Literatura

Uma ode à esperança

Lançado em outubro pela editora Oficina da Escrita, Baloiço de Papel é o primeiro livro de Gonçalo Sereno. As suas páginas transportam-nos para a pacata vila de Santa Helena, onde conhecemos Isaac, Rosarinho e o seu inseparável grupo de amigos. Profundamente apaixonados desde o primeiro momento, Isaac e Rosarinho têm, mesmo em tenra idade, uma ligação que poucos compreendem. Acabam, no entanto, por ser separados pelo destino. 

A sinopse deste livro apresenta-o como uma “ode à esperança, mostrando que nunca é tarde para reencontrar o que nos pertence verdadeiramente”. O seu autor é natural do Cartaxo. Para além de escritor, é responsável de produção numa fábrica em Alpiarça, colabora com o jornal A Voz de Pontével e pertence à companhia de teatro Os Kaspiadas. 

Neste artigo, Gonçalo Sereno fala-nos da paixão pela literatura e da escrita deste primeiro romance.

Como surgiu a tua paixão pela escrita e o que te levou a escrever esta história?

A minha paixão pela escrita foi tardia, tinha apenas ideias e o sonho de que um dia iria escrever algo. Os anos foram passando, provavelmente fruto da minha incapacidade de acreditar em mim – ainda hoje luto incessantemente contra esse sentimento. Mas antes da paixão pela escrita, veio a paixão pela literatura. 

Essa despertou na minha adolescência, quando uma querida professora de Português me “obrigou” a ler Os Maias, de Eça de Queiroz, que era obrigatório no programa escolar. Na altura pensei em ler apenas a sebenta, por pensar que ia ser muito enfadonho. Hoje percebo que a insistência daquela professora mudou a minha vida, não apenas no sentido de vir a gostar de literatura. Acabei por ler toda a obra de Eça e passar a outros autores. Desde então que respeito muito a profissão de professor (pode, literalmente, mudar rumos de vida).Aliado ao meu amor pela escrita, fui amadurecendo a ideia de escrever algo para além de textos nas minhas páginas de redes sociais e jornais locais. Acabei por concretizar esse sonho, com muitas dúvidas, receios e interrupções. No fundo, foi o sonho que me levou a escrever esta história”.

De que forma é que as tuas experiências do quotidiano influenciaram a criação da vila de Santa Helena e dos seus habitantes?

Capa do livro Baloiço de Papel, de Gonçalo Sereno
Fonte: Bertrand

Foram vários os fatores: a minha história de vida, as minhas inspirações literárias, o meu amor pelo nosso país, pelo nosso Ribatejo. Apesar de não querer cingir o meu estilo literário a uma região em concreto, escolhi também por uma questão de conforto, para que numa primeira obra conseguisse ter o maior conhecimento possível sobre o que estava a escrever, além da investigação que fiz em determinadas áreas, para não ser confrontado com inverdades ou factos mal descritos. Tentei também não aprofundar ao pormenor para não correr o risco de fugir à realidade”. 

Ao longo do enredo, as personagens passam por uma grande fase de crescimento. Qual foi a personagem que mais gostaste de desenvolver?

Custa-me definir qual foi a personagem – mas, para além da Rosarinho e do Isaac, também a Vera e o Jeremias concluo que quase dividiram o protagonismo. Mas adorei desenvolver cada uma delas, todas desenvolvidas por mim num processo moroso e de constante mutação, chegando a alterar personagens e histórias de um dia para o outro”.

Há algum tema neste livro que gostarias de ter aprofundado mais?

Sim, havia tanto para desenvolver, cada história de amor e ódio, mas, para uma primeira obra e, contrariando a minha vontade, num banho de realidade, acabei por ceder”. 

Há algum capítulo ou passagem de que gostes particularmente?

Pedir-me para nomear um capítulo em especial é quase como perguntar a um pai de que filho gosta mais. Cada capítulo foi especial, desafiante e importante no desenrolar da história. Adorei cada página”. 

Que desafios enfrentaste durante o processo? 

O sonho, a vontade incessante de dar a conhecer esta minha história, a ausência de experiência na construção de um livro e o querer provar o contrário a mim próprio; a vontade de superação e o tempo dedicado, as noites perdidas, os fins de semana, as férias, enfim, o pouco tempo disponível”. 

Nos dias mais complicados, o que fez com que continuasses a escrever? 

A vontade de difundir as palavras sonho e amor – e o nunca desistir da nossa verdadeira história”.  

Como descreves o processo da escrita até a publicação?

Como autor de um primeiro livro, cada parágrafo foi uma aprendizagem; não tive ninguém com experiência que me guiasse. Imaginei o que queria que o meu livro fosse e tentei não defraudar quem o comprasse. Fiz investigação daquilo que achava que poderia vir a ser alvo de correção (como os episódios com as avionetas, por exemplo). 

Encontrar uma editora que quisesse publicar o livro também foi um salto no desconhecido. Perdi um pouco o encanto pelas editoras nesta fase, mas, perante tantas incertezas e dificuldades, penso que após o lançamento tudo o que aconteceu foi gratificante”. 

Como conciliaste a tua vida profissional tão atarefada com o processo de escrita de um livro?

A conciliação entre qualquer atividade paralela, a nossa vida profissional e a pessoal resume-se a palavras como sacrifício, abdicar, sonhar e acreditar. É um pouco de tudo isso”. 

Que conselho dás a quem quer começar no mundo da escrita, mas não sabe como fazê-lo?

Acima de tudo, acreditar sempre na capacidade de fazer sonhar e acreditar; e o máximo respeito para quem estamos a dirigir a nossa escrita, mas sem nunca defraudarmos a nossa consciência. Escrever o que sentimos sem fretes, mesmo que vendamos um só livro”. 

Que livros ou autores influenciaram a tua escrita?

Essencialmente Eça de Queiroz, no aspeto da descrição do meio envolvente. Penso ser muito importante para o leitor no sentido de conseguir entrar mais facilmente na cabeça do escritor e naquilo que realmente estava a idealizar no momento em que estava a escrever”. 

O que podemos esperar de projetos futuros?

Continuar a escrever, a realizar-me enquanto ser humano e a ajudar a proporcionar bons momentos a quem ler o que eu escrever”. 

Como te sentes em saber que o teu livro chegou finalmente às mãos dos leitores?

Realizado, honrado por cada uma das pessoas que leram e gostaram do meu livro. Sinto que um sonho foi realizado e que muitos mais virão”. 

Fonte da imagem de capa: Jornal de Cá

Artigo revisto por Liliana Braz