Opinião

Amigos Chegados – constrangimento ou elogio?

Este artigo vai ser uma análise pessoal à ferramenta “Amigos Chegados” do Instagram. Aquele círculo verde que delimita a fotografia de perfil de um utilizador. Antes de começar a opinar, é importante dar algum contexto. Tudo começou em junho de 2017, quando o Instagram anunciou que estava a testar uma forma de partilhar as publicações (neste caso, as stories) com um grupo mais restrito de seguidores. À data, chamava-se ‘Favorites’ e não ‘Close Friends’. Os testes correram bem e, depois de realizados os aperfeiçoamentos necessários, a ferramenta ficou disponível para todos no final de 2018. 

Desenvolveram-na, visando encorajar os utilizadores a publicar conteúdo de forma mais frequente, permitindo-lhes exercer um maior controlo sobre a sua audiência. Faz sentido, pois, muitas das vezes, podemos não querer publicar algo por acharmos que não faz sentido que todos os nossos seguidores consigam vê-lo (quer seja por falta de interesse, secretismo, o que for). 

No entanto, o maior incentivo surgiu quando os utilizadores começaram a criar ‘finstas’ – contas de Instagram privadas, nas quais supostamente só aceitavam os amigos próximos (ou quem quisessem que visse as publicações nesse perfil). No fundo, uma tentativa de restringir o acesso dos seguidores aos conteúdos. Tal cortava a interação desejada pela plataforma, pelo que tudo se alinhou para a criação dos ‘Amigos Chegados’ – nada mais, nada menos que uma parte privada de um perfil do Instagram, sem necessidade de criar uma conta separada. 

Esta lista pode ser modificada a qualquer altura – e ainda bem, porque tendemos a afastar-nos de uns e a aproximar-nos de outros. Ah! E também cortamos laços, por isso, não convém mesmo terem o passe VIP para o nosso Instagram. Melhor ainda, ninguém é notificado nem no ato da adição do seu perfil, nem no ato de remoção. Quão constrangedor seria receber uma notificação com “pessoa x removeu-te dos seus Amigos Chegados”?

Uma imagem com texto

Descrição gerada automaticamente

Imagem cedida por Mariana Coelho

Não obstante, esta criação trouxe muitos outros embaraços. Apesar de não sermos notificados de quando nos retiram tal privilégio, demora pouco a apercebermo-nos de que nunca mais vimos o círculo verde naquela pessoa. O que a levou a incluir-nos? E a excluir-nos? Foi falta de interação? Um afastamento? Nunca saberemos, pois é demasiado mau perguntar.

Ainda assim, o pior é mesmo quando temos plena noção de que, apesar de termos decidido permitir que a pessoa visse os nossos conteúdos exclusivos, ela não fez o mesmo connosco. Claro, nem toda a gente aderiu a esta moda, mas as conversas são como as cerejas. Não está escrito no livro de etiqueta dos Amigos Chegados que se eu te ponho tu tens de me pôr. Contudo, acaba por ser um pouco triste pensar que eu gostava de que a pessoa visse as minhas stories privadas e ela não quer o mesmo. Falta de confiança? Não sei. Descamba em mim toda uma espiral de “fiz mal em adicioná-la?”, “será que achou estranho?”, “não confia em mim?”… 

E depois disso? Removemos a pessoa? Esperamos interagir o suficiente com ela para ganharmos um lugar na lista VIP? Não ligamos? Se calhar isto sou só eu e a minha capacidade desmedida para overthinking. Mas dá que pensar. Tenho sempre receio de que aconteça aquilo que muitas vezes sinto: de um dia para o outro, aquela pessoa com quem já não falas há meses/anos ou até com quem nunca falaste aparece com um círculo verde. Por que raio estou incluída na lista dela? Amigos chegados? Conhecidos, no máximo. A meu ver, isso é só estranho. “Ah, mas eu meto nos Amigos Chegados todos aqueles que não me importo que vejam as minhas figuras”. Legítimo, mas não deixa de ser aleatório.

 Há sempre a outra face da moeda. Quem nunca ficou feliz por ver que determinada pessoa o adicionou, quando não estava nada à espera? Quer seja por não se considerarem próximos, por já não falarem há um tempo, por terem trocado apenas umas palavras. No fundo, tem tudo que ver com a perceção que temos de cada pessoa. Se engraçamos com ela, podemos achar esquisito, mas acabamos por nos habituar e por nos sentirmos lisonjeados. Se a pessoa não nos diz nada, desejamos que existisse um botão para nos retirarmos.

‘Favoritos’ era um nome péssimo para esta invenção, mas ‘Amigos Chegados’ também não é o melhor. Eu tenho amigos lá que não são tão chegados assim. Porém, se calhar não me importava de ser mais próxima deles e criar mais oportunidades de interação pode levar a esse fim. Ou então simplesmente posso querer que a pessoa veja um lado de mim que dificilmente passa para o resto do meu público do Instagram. Estão lá amigos chegados, claro, mas também pessoas com quem estou diariamente e com quem posso comentar acontecimentos que presenciaram. Estão pessoas que raramente vejo, mas com quem quero manter a proximidade – e nada melhor para alimentar a ilusão do “nada mudou entre nós” do que “pessoa z respondeu à tua história”. Uma interação simples, mas que pode salvar amizades.

Pode parecer superficial, exagerado, o que quiserem. No entanto, todos temos aquelas amizades que, devido às diferentes circunstâncias, aos caminhos opostos, acabam por desvanecer. Nunca conseguimos combinar nada, os horários são incompatíveis e já não é como antes. Durante o ano letivo, o estágio ou o trabalho (enfim), não temos propriamente tempo nem paciência para conversas de elevador virtuais. Mas também é difícil arranjarmos vontade para enviar uma mensagem com tudo o que se tem passado na nossa vida ultimamente. Assim, em pleno século XXI, um emoji, um meme, um like podem ajudar a manter a chama da amizade acesa. “Nunca mais falei com a Joaquina” – sobre os meus problemas familiares? Sobre as notas? Sobre aquele caso amoroso? Até posso não ter falado. Mas vou sempre trocando umas impressões no mínimo semanais, como quem diz “Olá! Estou aqui! Vi o que meteste! Obrigada por me deixares vê-lo!”
Uma imagem com texto

Descrição gerada automaticamente

Imagem cedida por Mariana Coelho

Não há limite para o número de pessoas que podemos incluir nos nossos Amigos Chegados. Há quem tenha apenas dez (e cumpra, à letra, esta funcionalidade), como há quem tenha cinquenta, sessenta. Como é óbvio, ninguém (acho eu) tem legitimamente essas dezenas todas de pessoas que considera amigos próximos. Portanto, o nome induz em erro e causa constrangimentos desnecessários. São pessoas de quem eu gosto, que eu admiro, de quem tenho saudades ou sinto pena de não ser tão próxima como desejaria. São as pessoas a quem eu não me importo de – e, aliás, até quero – mostrar o meu verdadeiro “eu”, a pessoa por detrás daqueles stories de comida, do meu cão, dos meus artigos… 

Sinto que passei a ver o Instagram com outros olhos desde a criação desta funcionalidade. Tenho conseguido manter muito mais o contacto com os meus amigos e interagir com alguns com quem não falava já há algum tempo. Consigo fazê-los rir, contar factos interessantes ou simplesmente entretê-los. Mesmo que esteja a analisar demasiado esta temática, é algo em que penso bastante, pelo que achei que merecia um artigo. Mesmo que fique magoada por, às vezes, não ter a reciprocidade que gostaria de ter, o feedback é, no geral, positivo. 

Já retirei pessoas, pois deixou de fazer sentido, assim como já adicionei pessoas por querer manter a proximidade. Já me debati internamente acerca de se devia colocar sujeito ou se seria constrangedor para ele. Já notei que alguém me tinha adicionado e parei para pensar se fazia sentido retribuir. No final de contas, é tudo muito subjetivo e tem apenas a importância que lhe quisermos dar. Se calhar, para ti que estás a ler, eu dou demasiada. Quem sabe. Apenas queria deixar claro o meu ponto de vista e as minhas intenções. Acho querido quando me incluem e acho devastador quando eu adiciono e não dão o mesmo passo. Será que devíamos poder aceitar/rejeitar uma entrada nos amigos chegados como se de um perfil privado se tratasse? Será que o melhor é limitarmo-nos mesmo aos amigos próximos? Será que não devemos sequer aderir? Não existe uma resposta certa, pelo que vou continuar a stressar com isto. 

Artigo escrito por Mariana Coelho 

Artigo revisto por Ana Cardoso

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