Editorias, Literatura

Desenhador de Palavras: J. R. R. Tolkien

Começo este Desenhador de Palavras por dizer que este será um texto muito difícil de escrever para mim, pela simples razão de não saber quando parar. Antes ainda de o começar a escrever, dei por mim a pegar na coleção (quase) completa e a folhear os diferentes livros, ler os índices e ver as ilustrações que os acompanham. John Ronald Reuel Tolkien é o criador de um dos universos mais excitantes e envolventes que alguma vez foram imaginados e, na minha humilde opinião, uma das melhores criações literárias (e não só!) de todo o sempre. Pai do género da alta fantasia, Tolkien (que faria este mês 124 anos de idade) deixou-nos um legado que continuará a alimentar a imaginação de milhões de pessoas em todo o mundo, bem como a intrigar os leitores pela sua complexidade e profundidade filosófica.

Nascido a 3 de janeiro de 1892 na África do Sul (a família mudou-se da Inglaterra para lá quando o seu pai foi trabalhar como gerente bancário), Tolkien vem de uma família da classe média, não tendo vivido muitas privações durante a infância. Regressa com 3 anos a Inglaterra com a mãe e o seu irmão mais novo e, um ano depois, morre o seu pai e a única fonte de rendimento da casa, obrigando os sobreviventes a irem morar com parentes da mãe. Em 1904 foi a vez de esta morrer, deixando o jovem Ronald (como era conhecido em casa), na altura com 12 anos, e o seu irmão aos cuidados de um frade católico, religião à qual a mãe se tinha convertido uns anos antes.

Da mãe recebeu o gosto pela leitura, pela linguagem e por línguas estrangeiras (com ela aprendeu básico do latim) e pela botânica, área de estudo muito visível e que iria aprofundar muito nos seus trabalhos futuros; do frade que o criou aprendeu os fundamentos da religião e do misticismo católico, que teriam uma importância fundamental na criação e desenvolvimento do seu legendarium. Tolkien foi, desde sempre, um excelente aluno, tendo ganho uma bolsa de estudos na King Edward’s School, em Birmingham, onde inventou não uma, mas duas línguas imaginárias com três outros colegas (quem leu o O Senhor dos Anéis ou O Hobbit decerto perceberá a importância deste facto).

Durante a sua juventude criou grupos de poesia com os colegas; escreveu versos; viajou pela Suíça (viagem que, segundo escreve numa carta em 1968, influenciou a viagem inesperada de Bilbo e dos seus 12 companheiros); começou a namorar aos 16 anos com Edith Bratt, que viria a ser a sua mulher até à morte da mesma em 1971; matriculou-se em Oxford, primeiro em Estudos Clássicos para depois mudar para Língua e Literatura Inglesas; terminou o curso com honras de primeira categoria 1915. No ano anterior, estalou a 1ª Guerra Mundial na qual Tolkien apenas no ano seguinte, para poder terminar o curso. Esteve destacado em vários locais em Inglaterra antes de ser enviado para França para a frente de combate. Foi durante a sua estadia no acampamento de Étaples, norte de França, que JRR Tolkien daria os primeiros passos numa caminhada literária que seria, no mínimo, épica.

Com o fim da Grande Guerra, Tolkien volta para Inglaterra onde exercerá vários cargos ligados ao estudo e desenvolvimento da língua inglesa, germânica, entre outras: trabalha para a Oxford English Dictionary; na Universidade de Leeds, onde se torna o professor mais novo de sempre; em Pembroke College; na Universidade de Oxford; e, ainda, como criptógrafo durante a 2ª Guerra Mundial. Morre a 2 de setembro de 1973, após 81 anos de um vida repleta: escreveu centenas de textos de carácter filológico e filosófico; mais de duas dezenas de livros sobre o Universo da Terra Média; foi ordenado cavaleiro pela rainha Elizabete II, em 1972; viveu duas guerras mundiais; segundo o The Times, foi considerado o 6º melhor escritor britânico após 1975; e viu a obra da sua vida tomar proporções épicas inimagináveis.

Se já consideramos a biografia do autor, no mínimo, interessante, o que dizer da sua vastíssima obra? A trilogia central d’O Senhor dos Anéis, a “prequela” d’O Hobbit, o verdadeiro Génesis que foi O Silmarillion (o meu livro preferido de todo o universo pela sua magia, mística e impulso criador), Os Contos Inacabados… A lista seria interminável. Em todas as obras, cada um com as suas especificidades, Tolkien desenvolve temas filosóficos, religiosos, explora apresenta-nos mundos desconhecidos com um pormenor e um detalhe aliciantes, envolve-nos em intrigas e batalhas que nem as excelentes adaptações cinematográficas conseguem totalmente recriar.

No fundo, JRR Tolkien fez mais do que escrever livros. Como outros escritores do tempo dele, como C.S. Lewis (do qual foi amigo), ou outros mais recentes, como J.K. Rowling ou George R.R. Martin, ou ainda cineastas como George Lucas e Steven Spielberg, o que ele conseguiu fazer foi criar um mundo diferente que granjeou milhões e milhões de fãs ao longo dos anos. Mais que um escritor, Tolkien é um artista, um criador, o verdadeiro senhor dos anéis, que leva numa viagem inesperada todos aqueles que se atreverem:

“The Road goes ever on and on,
Down from the door where it began.
Now far ahead the Road has gone,
And I must follow, if I can,
Pursuing it with eager feet,
Until it joins some larger way
Where many paths and errands meet.
And whither then? I cannot say.”