Opinião

Socorro! Fui eclipsada! E agora?

Como já devem (ou deveriam) ter compreendido, não sou uma pessoa que se cala com peculiar facilidade. Às vezes, sou todo um oceano de honestidade e contestação. Por consequência deste comportamento (relativamente impulsivo), tenho-me deparado várias vezes com uma prática: o eclipsamento. “O que é isso, Mariana?”, pergunta o Carlos e todas as pessoas que não conhecem a pessoa que inseriu este termo no meu dicionário. Eu explico.

Eclipsamento é a prática de retirar (nada) discretamente uma pessoa de um determinado grupo de amigos sem que esta se aperceba até ter acontecido. É muito chato. Aconteceu-me umas três vezes e duas delas foram no último ano. A vez sobrante foi na primária e, apesar de ser provavelmente aquela em que menos culpa tive, foi a única que me doeu. Vá, a segunda também me doeu um bocadinho. Mas eram pessoas demasiado próximas. 

Voltando ao tutorial. Depois de terem o primeiro momento em que ficam chocados e pensam “Socorro! Fui eclipsada! E agora?”, é necessário que façam uma reflexão: qual foi o meu contributo para que isto acontecesse? Muitas vezes foram apenas vocês mesmos. Isto pode significar que os vossos amigos não prestavam ou mudaram. Talvez vocês não prestem ou tenham mudado. Uso a linha de pensamento que um dos eclipsadores me ensinou, antes de me eclipsar: “Quando uma relação – seja ela de que espécie for – acaba, há sempre culpa em ambos os lados.” Não acredito lá muito nisto. Até porque acho que culpa é uma palavra ultrapassada. Gosto de pensar que ambas as partes contribuem. 

Após identificar o erro, partimos para a segunda parte da questão: Podia ter evitado isto sem deixar de me sentir bem comigo mesma? Dando os meus exemplos, os afastamentos deveram-se a “pouca atenção” e não tolerar pessoas preconceituosas que não conseguem usar a ervilhinha que têm dentro da cabeça. Como podem reparar, não parei para pensar muito na segunda. A primeira levou-me a concluir que, para dar mais tempo à pessoa, teria de deixar de fazer o que me deixava feliz. E aqui seguimos Stuart Mill e o princípio da maior felicidade.

Podia ter deixado de fazer o que me fazia feliz e dar mais atenção às pessoas excluídas deste universo. Mas as pessoas excluídas deste universo não fizeram um esforço para puxar por mim e não paravam de fazer aquilo de que gostavam por mim. Relações com exigências unilaterais nunca têm um final feliz e a amizade chegaria a um fim.

Esta é a altura decisiva: depois de repensar em tudo, precisamos de compreender o que realmente queremos fazer. Como diriam as pessoas popularmente, “usar o coração”. Mas ao fim ao cabo voltamos a Mill: “O que te trará mais felicidade? E aos outros?”- se é que a esta altura ainda nos preocupamos com os outros. Nesta fase, não há conclusões certas. Como sou casmurra, deixo as pessoas irem à vidinha delas. Se gostar muito – muito (Muito |Muito|)  – mesmo da pessoa, provavelmente quererei pedir desculpa. Não para a ter de volta. Deus me livre implorar por alguém. Gosto de deixar as coisas com um final bonito. Mas também sei ter o amor próprio para ver que o sujeito não se importa comigo, por mais importante que a pessoa fosse para mim. Aqui resta desejar o melhor e andar em frente. Para a frente é que fica Lisboa e bem que eu sinto saudades de lá estar.

A vida encarregou-se de me tornar uma pessoa refilona, teimosa, intransigente e social. Comunico com pessoas, animais ou flores com muita facilidade, o que me leva a ter muitos amigos agradáveis. Além da facilidade de me inserir em grupos derivada das mudanças sucessivas. Por norma, encontro um poiso mais confortável e que me soma mais do que o anterior. Por isso, nada temas: vai tudo ficar bem e arranjas um novo ninho, passarinho. Fica tranquilo. 

Há aqui um fator importante que eu não mencionei: nem todos os que te eclipsam terão motivos para isso. Muitas vezes um grupo toma uma atitude em bando e decidem simplesmente ir atrás do principal lesado. A decisão pode ser motivada por vários fatores: a proximidade, a qualidade de trabalho ou as boleias ocasionais. Bom, como eu não tenho um carro e não dou uso à carta, perco neste último quesito. E está tudo bem. Se calhar tu tens essa vantagem. Como se diz em direito: analisando caso a caso, perceberás qual a sanção a praticar conforme os delitos cometidos. 

A parte boa dos eclipses: duram pouco tempo. Os astros alinham-se rapidamente e faz-se luz. 

Artigo revisto por Michelle Coelho

Fonte da imagem destacada: Sapo Tek (ou https://tek.sapo.pt/multimedia/artigos/as-imagens-mais-espetaculares-do-eclipse-total-do-sol-de-2019)