Música

Tilt: num nível único e fascinante

Pouco tempo depois da aparição com o tema Vazio, na Primeira Vez, da Antena 3 – série na qual Sam The Kid convida rappers a expor uma música inédita –, Tilt volta a contagiar-nos com a sua lírica pesada e única no panorama atual. Falo-vos sobre Sai-te caro (III), o novo single dos ORTEUM, produzido pelo Vadio num contexto em que Tilt é figura de proa. Trata-se de um trabalho repleto de qualidade, como um puzzle no qual todos encaixam e sobressaem à sua maneira. 

Primeiro, a curiosidade de qualquer ouvinte é despertada quando uma música de hip hop começa com uma adaptação da Telepatia, de Lara Li. Interpretada pela melodiosa voz de Merai – calma e tranquilizante –, em contraste com a robustez do timbre inconfundível de Tilt nos versos iniciais.

Nas backs, Mass nunca desilude; e com o seu tom mais agudo complementa na perfeição os graves de Tilt. Já para não falar da contribuição de Nero no trabalho de estúdio e do Uno no baixo. Só seria melhor se estes últimos entrassem no esquema rimático, enriquecendo-o ainda mais.

Fonte: Youtube

Para os apreciadores de rap, este som tem de estar obrigatoriamente nas vossas playlists. Por outro lado, aos amantes da língua portuguesa – e em especial da poesia –, aconselho que acompanhem com atenção as letras deste jovem de Almada. São verdadeiros poemas; talento puro e já com mais de uma década de aperfeiçoamento. Ano após ano, Tilt continua a subir uma escadaria lírica que lhe permite estar próximo do nível de Nerve e Sam The Kid – dois dos mais conceituados rappers portugueses.

De resto, o refrão faz jus à fasquia ORTEUM, uma vez que é simples e fica no ouvido. Os trocadilhos também são uma imagem de marca do grupo. Neste caso, e retirando apenas um de vários exemplos presentes, nos versos “Personagem principal que acaba num sidecar // A vida de barata sai-te cara”, as palavras utilizadas no final de cada verso combinam foneticamente graças à sua semelhança e funcionam perfeitamente no jogo de palavras que se quer fazer.

Em relação ao videoclipe realizado por Sebastião Santana, destacam-se o mistério e a feitiçaria, fazendo a ligação com a voz introdutória. Traz de volta esta essência macabra aos vídeos da crew (como aquele que deixo abaixo) pelos insetos, velas e bonecos apresentados de forma sinistra. Além disso, a nível técnico, o que salta mais à vista é a opção pela imagem “distorcida”, que apenas foca as coisas ao centro, como se de um olhar embriagado ou equivalente se tratasse.

Em jeito de conclusão, deixo um dado interessante: os versos “Mas isto tem baratas // Mete água para descer e sente as patas” estão presentes nas duas músicas com os vídeos mais tenebrosos.

Fonte: Youtube

Fonte da capa: Sebastião Santana

Artigo revisto por Andreia Custódio

AUTORIA

+ artigos

Juntou-se à secção de Música na ESCS Magazine para poder escrever sobre os sons que tanto o arrepiam. Traz uma visão ampla sobre a nova escola do “hip-hop tuga underground” - o estilo que se propõe a acompanhar com maior regularidade. Procura distanciar-se dos artistas mais comerciais e focar-se em nomes menos sonantes, que merecem o devido reconhecimento.