma eliminatória complicada face aos turcos do Galatasaray e virou a eliminatória frente ao Dinamo de Zagreb. Face ao sucesso da equipa, o próprio Bruno Lage já renovou contrato até 2023.

Qual a razão do sucesso da equipa de Bruno Lage face à equipa de Rui Vitória?

Logo à partida, no primeiro jogo de Bruno Lage ao comando da equipa, uma suada vitória por 4-2 frente ao Rio Ave, sendo possível notar já mudanças de cariz tático, mas também anímico. Lage não teve receio de implementar, sem grande tempo de treino com a equipa, o tão desejado “4-4-2”, apostando no jovem João Félix pelo meio a aparecer por trás de Seferovic. Este modelo tático é, no entanto, muito permeável, podendo variar para um 4-2-3-1 ou até mesmo um 4-3-3 mais típico de Rui Vitória, com João Félix à esquerda e Pizzi a “fechar” ao meio. Esta permeabilidade deve-se à liberdade de movimentos e trocas posicionais, sobretudo entre João Félix e os extremos, papéis ocupados maioritariamente por Rafa e por Pizzi, que foi, entretanto, desviado para a direita. Rafa encaixa como uma luva neste sistema de jogo, utilizando a sua enorme velocidade para procurar a profundidade nas costas da defesa adversária, dando sempre uma opção diferente de passe à equipa encarnada.

Este sistema de jogo permitiu retirar o melhor de jogadores em sub-rendimento, como Pizzi, Samaris ou Gabriel, mas sobretudo João Félix, que com Rui Vitória aparentava estar sempre algo perdido a jogar na ala. Aparecendo agora numa posição de “9 e meio”, Félix consegue aproveitar toda a sua qualidade técnica e capacidade de remate, levando já 9 golos e 3 assistências na era de Bruno Lage. O jovem português chegou mesmo a vencer o prémio de Melhor Jogador do Mês de Janeiro, na Liga Portuguesa.

Fonte da imagem: SAPO Desporto
O espetacular rendimento de João Félix com Bruno Lage

Com a passagem de Pizzi para a direita, assumindo uma função de falso ala, Lage incluiu Gabriel no 11 inicial, tendo o brasileiro adicionado uma excelente qualidade de passe e organização ofensiva ao meio campo encarnado, trazendo também uma maior solidez e compreensão no momento defensivo, acrescentando ainda a sua boa capacidade no jogo aéreo, qualidades estas que Pizzi não era capaz de trazer à equipa.

É também algo curioso poder observar um Benfica bastante sólido defensivamente, ao mesmo tempo que a sua grande “âncora” no jogo defensivo, Fejsa, está lesionado há já algum tempo. O que é certo é que Bruno Lage conseguiu transmitir esta segurança defensiva à equipa, entregando as tarefas defensivas no centro do terreno a Samaris, jogador que não contava para Rui Vitória. “O número 6” grego conta sempre com bastante ajuda do seu companheiro de meio campo, Gabriel, tornando este meio campo muito mais agressivo e reativo à perda da posse de bola. No entanto, a defesa começa no ataque, sendo que Rafa e Seferovic contribuem bastante para a pressão ofensiva, provocando muitas vezes perdas de bola em zonas defensivas do oponente.

Após o momento de recuperação de bola, o Benfica apresenta uma construção de jogo muito mais apoiada e rápida, baseada em combinações e passes curtos, evitando quase sempre a solução longa. Pizzi é fundamental neste estilo de jogo; mesmo desviado para a ala, continua a ser o “mastro da equipa”, sendo o médio português o principal pensador do jogo dos encarnados. Este estilo de jogo dá uma grande primazia ao centro do terreno, contrariando assim o futebol mais canalizado pelas alas de Rui Vitória.

O futebol de Bruno Lage exige o máximo esforço e intensidade da equipa, tanto no momento ofensivo como no momento defensivo. Este esforço leva a um grande desgaste físico por parte dos jogadores, desgaste esse que é necessário saber gerir e Bruno Lage tem-no feito com excelência. O setubalense demonstra ter uma enorme confiança em todos os elementos do plantel, apostando frequentemente em elementos com menos tempo de jogo ou mesmo elementos da equipa B. Um grande exemplo desta confiança foi o jogo em Istambul, frente ao Galatasaray, onde Bruno Lage apostou numa equipa repleta de jogadores menos utilizados e jovens da formação (este foi o onze mais jovem desta Liga Europa).

São facilmente observáveis as mudanças táticas que Bruno Lage implementou na equipa, mas, a meu ver, a maior diferença face à equipa de Rui Vitória será necessariamente em termos anímicos. Vemos um Benfica, e todo o seu plantel, com uma maior atitude e motivação para todos os jogos, enfrentando qualquer desafio sem receio, sempre apoiado pelos adeptos que na era de Bruno Lage têm comparecido em massa. Para esta motivação muito contribuem os recentes bons resultados da equipa, mas também a forma como Lage é capaz de gerir o plantel e manter todos os jogadores focados e motivados. A comunicação do treinador, tanto interna como externa, tem agradado também bastante ao universo benfiquista.

A popularidade de Bruno Lage ascendeu de forma repentina, sendo atualmente já um dos treinadores favoritos do público português. O potencial do técnico setubalense é já conhecido em Portugal, mas começa também já a expandir-se além-fronteiras, começando o seu nome a aparecer associado a clubes estrangeiros.

Conseguirá Bruno Lage manter este sucesso repentino no Benfica? Passará o seu futuro por um gigante europeu? Teremos que esperar para ver o que nos traz esta jovem promessa portuguesa no mundo dos treinadores.

Texto redigido por:

Artigo revisto por Gonçalo Taborda