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Room, um Mundo Entre Quatro Paredes e as Maravilhas de uma Mãe

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E se um dia acordares longe da tua família, dos teus amigos, da tua vida normal, e perceberes que estás há sete anos confinado a um pequeno barracão num quintal, donde de uma pequena abertura no teto uns débeis raios solares conseguem iluminar de esperança a lúgubre rotina desesperante daquelas míseras dezenas de metros quadrados? Emma Donoghue elucida-nos sobre essa desconfortante realidade com o filme Room, baseado no livro que a própria escreveu em 2010.

A narrativa inicia-se in media res, passados vários anos desde que Joy Newsome (Brie Larson) fora raptada e trancada dentro de um barracão nas traseiras da casa de Old Nick, homem que a violava todas as noites e com quem acabou por conceber um filho, Jack (Jacob Tremblay). Apesar de ser fruto dessas violações, Joy nutre um imenso amor pelo pequeno rapaz de cinco anos não só por ser a sua única companhia mas porque Jack a ajudou a eufemizar os intermináveis dias dentro do sombrio barracão ao qual deram o nome “Room” e do qual acabam por escapar.

A construção da trama é simples e assenta em sólidos alicerces que concedem uma fluidez natural aos acontecimentos da ação, divididos em duas partes distintas: na primeira metade, pretende-se estabelecer uma ligação emocional com a audiência através da relação mãe/filho e do carinho mútuo entre eles: prova disso é a forma como são o amparo um do outro em cada momento difícil.

Decerto que os espetadores mais jovens, como eu, se reviram nos comportamentos de Jack, característicos de uma criança inocente que procura respostas que expliquem a ambiguidade da natureza, que explora o mundo para construir a sua realidade, que vive aventuras todos os dias, abrindo portas à imaginação permitindo-lhe que escreva a sua própria história, mas com a máxima de nunca poder ser contrariado, caso contrário… entra a birra. E juntamente com as birras de Jack e com os consequentes sermões de Joy, surge mais uma teia de emoções transversal a qualquer mãe (e pai!) que os leva a recordar os complicados e já distantes dias quando castigavam por preocupação e amor os seus pequenos filhos, que agora delineiam o seu futuro ou até já contam com um projeto de vida completo.

Estas emoções paternais acima descritas funcionam simultaneamente com o lado mais dramático apresentado na segunda metade – o da aceitação de uma realidade diferente e o do regresso à vida normal. Para uma criança que durante a sua curta existência julgava o mundo como um pequeno espaço, a demolição das paredes que delimitavam a sua realidade são como um choque repentino que precisa de ser amortecido para que se processe a adaptação a uma nova vida, até agora desconhecida. A ajuda de uma mãe sempre presente é fundamental, mesmo que ela sinta dificuldades em retomar a sua vida normal. A presença da família é fundamental para ultrapassar estas barreiras, mas ainda mais importante é o auxílio do seu filho, que apesar de estar numa idade associada à ingenuidade, é quem melhor entende o sofrimento da mãe e quem mais se quer sacrificar para assegurar o seu bem-estar.

As cenas que acabei de descrever só foram possíveis graças à entrega de todos – argumentista, realizador, atores, a produção inteira! Donoghue sabia melhor que ninguém como gerir as personagens e a sua colaboração com o realizador Lenny Abrahamson foi fundamental para captar a essência de cada uma das cenas, que atingiram o seu zénite com as fantásticas atuações de Brie Larson e do rapaz Jacob Tremblay (vamos ver o que lhe reserva o futuro!). Não me admira nada, portanto, a aclamação universal que o filme obteve e que levou Room a ser nomeado para diversos prémios, incluindo os Óscares para Melhor Filme, Melhor Realizador, Melhor Argumento Adaptado e Melhor Atriz Principal para Brie Larson, que acabou por ser laureada com a estatueta dourada, que levou para casa tal como fizera nos Golden Globes e Prémios BAFTA.

Room foi um dos pontos fortes do cinema em 2015, tocando-me bastante ao relembrar-me dos belos tempos passados enquanto criança com os meus pais (não dentro de um barracão, claro). Concluo assim esta crítica, disfarçada de análise às relações entre mãe e filho(a), com uma afirmação com que muitos podem não concordar (o que compreendo pois a relação que tenho com a minha mãe é única): Room corrobora a tese de que não há nada mais forte no mundo que a ligação entre uma mãe e um filho. Citando Norman Bates em Psycho : “A boy’s best friend is his mother”.