Informação

Uma Civilização Perdida na Amazónia: uma Nova História a “LiDAR”

Uma rede de cidades interconectadas com mais de 2500 anos foi descoberta na Amazónia. São as estruturas mais antigas até hoje encontradas na região e são as ruínas de mais uma sociedade sul-americana.

Desde a chegada dos europeus ao continente americano, surgiram rumores, vindos das capitais dos Impérios Asteca e Inca. De boca em boca, circulava o boato de uma cidade escondida no coração da Amazónia, tão avançada como estas, mas com um pequeno fator que a destacava: era coberta por ouro. Surgia assim a lenda do El Dorado.

Muitos tentaram encontrá-la, mas todos falharam. Só em 1906 é que a curiosidade voltou. Percy Fawcett, explorador britânico, inspirado pelo mito da cidade áurea, começou as suas expedições pela Amazónia, com o objetivo de encontrar uma cidade perdida, agora em ruínas, a que daria o nome de “Z”. Mas as expedições não duraram muito. Em 1925, Fawcett desapareceu, na sua oitava expedição. Nada de relevante foi encontrado e, assim, durante muito tempo, acreditou-se que a floresta era hostil demais para suportar uma população.

Novas buscas e primeiras descobertas

Há cerca de trinta anos, Stéphen Rostain, arqueólogo francês, e a sua equipa decidiram voltar à densa floresta amazónica. Não com El Dorado ou Z em mente, por ser algo utópico demais, mas sim na esperança de encontrar apenas e só algum vestígio de civilização. Não demorou muito para que o fizessem. Encontraram objetos em cerâmica decorada, algumas canecas com resíduos de uma cerveja de milho, chamada Chicha, e ainda, algumas estruturas com o toque humano.

Descobriram estradas vindas da Bolívia até ao Brasil, algumas pirâmides e terraplanagens artificiais. Tudo indicava que já tinha vivido ali uma sociedade grande e complexa, mesmo antes da chegada dos colonizadores europeus.

Vasos de cerâmicas descobertos por Stéphan Rostain, na Amazónia.
Fonte: CNN

Sem papéis de “certidão de nascença” para descobrir a idade destas estruturas, há que adotar outros métodos. Neste caso, a datação por radiocarbono. Muito resumidamente, praticamente tudo na Terra contém carbono. Existem vários tipos deste elemento. Entre eles está o C12, o átomo mais comum, e o C12, um isótopo mais instável que vai desaparecendo ao longo do tempo. Medindo a diferença entre esses dois é possível estimar a idade de um objeto com 60 mil anos.

Com toda a datação feita, concluiu-se que as civilizações habitaram aquela primeira região entre 500 a.C. e 600 d.C.

Escondida a leste do equador

A janeiro deste ano, foi publicado na revista Science o estudo de Stéphen Rostain e com ele novas descobertas: cidades construídas há mais de 2500 anos – um milénio mais velhas que as anteriores encontradas -, interligadas por estradas e ruas, assim “como Nova Iorque”, afirmou o arqueólogo. São estas ligações que sugerem precisamente a existência das cidades no mesmo período. Cidades que ao todo se estima terem suportado mais de 30 mil pessoas.

Mapeamento do Vale Upano, mostrando estruturas interligadas por estradas.
Fonte: Deutsche Welle


Estariam repletas de casas em volta de praças, estruturas cerimoniais e ainda algumas quintas. Algo incomum antes da descoberta da “terra preta”, um terreno fértil das margens do rio. Como o resto da Amazónia possui uma terra ácida demais para a agricultura, durante muito tempo foi negada a existência de uma civilização fixa na região. Seria apenas e só, esporadicamente, povoada por pequenos grupos de caçadores-coletores.

Estas cidades situam-se no Vale Upano, no Equador. Isto porque a floresta da Amazónia não se alastra apenas pelo Brasil, e sim para mais sete países, cobrindo uma área de 6.7 milhões de quilómetros quadrados. Mais de 70 vezes o tamanho de Portugal. 

Extensão da Amazónia e região onde se localizam as cidades com mais de 2500 anos. Fonte: Canva

Foram descobertos cinco grandes complexos populacionais e mais dez um pouco mais pequenos ao longo de 300 quilómetros quadrados dentro do Vale Upano. Contabilizam um total de mais de 6000 estruturas, escondidas do olho humano por milénios, mas não suficientemente bem escondidas às novas tecnologias, como a LiDAR (Laser Detection and Ranging).

Aviões equipados com esta tecnologia conseguem enviar pulsos de luz infravermelha que se penetram mais eficazmente na folhagem e copa das árvores, atingindo o solo e voltando até ao sensor. É medido o tempo do pulso e, assim, se calcula a distância. São revelados, desta forma, os mapas topográficos da superfície da floresta amazónica e, com eles, as estruturas em ruínas e estradas enterradas. 

O mito do El Dorado permanece exatamente como o nome indica, um mito. Prometia ser uma cidade coberta de ouro, mas o que se veio a descobrir não ficou longe de ser uma fortuna. Pelo menos para os arqueólogos, que começam assim a reconstruir um novo capítulo da história. Uma civilização que sobrevivia às hostilidades da Amazónia e prevaleceu por muitos anos na região.

Pouco ainda se sabe, em comparação com outras civilizações, como os tão conhecidos Maias, mas talvez, no futuro, se compreenda de facto a complexidade e diversidade da civilização que por aqui habitava. 

Fonte da capa: Revista Science

Artigo revisto por Beatriz Morgado

AUTORIA

+ artigos

Seria clichê dizer que eu era uma criança irrequieta. Seria clichê e errado, porque nunca fui. O pequeno Bruno gostava de estar no seu canto, sossegado, a descobrir o máximo de coisas possível e a aplicar as aprendizagens para criar o que lhe apetecesse. Hoje em dia, a única coisa que mudou foi a minha altura. Sempre fui um ávido do conhecimento e sempre o espalhei com prazer. Talvez tenha sido por isto que segui Jornalismo e não as outras mil opções que tinha em mente, porque condensa tudo o que mais amo.