Cinema e Televisão

“Lady Bird”, de Greta Gerwig

Lady Bird é um dos filmes do momento. O primeiro projeto de Greta Gerwig enquanto realizadora, a solo, tem navegado sob uma maré de sucesso e recebido ondas de elogios desde a sua estreia, valendo-lhe cinco nomeações para os Óscares. É a primeira mulher a entrar no lote final de realizadores que concorrem à Estatueta de Ouro desde 2009 e a quinta a lográ-lo em toda a História da Academia. A estreia nas salas portuguesas ainda irá tardar, mas não é justificação para evitar debruçar-me sobre Lady Bird em vésperas da tão aguardada cerimónia.

Christine “Lady Bird” McPherson é, tal como indica o título, o rosto da ingenuidade adolescente e o elemento que estabelece a ligação emocional com o filme. A personagem protagonizada por Saorsie Ronan explora o lado sonhador de uma jovem de 18 anos que pretende encontrar o seu espaço num mundo em constante mudança. Uma figura que representa aquilo que qualquer um de nós foi (ou ainda é) com aquela idade, algo que torna a rebelde Christine consistente e com motivações credíveis. Greta Gerwig, que também tem um pouco de si em “Lady Bird”, leva-nos a uma viagem de altos e baixos onde a pressão social, o desejo de ser aceite e a luta pela concretização dos sonhos estão em primeiro plano. São pequenas estórias dentro de uma grande estória que ajudam a moldar a personalidade da protagonista e que lhe vão conferindo sentido, enquanto procura respostas sobre a ambiguidade do que é ser adulto. Cenários identificáveis, pois, provavelmente, qualquer um de nós, agora quer com vinte ou quarenta anos, já testemunhámos no passado.

Importante para a concretização da mensagem de Lady Bird é o obstáculo que a protagonista enfrenta. Não surge sob a forma de um namorado, padre ou rebelde rockeiro, mas sim sob a figura maternal. A sua mãe, interpretada por Laurie Metcalf, desempenha um papel fulcral no desenvolvimento da filha, não só enquanto personagem no campo fictício, mas também como elemento que confere realismo à narrativa. É quem mais tenta colocar os pés de “Lady Bird” assentes na terra, é quem permite rever-nos ainda mais no trabalho de Greta Gerwig. Todos já acreditamos que o pior inimigo, na nossa cabeça, eram os nossos pais. O seu amor e preocupação eram mal interpretados, especialmente quando nos deparávamos com a fase de adaptação ao mundo real, na qual criávamos cenários idílicos para nos protegermos do mesmo. Por mais que nos rebelássemos contra as restrições que nos eram colocadas, apenas assim conseguíamos crescer enquanto seres humanos. Este é o mote de Lady Bird, cujo êxito se deve à química estabelecida entre Saorsie Ronan e Laurie Metcalf enquanto vestiam a pele das personagens. As suas interpretações valeram-lhes a nomeação para o Óscar de Melhor Atriz e Melhor Atriz Secundária, respetivamente. Quiçá, por terem passado por experiências semelhantes às das personagens.

Greta Gerwig consegue, portanto, equilibrar um bom elenco de várias gerações – os jovens Lucas Hedges e Timothée Chalamet também nele figuram – enquanto reinventa um conto sobre a adolescência, estilo já bastante saturado em Hollywood. Necessitávamos algo que, ao contrário de Boyhood, se preocupasse em transmitir o que é ser jovem sem estar a pensar nas luzes dos holofotes. E Lady Bird é exatamente o que faltava, justificando o reconhecimento de que tem sido alvo. O guião transcende uma lufada de ar fresco nesta época alta do cinema, com personagens sólidas, cenários verosímeis e bons diálogos. Nunca tenta agradar um painel de jurados, mas sim mimosear quem já viveu, ou ainda vive, na flor da idade.

Em conclusão, com o seu cunho pessoal, Gerwig planta uma flor que brota emoção, e rebeldia, tudo com uma dose de humor e drama bem equilibrada. Nós, a audiência, ou se permitirem a metáfora, as joaninhas de Gerwig, pousamos nessa flor, tranquilos e serenos, desfrutando de uma obra com a qual nos identificamos rapidamente. Lady Bird é uma viagem nostálgica aos tempos dourados da realizadora e uma celebração da adolescência. Quanto ao futuro, este parece auspicioso para Greta Gerwig, a contadora de estórias.