De mal-amados a favoritos no Marquês: os heróis improváveis do título do Sporting
Viktor Gyokeres e Rúben Amorim são indiscutivelmente as figuras da conquista da Liga Betclic. Ainda assim, houve espaço para as eternas promessas, para os desacreditados e até para os encostados que apareceram nos momentos-chave da temporada leonina.
Em agosto, a falta de profundidade era apontada como a principal fraqueza do Sporting 23/24, que tinha acrescentado qualidade individual, mas que ainda não tinha plantel para lutar pelas várias competições. Mesmo assim, Morten Hjulmand acrescentava frieza e qualidade com a bola ao meio-campo, enquanto Gyokeres trazia poder de fogo a um ataque órfão de uma figura de área. O sueco que quase ganha jogos sozinho, na sua primeira (e talvez única) época em Portugal soma números estratosféricos: 41 golos e 14 assistências em 47 jogos.
A chegada de Gyokeres permitiu ainda tirar o peso dos ombros do jogador que mais divide os adeptos leoninos: Paulinho. Nem o golo do título frente ao Boavista, em 2021, tornou a vida mais fácil ao avançado que sempre foi acusado de não ter faro de golo para ser titular no ataque do Sporting.
A importância do minhoto durante a construção, de costas para a baliza, sempre foi desvalorizada em prol da narrativa da falta de golos, também ela exagerada (marcou 14 em 21/22 e 15 em 22/23). Esta temporada, mais descaído pela esquerda, Paulinho mostrou os dentes quatro vezes nos primeiros três jogos, tendo sido decisivo para um arranque 100% vitorioso.
Tudo somado, os 13 golos na Liga, do tal avançado que não marca, já “deram” 15 pontos aos leões. Paulinho e Gyokeres rapidamente bateram as alegações de que não podiam jogar em simultâneo, complementando-se na perfeição. A maior mobilidade do sueco permite baralhar e bater marcações, abrindo espaço para o português, mais fixo, finalizar.
Flexibilidade e mobilidade são as palavras que melhor descrevem o ataque leonino, de longe o mais concretizador da Liga, com 92 golos marcados. Pote alternou entre o meio-campo e o trio da frente, Marcus Edwards pecou na consistência e Francisco Trincão ressuscitou em 2024.
frente ao Dumiense, o extremo formado no Braga levou a sério o lema “novo ano, novo eu”. O pé esquerdo que encantou meia Europa voltou a deslumbrar na segunda volta, na qual apenas não foi titular numa ocasião. As partidas na Amadora (uma assistência) e em Barcelos (dois golos) foram o expoente máximo do talento de um predestinado que está no lote de possíveis convocados para o Euro 2024.
O ressurgimento de Trincão, mas também de Eduardo Quaresma, que faz a exibição de uma vida frente ao Porto em casa, surgiram numa fase decisiva da temporada do leão. As idas de Morita e de Diomande para a Taça Asiática e para a CAN, respetivamente, foram dores de cabeça mais pequenas do que o previsto inicialmente. Mérito para Rúben Amorim pela maneira como conseguiu gerir o plantel de forma que cada jogador menos utilizado, e que tivesse de entrar no onze, encaixasse na perfeição no modelo de jogo.
A ausência de Morita foi a oportunidade perfeita para Daniel Bragança se afirmar finalmente na primeira equipa do Sporting. Depois de empréstimos a Farense e a Estoril e de ter estado tapado por João Mário e Matheus Nunes, 22/23 parecia ser a sua chance de brilhar. Contudo, num jogo de pré-época, o criativo sofreu uma rotura no ligamento cruzado anterior do joelho direito o que o afastou dos relvados durante toda a temporada.
A contratação de apenas um substituto para Manuel Ugarte reforçou a confiança do clube em Bragança, que gradualmente voltou a ganhar ritmo competitivo. Quando finalmente se sentiu 100% confortável com a bola e no choque, o meio-campo do Sporting ganhou um novo maestro.
A bola nos pés do menino da Academia de Alcochete não chora e tem olhos, seja por entrelinhas ou a variar pelos corredores de jogo. A colocação de Bragança mais perto da grande-área permite criar situações de superioridade numérica com a bola e recuperá-la mais rapidamente assim que esta é perdida. À entrada da área foi também onde o médio centro marcou a maioria dos cinco golos que regista esta época.
Se o sucesso de Bragança na primeira equipa era preconizado desde os tempos da formação, o mesmo não se pode dizer de Geny Catamo. O ala aproveitou as lesões de Fresneda e a estagnação de Esgaio para assumir o corredor direito, depois de dois empréstimos sem brilho ao Vitória e ao Marítimo. O bis frente ao Benfica no jogo do título transportou o menino de Moçambique para a imortalidade no reino do leão, que explodiu com o seu segundo golo, já depois dos 90.
Não só de festejos da máscara se fez uma temporada histórica em Alvalade que teve no espírito coletivo de betão a sua principal arma para recuperar o campeonato que lhe fugia desde 2021.
Fonte da capa: O Jogo
Artigo revisto por Madalena Ribeiro
AUTORIA
Desde miúdo que tinha duas paixões, a escrita e o desporto. Ao crescer percebi que combinar as duas áreas e tornar-me jornalista desportivo era o meu objetivo de vida. Gosto de dizer que fui criado por Pablo Aimar, Lionel Messi e Matías Fernández, dada a quantidade de horas que passei a vê–los distribuir classe e sonho pelos relvados. Tenho uma lista com duas páginas de estádios míticos que quero visitar e sim, a Bombonera está em primeiro lugar.