Artes Visuais e Performativas, Editorias

Primeiro Impacto em Primeiros Sintomas com Thomas Mendonça

Um sábado outonal típico. No Cais do Sodré distingue-se facilmente quem mira estas paisagens pela primeira vez de quem já é visitante habitual. Esse era o meu caso.

Contudo, surgiu-me a oportunidade de visitar um espaço do qual nunca ouvira falar – o Primeiros Sintomas. Um local intimista, acolhedor, situado mesmo por detrás do Mercado da Ribeira, onde se realizam desde pequenas produções de teatro como exposições.

E foi no Primeiros Sintomas que estive à conversa com Thomas Mendonça: jovem francês de 24 anos que reside, actualmente, em Lisboa, cidade onde estudou desde cedo. Proprietário de um talento inspirador, divertido e capaz de nos pôr a reflectir, a sua produção manifesta-se maioritariamente na cerâmica e no desenho.

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PRIMEIROS SINTOMAS – Espaço onde está a exposição

OMNIPOTENTIS 4in1
A exposição surgiu, inicialmente, devido a um livro de Rodrigo Barros, editado pela Associação dos Albergues Nocturnos de Lisboa, intitulado de Pomar, repleto de testemunhos de homens que vivem nas ruas da capital e pernoitam num albergue.

Thomas nada sabia sobre os rostos ou lugares presentes em Pomar, permitindo, assim, que os desenhos resultantes em OMNIPOTENTIS 4in1 fossem livres de qualquer constrangimento.

Sem quaisquer constrangimentos, também, se passou a nossa conversa, onde pudemos conversar um pouco sobre a exposição, o presente e o futuro.

OMNIPOTENTIS 4in1 estará no Primeiros Sintomas até ao dia 15 de Outubro, quinta-feira, e estará de portas abertas das 17h00 às 22h00. Pode-se ainda comprar uma rifa pela módica quantia de um euro que permite concorrer no sorteio por um desenho da exposição à escolha.

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“Seven Rivers” – POMAR, p. 121.

Maria Bargado: Acreditas em algo omnipotente, que tudo pode, Thomas?

Thomas Mendonça: Sim. Acredito que a morte, sinceramente, é omnipotente. Tenho tido provas de que simplesmente esta é a única que tem poder sobre todos nós e actua de forma justa. Todos acabamos por sofrer, de uma maneira ou de outra, pela morte.

M.B.: Se acreditas apenas numa força omnipotente, qual a origem do número quatro associado à omnipresença no título?

T.M.: O título deriva apenas do desenho que escolhi para ser cartaz da exposição. O desenho teve origem numa das histórias do livro Pomar que falava de uma nave espacial do planeta XKL23 OMNIPOTENTIS e, após alguma pesquisa no Google, não encontrei nada para além de que XKL23 é um produto anti-séptico 4 em 1 que estava em japonês.Pode parecer, por vezes, que tenho uma abordagem pouco séria para com o meu trabalho, mas acho que tenho algum humor e gosto de trabalhar com ele.

M.B.: Sendo tu um artista muito novo, como é que te sentes recebido pelo público mais jovem?

T.M.: Eu não tenho um público-alvo, mas os desenhos resultantes desta exposição são melhor aceites pelos jovens. Isto não quer dizer que o público mais velho com um background mais aberto não acabe por captar o humor e alinhar nas piadas dos desenhos.

M.B.: Portugal, nomeadamente Lisboa, apoia os artistas?

T.M.: Lisboa está a crescer a um nível cultural de uma maneira um pouco contraditória. Nos últimos anos temos tido menos apoios culturais. Contudo, nós não ficámos parados e foram criadas novas estruturas e plataformas que não apresentam qualquer apoio nem são oficiais mas que, a pouco e pouco, vão ganhando força e poder. É fantástico ver uma cultura que podia ser frágil tornar-se forte e independente.

M.B.: Será, talvez, dispensável perguntar se gostas de viver em Lisboa.

T.M.: Sim! Aliás, eu falo muito bem de Lisboa a toda a gente.

M.B.: De que sentes mais saudades quando estás em França?

T.M.: Do sol, claro. O sol muda o nosso dia-a-dia por completo e nós não temos consciência disso. O facto de estar bom tempo permite que as pessoas saiam à rua e as habitem durante mais tempo. Permite que o Bairro Alto esteja cheio durante o ano inteiro, o que me faz muita falta em França, onde as festas são em casa, os círculos mais privados e fechados e onde não se encontra o contacto humano, caloroso, tipicamente português.

M.B.: Thomas, após esta exposição, que acaba já esta quinta-feira, quais são os projectos que tens em mente?

T.M.: Neste momento estou a preparar a minha próxima exposição, no café Ahoy, na Costa da Caparica, onde serão expostos desenhos na mesma linha destes. Depois espero passar um mês em Berlim, para aproveitar o mau tempo.

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Entrevista a Thomas Mendonça