Opinião

Destruição de monumentos: o caminho a seguir ou atentado à História?

O último ano foi marcado pelo acentuar de uma onda de preocupação com o racismo sistémico iniciada pela morte de George Floyd e têm-se levantado questões sobre a legitimidade da destruição de monumentos com ligação ao racismo. O movimento que chegou a Portugal no verão de 2020 com a vandalização de uma estátua de Padre António Vieira criou petições para demolir a Torre de Belém e o Padrão dos Descobrimentos.

O pensamento parece ser que não podemos ter como atrações turísticas símbolos do colonialismo, nem devemos homenagear personalidades racistas. Contudo, há quem pense que o movimento é apenas baseado na vontade de destruir ou em extrema sensibilidade. Ora, não concordo plenamente com nenhuma das visões.

Se, por um lado, não concordo que as pessoas que defendem a destruição dos monumentos apenas queiram pedras a cair porque sim, por outro, não consigo concordar com a destruição de pedaços de História.

História é História, é o passado coletivo de todos nós e que não vai mudar por ser apagado. Manter registos não significa que defendemos a repetição ou o prolongamento dos erros morais que esses registos possam representar – o objetivo é precisamente o contrário. O esquecimento dá espaço para a repetição das ações do passado. Por este mesmo motivo, mantêm vários países os seus campos de concentração. Nunca se ponderou destruir os campos de concentração e o facto de os oficiais nazis terem apagado um sem número de provas dos crimes que cometeram é algo que até hoje atormenta muitas vítimas. Os presos dos campos de concentração eram praticamente qualquer pessoa que não fizesse o estereótipo de ariano forte e superior, o que incluía fatores racistas. Por isso, questiono-me porque é que se quer eliminar monumentos como a Torre de Belém, mas não os campos de concentração.

Fonte da imagem: DW

Outra questão que coloco é se, seguindo este pensamento, deveríamos substituir o nosso Hino e Bandeira? O Hino tem frases como “[Portugal] Deu novos mundos ao mundo! Às armas, às armas! Sobre a terra, sobre o mar” e a Bandeira tem símbolos como a esfera armilar. Ambas são claras referências do colonialismo. Assim, devemos alterar estes símbolos que, tanto quanto os monumentos, representam Portugal e são representações de Portugal para o estrangeiro?

Não penso que seja razoável apagarmos estes pedaços da nossa História, pois, se o fizermos agora, criamos um precedente para que daqui a 500 anos os portugueses retornem a apagar os eventos de hoje e não tardará a chegar o dia em que somos um povo sem História. Um dos países mais antigos do mundo, mas sem um vestígio físico do seu passado e da sua evolução.

A preservação de monumentos serve para educarmos as futuras gerações, para lhes podermos contar os erros que nós e os nossos pais e avós fizeram e que esperamos que eles nunca façam. Os erros são coisas que nós achávamos que iam correr bem e que, com a experiência, aprendemos que não era correto. A única forma de as pessoas evoluírem é ao experienciar algo ou ouvir a experiência de outras pessoas. Se eliminarmos estes pedaços da nossa História, então retiramos um importante ponto de aprendizagem.

Entendo, contudo, que a vontade de não homenagear o racismo e de ter oponentes monumentos que celebram ou simbolizam os descobrimentos e o colonialismo pode tornar-se problemático.

Em vez de deitarmos abaixo estes monumentos, podemos usá-los como degrau para a luta contra o racismo e usá-los para de certa forma controlarmos a nossa narrativa. Isto é, apagarmos as provas do passado cria espaço para que pessoas racistas possam fazer as novas gerações acreditar que aqueles acontecimentos não se passaram ou que não foram como dizem – como algumas pessoas tentam fazer com o nazismo, mas que a existência dos campos de concentração os limitam. Ao invés disso, podemos assumir os acontecimentos e usar os monumentos para educar contra o racismo e iniciar conversas sobre o que podemos fazer para evoluir nesta questão.

Não apaguemos o passado, mas aprendamos com ele e no futuro criaremos monumentos ainda maiores que representem essas lições.

Fonte da imagem de destaque: SAPO 24

Artigo revisto por Ana Janeiro

AUTORIA

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A Constança é aluna de Relações Públicas e Comunicação Empresarial, sendo uma nerd pela estratégia e pela comunicação interpessoal. Com uma paixão por escrever e debater, a escrita de opinião sempre foi o elemento natural desta autora. O seu objetivo é conseguir ser versátil na escrita ao abordar todo o tipo de temáticas e receber feedback que a ajude a elevar a sua escrita para o próximo nível.