Quando o conteúdo se torna lixo
Sou um entusiasta das redes sociais, assumo. Aliás, sou dependente do online, na sua generalidade. Não arrisco afirmar que sou viciado, pois um verdadeiro viciado não o admite. (Pronto, provavelmente, sou mesmo…) Eu sou daquelas pessoas que, quando acorda, a primeira coisa que faz é pegar no smartphone, que está em cima da mesa-de-cabeceira – convém que esteja ali à mão de semear. Em meia dúzia de minutos, consulto o que foi publicado, durante as últimas horas, no Facebook e no Instagram. É mais forte do que eu…
Mas adiante. A introdução do parágrafo anterior serve apenas para fazer a ponte para uma constatação meramente pessoal (se calhar, não sou o único): a de que o meu feed do Facebook está, cada vez mais, minado por lixo. Se eu fosse um analista de uma qualquer agência de notação financeira – daquelas que a crise da troika celebrizou –, sugeria que se baixasse o rating dos conteúdos partilhados no Facebook para o nível de lixo. Bem sei que a palavra pode soar exagerada mas serve para ilustrar o meu ponto de vista.
Pessoalmente, considero que um dos maiores benefícios das redes sociais passa pela partilha de conteúdos que vão ao encontro dos meus interesses/gostos. Partindo do pressuposto – nem sempre correcto, é verdade – de que a nossa rede de amigos comunga connosco determinados interesses/gostos, acaba por ser normal encontrarmos no feed informações que despertam a nossa atenção. Acima de tudo, a partilha destes conteúdos funciona como uma ferramenta essencial para me manter actualizado relativamente a certas temáticas – sejam lúdicas ou profissionais. No entanto, o algoritmo do Facebook tem as suas manhas e, por vezes, acaba por nos impingir coisas que são um autêntico tiro ao lado – quero lá saber de receitas milagrosas para obter abdominais dignos de um super-herói em apenas dez dias ou de frases feitas de âmbito espiritual/exotérico/da auto-ajuda.
Nestas andanças da comunicação, sempre me disseram (e eu concordo) que o conteúdo é rei. É certo que o meio importa – já McLuhan dizia que “o meio é a mensagem” – mas, no final de contas, é o conteúdo que dita o sucesso da mensagem.
Por tudo isto, confesso que começo a sentir-me frustrado ao percorrer o feed do Facebook e ao verificar que a maioria dos conteúdos é lixo. E espanta-me, igualmente, as fontes destes conteúdos: sites que, à primeira vista, me parecem do mais suspeito que pode existir. E surpreende-me que alguém os considere credíveis ao ponto de partilhar os seus conteúdos.
Neste sentido, sinto que o potencial das redes sociais, principalmente do Facebook, se começa a desvirtuar. Aceito que contraponham, argumentando que eu tenho uma visão demasiado romântica daquilo que é o Facebook. Na verdade, recuando até 2009, quando criei a minha conta, o Facebook pouco mais era do que meros quizzes. A partir daí, sofreu uma evolução qualitativa brutal. Mas, não querendo bater mais no ceguinho, considero que estamos a assistir a uma regressão.
Sendo eu um entusiasta das redes sociais – foi assim que comecei este artigo, lembram-se? –, acredito que o Facebook (e outras tantas redes sociais que poderia nomear) é, acima de tudo, uma praça pública de excelência que, utilizada da melhor forma, é capaz de promover um sentido democrático, caracterizado pelo pluralismo dos seus intervenientes. E o conteúdo é a ferramenta ideal para materializá-lo.
(Este artigo foi escrito ao abrigo do Antigo Acordo Ortográfico.)
AUTORIA
Diz que é o cota da ESCS MAGAZINE. Testemunhou o nascimento do projeto, foi redator na Opinião e, hoje, imagine-se, é editor dessa mesma secção. Recuando no tempo... Diz que chegou à ESCS em 2002, para se licenciar, quatro anos mais tarde, em Audiovisual e Multimédia. Diz que trabalha há nove no Gabinete de Comunicação da ESCS – também é o cota lá do sítio. Diz que também por lá deu uma perninha como professor. Pelo caminho, colecionou duas pós-graduações: uma em Comunicação Audiovisual e Multimédia (2008) e outra em Relações Públicas Estratégicas (2012). Basicamente, vive (n)a ESCS. Por isso, assume-se orgulhosamente escsiano (até ser cota).