O Brasil é pequeno para uma Karol gigante
Já anda nisto desde os seus 16 anos, quando ganhou um concurso de rap, mas parece que no ano passado o Brasil “tombou” ao som da genialidade musical de Karoline de Freitas Oliveira, ou, como é conhecida, Karol Conka. O seu single “Tombei”, uma colaboração com a dupla eletrónica brasileira Tropkillaz, invadiu as rádios nacionais e levou Conka para outro patamar: o de ser considerada uma das grandes figuras do rap brasileiro, o que a leva a viajar pelo mundo, para divulgar os seus trabalhos (esteve em Lisboa na edição do Vodafone Mexefest do ano passado, e quem teve a oportunidade de assistir ao espetáculo, garante que não se esquecerá tão brevemente).
Quem agora está a ler este artigo devia abrir o motor de busca do Spotify e pesquisar Karol Conka – a seguir, optar pelos seus temas mais famosos, ou recuar à altura em que lançou os seus primeiros trabalhos. Percebe-se aqui que o mundo de Karol é um mundo de uma rapariga que por muito passou e que soube transmitir isso nas suas letras, para além de usar a sua música como uma arma que defende a igualdade, a compaixão e, sobretudo, o feminismo. “A mão que aponta é a mesma que vai aplaudir” (como canta em “A mão que aponta”) e todos já estão em pé a aplaudir Conka. O concerto no Lollapalooza Brasil do mês passado está lá para comprovar que esta não é uma artista cuja carreira se esgota num hit de rádio.
Aponta como principais influências Rihanna, Beyoncé, Bob Marley e Amy Winehouse. Musicalmente, nota-se a importância de Santigold, M.I.A, Lauryn Hill na composição dos seus temas.
Lança em 2013 o seu primeiro, e até agora único, álbum, Batuk Freak. “Boa noite”, o tema que introduz este trabalho de Conka, é mais um dos motivos de orgulho do rap brasileiro e mostra que Karol vai para além do simples ato de rappar, através dos instrumentais: africano, eletrónica, reggae. Há de tudo neste Batuk Freak: é um hip hop de todas as cores. “Uma voz me chamou dizendo: ‘pode vir’” / “Vim de longe sem esquecer tudo o que já vivi” / “Do gueto ao luxo eu vou”. É a vitória não só da rapariga Karoline, mas de toda uma população oprimida e que nasce sem as mesmas oportunidades do que o resto do Brasil, seja pela sua cor de pele, ou pelo facto de ter nascido mulher.
Afeiçoou-se agora à eletrónica, e parece não querer largar a dupla Tropkillaz: já lançou dois singles, e prepara o lançamento de “Tocou na Pista”, que também conta com MC Carol. Em “É o Poder”, reforça o seu statement: “Sociedade em choque eu vim pra incomodar” / “Quem foi que disse que isso aqui não era pra mim se equivocou” / “Fui eu quem criei, vivi, escolhi, me descobri e agora aqui estou”. E quase um milhão de pessoas, nas plataformas de streaming, estão aqui com ela.
O mundo precisava de uma Karol Conka, e esta apareceu no momento exato. Não é que o Brasil tenha muitas rappers (mulheres e negras) nacionais, mas Karol mostra que é possível ser-se artista, mulher e negra naquele país. Nunca se desligando das suas origens, mostrou que a humildade pode ser sinónimo de poder e de sucesso. É como se estivesse a nascer alguém que trouxesse esperança aos jovens mais desfavorecidos, e que mais do que conquistar a esperança, pode conquistar uma indústria machista, e conquistar a vitória.
Quando era mais nova, a sua avó ensinou-a a não se curvar perante nenhum homem. Quem diria que anos mais tarde o mundo curvar-se-ia perante a “pequena” Karoline.