“Serei um melhor jornalista se for um bom pai”
Entrevista a Marcos Pinto
Podes ouvir a entrevista completa em:
Quis ser padre; quis ser militar; disseram-lhe que tinha perfil para ser camionista e hoje em dia é pivô na TVI24.
Faz televisão actualmente, mas começou na Rádio Clube Português.
Diz que a rádio é a vida dele, a grande paixão da vida dele.
Marcos, a vida trocou-lhe as voltas ou foi o Marcos que trocou as voltas à vida?
Iiiiiih… Que grande pergunta… Ah… (Pensativo). Eu acho que as duas coisas. Até uma determinada altura da nossa vida, quando estamos em casa dos pais, temos uma história familiar que nos agarra no tempo. Mas depois – eu acho que a chegada à universidade também foi um pouco isso – tu consegues agarrar o teu destino e acho que foi isso que aconteceu. Tive uma infância e uma juventude muito felizes no Norte, na Beira Alta, na minha aldeia. Depois estudei em Viseu. Mas o que é que me trouxe realmente para Lisboa? Foi o sonho da comunicação e o sonho da rádio acima de tudo. É engraçado: apesar de estar a fazer televisão hoje em dia a rádio é a minha cena.
“A rádio é a minha cena.”
Há quanto tempo não estava num estúdio de rádio?
Já há algum tempo, confesso. Estou um bocadinho emocionado e um bocadinho com inveja também. Não queres trocar de lugar? Vens para aqui, eu faço-te as perguntas e ponho música… Como dizia há pouco a rádio é a minha cena.
Se tivesse agora a proposta de integrar um projeto sólido na rádio largava tudo e aceitava?
Eh pá, acho que sim (risos), mesmo. Tenho muitas saudades de fazer rádio, muitas mesmo. Foram os tempos mais felizes da minha vida profissional e quando fazes uma coisa de que gostas muito na tua profissão isso estende-se também ao teu dia-a-dia e à tua vida. Esses tempos foram tempos – primeiro como jornalista na Rádio Clube e na Rádio Comercial, depois como locutor na Rádio Clube Português enquanto rádio de palavra – muito marcantes, foram experiências muito marcantes, e se tivesse de voltar acho que sim…
“Tenho muitas saudades de fazer rádio.”
O programa “No Tom Certo”, que apresentou na TVI24, era um programa de conversa em que entrevistou músicos portugueses e em que incluía a música deles.
Existe um tom certo para uma entrevista?
É uma boa pergunta… Eu acho que uma conversa tem sempre de estar no tom certo. Quando há química, quando há empatia entre o entrevistador e o entrevistado… Às vezes pode ser com um olhar, com um sorriso, com bom ambiente… A entrevista são as pessoas que a fazem. Eu acredito que sim quando o entrevistador está obviamente motivado para isso e também quando há por parte do entrevistado um à-vontade para muitas vezes entrar na conversa sem complexos e sem medos.
“A entrevista são as pessoas que a fazem.”
Porquê um programa sobre músicos portugueses e música portuguesa?
Bom, então aí vamos juntar as duas paixões: a rádio e a música portuguesa. Eu quando tive o programa na Rádio Clube Português – com muito orgulho – tinha uma liberdade total. Não havia playlist e com muito orgulho posso dizer que por lá passaram nomes como “Deolinda”. Foi a primeira aparição dos “Deolinda” num programa do que quer que seja; muitas vezes ainda brinco com a Ana Bacalhau sobre isso e ela lembra-se disso.
Era uma loucura, era a liberdade total, era uma liberdade criativa total e convidava quem queria e gostava de convidar. Podia fazer um pouco rádio à antiga: com um auditório, com pessoas ao vivo. Era, de facto, um programa de rádio, era a rádio na sua plenitude. E isso também tem muito a ver com a minha paixão pela música portuguesa: é um consumo intenso, a tempo inteiro; estou sempre atento aos grandes nomes, às grandes músicas do que se faz por cá.
“Duas paixões: a rádio e a música portuguesa.”
Disse numa entrevista que “a Comunicação Social de um país é o reflexo do grau de democracia e de liberdade de expressão e informação” desse mesmo país.
Os jornalistas em Portugal são livres e democráticos?
Eu tenho de acreditar que sim. Quando isso não acontecer estamos perante um grave problema. O país já viveu tão assombrado e com tanto medo durante tantos anos que é bom que isso nem sequer seja pensado ou se for recordado é só para destacarmos aquilo que vivemos hoje. Fala-se muitas vezes em pressões, em lobbies, mas, acima de tudo, temos de acreditar em redações completamente genuínas e abertas em que o jornalista – obviamente obedecendo a um código deontológico não só daquilo que rege a profissão mas também daquilo que é a directriz da redação onde está inserido – tem de ter liberdade criativa para contar uma história.
Nunca sentiu pressões de outro estilo?
Não, sinceramente nunca me aconteceu. A verdade é que também nunca tive um registo de grande investigação ou de reportagem especial, não. O meu registo sempre foi na rádio ligado mais às artes e à cultura e na televisão foi também um pouco isso. Todos os programas que eu tenho ou que eu fiz na TVI24 são o reflexo disso mesmo: ou foram de música ou foram de artes. Depois também, claro, faço o trabalho de edição na TVI24 e apresento também as notícias. Tenho, obviamente, liberdade total para construir os meus textos. Portanto, eu nunca senti isso na pele, confesso.
“Tenho liberdade total para construir os meus textos.”
É fácil conciliar o lado profissional e o lado pessoal quando se é jornalista?
Não, não é.
Porquê?
Porque o jornalismo é uma profissão muito exigente. Exigente na preparação, exigente nos horários. Muitas vezes estou a apresentar a “25.ª Hora” à meia-noite na TVI24 e, como podes calcular, isso implica uma logística familiar enorme porque as minhas filhas ainda são pequenas. A Matilde vai fazer quatro anos e a Madalena vai fazer dois. A Matilde ainda é uma menina muito pequenina, a Madalena então é um bebé que requer toda a atenção e todos os cuidados e não é nada fácil. Não é nada fácil porque é uma profissão muito exigente. Aconteceu há pouquíssimo tempo: eu estava a editar de manhã e fiquei praticamente até às oito da noite. Não é fácil, não é fácil, não é nada, nada, fácil. Eu prezo muito ir levar as minhas filhas à escola, prezo muito ir buscá-las à escola e isso nem sempre acontece. Confesso que fico triste porque eu estou convencido de que serei um melhor jornalista se for um bom pai, mas, ao mesmo tempo, tenho noção de que a profissão é uma profissão muito intensa, muito exigente, muito desgastante e que muitas vezes não consigo estar em todo o lado. Por vezes é muito complicado quando a Matilde – que às vezes já parece ser mais crescida do que verdadeiramente é, ou pelo menos do que a idade aparenta – me coloca entre a espada e a parede e pergunta: “Pai, porque é que tens de ir trabalhar ao fim-de-semana?”. Não é normal uma criança que vai fazer quatro anos fazer aquela pergunta e ter noção da importância daquela questão. Não, não é fácil. Tento gerir a minha vida no dia-a-dia da melhor forma, e jogar, e saber responder aos imprevistos, e tentar, todos os dias, ser um bom pai, o melhor pai do mundo, e também o melhor jornalista possível. É isso que eu tento fazer.
“O jornalismo é uma profissão muito exigente.”
“Estou convencido de que serei um melhor jornalista se for um bom pai.”
“Tentar, todos os dias, ser um bom pai, o melhor pai do mundo.”
Quem é que eu devia convidar para uma entrevista para falar sobre a Rádio?
Umh… Tanta gente, meu Deus… (Pensativo)
Para te explicar um bocadinho sobre aquilo que tem sido a história da rádio num ponto de vista desportivo: o Fernando Correia. Se quiseres saber mais sobre a Rádio, sobre a evolução dos programas de rádio em Portugal, sobre como é que as décadas de 80 e 90 ficaram marcadas por um programa que foi um boom de audiências, podes convidar o António Sala, o grande António, para te falar do programa “Despertar”, por exemplo, da Renascença. Foi um programa absolutamente incrível. Eu com sete-oito anos ouvia aquilo e a Renascença não era para a minha idade, mas ouvia. Eu acho que podias convidar também o Pedro Ribeiro, que é o Diretor da Rádio Comercial. É um homem que percebe muito de rádio, tem sido muito inovador no novo conceito de rádio e é o grande responsável por um programa que é uma referência e que é líder nas manhãs da rádio em Portugal: as “Manhãs da Comercial”. Foram os três nomes de que eu me lembrei. O Fernando e o António para te contarem a história da rádio, o Pedro para te explicar como é que a rádio está hoje em dia e quais os desafios que a rádio tem de enfrentar.