Código Postal

Os Sabores de São Miguel (e dos Açores)

Se a rubrica “Código Postal” tem como objetivo dar a conhecer as regiões dos membros da ESCS Magazine, haverá melhor forma de conhecer uma região do que pelo paladar?

Esta reportagem dá a conhecer cinco produtos e cinco experiências gustativas a não perder ao visitar a Ilha de São Miguel.

Ananás dos Açores

O ananás já se tornou símbolo dos Açores, não podendo deixar de ser referido nesta reportagem.

Luís Dâmaso, responsável pelo negócio, conta que a plantação nas Estufas de Ananás das Laranjeiras começou em 2019, ano em que abriu também ao público, devido ao interesse demonstrado por algumas pessoas em visitar o local. Estas estufas integram a empresa Boa Fruta, que inclui cerca de 160 plantações.

Relativamente ao processo de produção, o ananás leva cerca de dois anos a ser produzido. Nestas estufas conseguem ser produzidos 100 mil ananases por ano. Os principais locais de exportação são Portugal Continental (para os mercados Auchan), Alemanha, França e Áustria. Ainda em Portugal, é possível encontrar o ananás dos Açores numa banca no Mercado de Alvalade, assim como outros produtos típicos.

Além do ananás em si, a empresa Boa Fruta produz também licor, compota de ananás (que o cliente pode experimentar gratuitamente na plantação, após a visita) e bombons de chocolate com ananás. Em 2022, serão lançados dois novos produtos, mas Luís Dâmaso decidiu não revelar quais.

Atualmente, a visita guiada às estufas é feita noutros moldes, devido à pandemia. Os visitantes usam o seu telemóvel para ler códigos QR com as explicações de toda a história e processo de produção do ananás, enquanto visitam as estufas (podendo sempre consultar os funcionários para esclarecer eventuais dúvidas).No que toca a novos desafios (e tendo em conta a grande oferta de ananás de todo o mundo), o entrevistado afirma: “Precisamos de mostrar em que é que somos diferentes. [Precisamos de mostrar] o porquê de dizermos que o nosso ananás é o melhor ananás do mundo”.

Fonte: Mariana Silva

Queijada de Vila Franca do Campo

Um dos produtos mais icónicos dos Açores e, em especial da ilha de São Miguel, é a queijada de Vila Franca do Campo. À conversa com Adelino Morgado, atual dono da fábrica, procurámos conhecer um pouco mais sobre o fabrico deste doce.

As queijadas de Vila Franca do Campo são de origem conventual e a sua origem remonta ao ano de 1522. Acredita-se que as mesmas surgiram de uma necessidade de aproveitar as gemas de ovos, uma vez que as claras eram utilizadas para fins religiosos. Além de gemas de ovos, outro ingrediente que está na base desta iguaria é queijo fresco, responsável pela alta durabilidade das queijadas. «Duram cerca de 20 dias. Ao terceiro ou quarto dia estão mais saborosas, por causa do queijo, que faz uma espécie de cura», revela Adelino Morgado. É esta durabilidade que permitia que, no passado, as queijadas conseguissem chegar em boas condições ao continente, em barcos de maior velocidade. 

Adelino Morgado, dono do negócio das Queijadas da Vila do Morgado. Fonte: Margarida Silva

As queijadas de Vila Franca do Campo do Morgado, acreditadas desde 1961, já são um negócio de família que Adelino Morgado herdou do pai. Em 2005, abriu o atual espaço de confeção e venda de queijadas, onde trabalham 17 pessoas. O processo de confeção dura 24 horas, e nesta fábrica são produzidas 17 mil queijadas por dia. Segundo o dono da fábrica, cerca de 90% da produção é exportada para outras ilhas dos Açores, para o arquipélago da Madeira, para o continente, para os Estados Unidos da América e para o Canadá. A exportação para o estrangeiro é mais intensiva no inverno, uma vez que, no verão, muitos emigrantes visitam a ilha e levam as queijadas no seu regresso.

Quanto a novas apostas, o proprietário das queijadas de Vila Franca do Campo do Morgado confessa não sentir apoio nem incentivo suficiente por parte do governo para o fazer.

A fábrica, localizada na marinha de Vila Franca do Campo, inclui uma zona de pastelaria, onde o cliente pode saborear as queijadas enquanto observa o trabalho das pasteleiras num espaço ao lado, separado por um vidro. Além disto, existe ainda uma exposição de quadros que ilustra todo o processo de confeção das queijadas.

Chá da Gorreana

Há muito tempo reconhecido como um produto típico dos Açores, o chá da Gorreana é produzido desde 1883.

Frente da Fábrica de Chá da Gorreana. Fonte: Mariana Silva

Madalena Motta, uma das proprietárias e membro da sexta geração à frente da fábrica, explica que tudo começou devido a um fungo que afetou a cultura da laranja (que era bastante importante economicamente). Em alternativa, a Sociedade Promotora Micaelense trouxe outras culturas, entre elas o chá. Na fábrica e na plantação, localizadas na freguesia da Maia, no concelho da Ribeira Grande, é possível fazer uma visita guiada (ou de forma autónoma), visualizar um vídeo sobre a história e produção do chá e, ainda, provar o chá preto e o chá verde, gratuitamente. Além da visita à fábrica, é possível passear pela longa extensão de terreno de plantação de chá, espaço que já serviu de cenário para algumas novelas.

A Fábrica de Chá da Gorreana trabalha em parceria com a Universidade dos Açores para o desenvolvimento de novos chás, como, por exemplo, de um que promete auxiliar na memória e concentração. “Sei fazer chá, não sei trabalhar num laboratório. Há que saber ir buscar conhecimento onde nos falta”, confessa Madalena.

Embora uma percentagem do chá tenha como destino o restante território português, há exportação para outros países. O principal é a Alemanha, mas também há exportação para a França, Estados Unidos e Canadá. 

Madalena Motta mostra-se confiante no futuro da empresa e orgulhosa por poder afirmar que “é a família quem trabalha para a Gorreana e não a Gorreana que trabalha para a família”, destacando a segurança do negócio e a estabilidade que este ofereceu à família.

Licores Mulher do Capote

Sempre presentes nas festas dos açorianos, os licores da Mulher do Capote começaram a ser produzidos há 30 anos.

Fonte: Mariana Silva

Carolina Ferreira conta que tudo começou com o seu avô, que produzia aguardente nos anos 40 e passou esse conhecimento ao filho: o pai de Carolina e atual dono da fábrica. Este, por sua vez, iniciou a produção de licor de maracujá, que é o licor mais premiado internacionalmente, contando com seis medalhas de ouro. Além do licor de maracujá, os outros dois licores mais tradicionais são o de anis e o de amora. No entanto, a Mulher do Capote já conta com vários licores e outras bebidas, como gins-licores, por exemplo. Segundo Carolina Ferreira, a bebida que mais intriga e agrada os clientes é o licor de arroz doce.

As principais exportações destinam-se ao chamado Mercado da Saudade (Canadá, Estados Unidos e Bermudas).

Carolina Ferreira confessa que um dos maiores orgulhos da empresa é o de ter visitas desde sempre: “O meu pai, sendo um emigrante e homem visionário, sempre dizia: ‘venham ver a nossa fábrica!’. Sempre tivemos muito brio em que vissem a nossa fábrica, que é uma fábrica limpa e organizada.”

No que diz respeito a objetivos, para Carolina passam essencialmente por crescer no mercado, não perdendo a essência da tradição do “menino mija” (uma tradição de natal açoriana que consiste em visitar casas de amigos e familiares, que têm sempre a oferecer doces e petiscos, acompanhados de licores). É o que mais alimenta o negócio.

Relativamente a novos produtos, todos os anos há um novo lançamento, mas que, por questões de marketing, não pôde ser revelado na entrevista.

Fonte: Mariana Silva

Chocolates d´O Chocolatinho

Não são de todo dos produtos mais tradicionais dos Açores, mas se pecam em tradição, ganham em inovação. A origem dos chocolates foi na Prova de Aptidão Profissional de Tiago Alves, criador e dono d´O Chocolatinho. Na sua PAP, Tiago criou alguns sabores de chocolates que hoje fazem parte do cardápio da chocolataria.

Tiago Alves trabalhava no meio da cozinha, nomeadamente como sushiman, mas nunca ligado ao chocolate. Porém, após ter feito alguns bombons de chocolate para uma festa de família, começou a receber telefonemas de convidados da festa a pedirem encomendas dos famosos chocolates. Primeiramente, não mostrou interesse no negócio, mas, mais tarde, passou a ter um espaço na cozinha da mãe para a criação dos chocolates. Dado o volume das encomendas, viu-se obrigado a abrir um espaço próprio.

Atualmente existem dois estabelecimentos d´O Chocolatinho: um na Vila de Rabo de Peixe e outro no centro da Ribeira Grande.

Nas chocolatarias estão sempre disponíveis dez sabores de chocolates fixos: ananás, pimenta da terra, chá verde, vinho de cheiro, licor de tangerina, licor de amora, beterraba, morcela e ananás, maracujá e hortelã pimenta.

Caixa com os sabores de chocolates fixos. Fonte: Mariana Silva

Tiago confessa: “Gosto de coisas diferentes”. Acredita que essa vontade de fazer diferente, tendo sempre como inspiração os sabores dos Açores, é a alma do seu negócio. Além dos sabores fixos, tem uma enorme variedade de sabores de bombons e trufas de chocolate, que vão desde os sabores mais convencionais (como amendoim ou caramelo) até aos mais diferentes (chegou a ter chocolate com algas dos Açores).

N´O Chocolatinho, também é possível encontrar outros produtos, como brownies, bolos e chocolate quente.

Quanto a novos produtos, a chocolataria vai sempre acompanhando as festividades e, como tal, os próximos produtos incluirão desde amêndoas de chocolate de diversos sabores até ovos de colher com brigadeiro.

O principal interesse do dono d´O Chocolatinho é abrir uma loja em Ponta Delgada, mais dedicada à pastelaria e com sistema de drive-through, embora acredite que seja um projeto ambicioso e para um futuro não tão próximo.

Fonte: Mariana Silva
Fonte: Mariana Silva

Agora que saboreou os Açores através destas linhas, acredito que o leitor se sinta, de certo, tentado a saborear estas iguarias pessoalmente. 

Revisto por Ana Sofia Cunha

AUTORIA

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Margarida sempre se interessou pela escrita desde pequena. Nasceu em São Miguel, nos Açores, mas mudou-se para Lisboa para ingressar na ESCS e seguir o seu sonho e vir a ser jornalista nos grandes meios de comunicação portugueses. Desde fevereiro de 2022 até junho de 2023, foi editora de Grande Entrevista e Reportagem, mas agora aceitou o desafio de ser Diretora-Geral da ESCS Magazine. Espera estar à altura.