O lápis de pomar e o ferro de chafes
Quando a arte assume duas formas físicas, servindo o mesmo propósito, não existe qualquer aspecto passível de ser considerado um erro, uma imperfeição ou uma desconexão com a realidade. E é isto que o Atelier Museu Júlio Pomar – na Rua do Vale, em Lisboa – nos apresenta até dia 21 deste mês: a escultura e o desenho numa relação de confronto e, simultaneamente, de total harmonia.
Júlio Pomar e Rui Chafes: Desenhar dá início a um programa de exposições do Atelier Museu cujo objectivo é cruzar a obra de Júlio Pomar com a de outros artistas plásticos, de forma a «estabelecer novas relações entre a obra do pintor e a contemporaneidade».
A figura principal de toda a apresentação é o desenho, seja ele representado por linhas a carvão, grafite ou ferro, e o verdadeiro desafio é tentar compreender a forma como cada um investe naquele que é um diálogo acerca da realidade que nos rodeia.
A obra «Étreinte» (1979), de Júlio Pomar, que se traduz por «Abraço», apresenta o entrelaçamento dos corpos e a simultânea facilidade e dificuldade de conjugação dos mesmos – dificuldade representada pelos traços fortes e convictos e facilidade pelos traços leves, que demonstram este como um acto que está inerente ao ser humano.
Por outro lado, «As tuas mãos» (2013), de Rui Chafes, é apresentado em linhas de ferro tridimensionais, simulando a presença física de uma outra pessoa através de elementos que nos guiam no sentido da ligação e relação humanas – as mãos.
Rui Chafes, com 47 anos, formou-se em Escultura pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, em 1989, seguindo depois para Dusseldorf, onde frequentou a Kunstakademie, sob a direcção de Gerhard Merz.
Chafes sempre se interessou pela cultura e língua alemã, considerando-a «lógica, cristalina, precisa, clara», algo que acaba por se transpor para a sua visão da vida.
O escultor, cujo material de eleição é o ferro, já expôs em Portugal – em espaços como o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, o Museu Serralves e o Museu Colecção Berardo – e no estrangeiro – em países como Bélgica, Espanha, Itália e Dinamarca.
Contudo, há que realçar a importância que têm, para Chafes, os nomes dados às obras. Estes são escolhidos de forma a criar um maior impacto no público e revelam a ligação que o escultor tem também com a escrita.
Por outro lado, temos Júlio Pomar, um pintor português nascido em 1926 e pertencente à terceira geração de pintores modernistas portugueses.
Pomar passou pela Escola de Artes Decorativas António Arroio, pela Escola de Belas Artes de Lisboa e ainda pela do Porto. Devido à sua atividade militante, esteve preso, juntamente com Mário Soares. Contudo, acaba por se afastar da atividade política e fixa-se em Paris.
Na sua obra, é frequente a referência ao erotismo, a figuras mitológicas e ainda a personalidades e situações literárias, sendo, na maior parte das vezes, com o recurso ao desenho, mas também à pintura, gravura, cerâmica, colagens e assemblage.
Já expôs um pouco por todo o Mundo e, actualmente, apresenta a sua obra no Atelier Museu Júlio Pomar. Este inaugurou no dia 5 de Abril de 2013 e possui um acervo de cerca de 400 obras.
Com curadoria de Sara Antónia Matos, a exposição Júlio Pomar e Rui Chafes: Desenhar apresenta, assim, um confronto entre as obras destes dois artistas, partindo de uma noção elementar: a arte, independentemente da forma como é apresentada, não é um retrato fidedigno da realidade, mas um questionamento da mesma.