Cara de Poeta
Tens cara de poeta? Então deves usar óculos. Também deves ter barba de um mês por fazer e passar os dias em esplanadas a ler folhas e a escrever em guardanapos.
Não tens cara de poeta? Então deves ser apenas mais um a viver entre o comum dos mortais. Não deves de ler e muito menos de escrever em guardanapos.
Que suja que é uma sociedade que acha que a cultura reside na boca de quem sabe pedir um licor em francês.
Que nojo de engravatados que andam no poleiro de madeira da Assembleia a fazer com que os ignóbeis mortais deste Portugal achem que a cultura apenas pertence a quem sabe pedir um licor em francês. M… para esses enforcados! Sempre ameaçados por um bocado de tecido a que chamam de gravatas. Um acessório que é muito mais que um adereço. Um acessório que representa as mãos de um povo que, se não achasse que a cultura apenas pertencia a quem sabe pedir um licor em francês, não hesitaria em apertar o nó até que os pensamentos desses engravatados se esvanecessem.
Vivemos no preconceito de que a cultura pertence apenas a esses que sabem pedir um licor em francês e ficamos quietos. Estupidamente quietos. Talvez porque os impostos impostos pelos enforcados não nos permitem ir mais além. Tentamos trepar a oliveira mas não passamos dos primeiros galhos, e eles ficam lá em cima a rirem-se. Nós de ramos e folhas na boca ao mesmo tempo que eles se cobrem de azeite, ouro e vergonha.
Nós somos gravatas com medo de apertar os nós. Já eles, os enforcados, são inquisidores. Sentados no púlpito a ver as nossas cabeças pensar que a cultura apenas pertence a quem sabe pedir um licor em francês.
AUTORIA
O Tomás é um gajo com a mania de que sabe escrever e que tem opinião sobre tudo. Tem uma farta barba e reza a lenda que sem uma boa imperial nenhuma palavra lhe sai das mãos.