Grande Entrevista e Reportagem

MATXO AKADIGRAZ, DA COVA DA MOURA PARA O MUNDO

Matxo AkaDigraz, um jovem cabo-verdiano da Cova da Moura, canta rap crioulo desde muito novo. Hoje, procura atingir o estatuto profissional na área da música, determinado a atingir os seus objetivos e ser mais uma voz da mudança, está sempre na luta para deixar a sua marca neste mundo.

Neste momento, já tem lançadas quatro músicas cujos títulos são: “Balling”, “Ser Forte”, “Ta Dipendi De Mi” e “Oto Vida”. Todas elas individuais, exceto a mais recente, “Balling”, que conta com a colaboração de Bex AkaDigraz (membro do seu grupo musical). Todas retratam a sua jornada e o seu lema, mantendo-se real a quem é.

Fotografia cedida por Patrícia Pinto.
Fotografia cedida por Patrícia Pinto.

Em entrevista à ESCS Magazine, Matxo deu a conhecer a Cova da Moura e a sua beleza, desde a arte de rua à comunidade que nela habita de forma unida. Passando pelos becos e ruas da zona, foi possível visitar dois sítios que se encontram no spotlight da Cova da Moura: a associação do Moinho da Juventude e a loja Bazofo & Dentu Zona.

Fotografia cedida por Patrícia Pinto.
Fotografia cedida por Patrícia Pinto.

Qual foi a tua maior inspiração para entrar no mundo musical?

“Ver os meus amigos a fazer música. Ao crescer ouvia rap de forma mais regular e essa foi a minha maior motivação para iniciar também, para além disso, o meu estilo de vida. Com isso, comecei a fazer música em Cabo Verde quando tinha 13 anos, com os meus amigos, éramos um grupo de 3 rapazes.”

Quais foram as maiores dificuldades que sentiste ao começar? E consideras que vires de um sítio intitulado de bairro social influenciou o teu percurso?

“No início, não senti nenhuma dificuldade. Comecei a sentir dificuldade só quando comecei a levar isto mais a sério e, sim, influenciou o percurso pelo estilo de vida que levo.”

Qual a importância da música na tua vida?

“É a minha vida. Tenho que fazer música para estar bem comigo mesmo. Já não vejo outro porto seguro se não for a música.”

Fotografia cedida por Patrícia Pinto.
Fotografia cedida por Patrícia Pinto.

Qual a origem do teu nome artístico “Matxo”?

“Vem de infância mesmo. Agora, AkaDigraz é que veio da rua devido a um grupo que tínhamos feito em 2015. Todos os que faziam parte do grupo eram AkaDigraz. Para além de mim, o único que também anda a fazer música de momento é o Bex AkaDigraz.”

Qual foi a música mais gratificante de fazer para ti?

“Não consigo dizer, porque em tudo o que faço meto lá imensa energia e tento entregar-me a tudo mesmo de coração, sem distinção.”

Qual a mensagem que cada uma delas pretende passar?

“Ser forte, incentivar os ouvintes a levantar a cabeça acima de tudo. Aprender a enfrentar os altos e baixos, sempre com fé.”

Fotografia cedida por Patrícia Pinto.
Fotografia cedida por Patrícia Pinto.

Vi que as tuas letras se baseiam muito na tua luta, qual a importância para ti de transmitir isso para o teu público?

“É gratificante saber que as pessoas estão a identificar-se comigo, que estão a consumir algo que conseguem sentir. Dá para ver que não sou o único a passar por tal situação e é mesmo importante para mim que consumam a minha música de uma forma positiva. Não dá para fugir à minha essência e à minha história, por isso fico mesmo grato por essa ligação com os ouvintes.”

Quais os projetos que estás a planear fazer nos próximos tempos?

“Estou na luta para ver se dia 5 de julho consigo lançar um vídeo de uma música. A música é uma homenagem para a qual estou a fazer t-shirts com o Bazofo, para transmitir uma mensagem. Neste momento, estou a focar-me em completar e promover tudo.”

Fotografia cedida por Patrícia Pinto.
Fotografia cedida por Patrícia Pinto.

Se pudesses descrever a tua arte numa palavra, qual seria?

“Força, como nas camisolas diz: ser forte. Ser forte é o lema que levo. Para além disso, os títulos das músicas que já fiz, que representam o que quero demonstrar. Depende de ti e procurar outra vida, de acordo com o meu trabalho mesmo e a imagem que procuro transmitir da minha música.”

Como queres que se recordem de ti?

“Como uma lenda. Quero fazer história. Quero ser como o meu avô, que me inspirou a ser um homem melhor. Para além disso, o meu avô sempre contava-me histórias sobre Amílcar Cabral, que foi colega de carteira dele. Isso inspirou-me a perceber que posso lutar pelo que quero e não devo desistir.”

Se pudesses deixar uma mensagem para quem está a ler, qual seria?

“A vida é aquilo que tu sentes. Seja qual for a dúvida, a resposta está dentro de ti. Não adianta ouvir pela boca do mundo. Tenta sempre ser tu mesma/o, para encontrares o caminho que procuras para ti.”

Há quanto tempo vives na Cova da Moura?

“Não sei ao certo, porque andei sempre a pular entre França e Portugal.”

O que consideras que a sociedade e membros da autoridade deviam de fazer para ajudar a melhorar a imagem e vida da Cova?

“Mostrar a verdade que aqui se passa, não mudar como a media o faz, os jornais e isso. É o que chega nos ouvidos de fora. Se falam que aqui é perigoso, o público vai sempre acreditar. Na verdade, há aqui muita riqueza e é importante que transmitam uma imagem melhor do sítio, como ele realmente é. Por isso, é que importante as pessoas virem cá conhecer e ver pelos seus próprios olhos.”

Fotografia cedida por Patrícia Pinto.
Fotografia cedida por Patrícia Pinto.

Sentes que há abuso policial por se tratar de um bairro social? Se sim, de que forma?

“Acho que sim, como qualquer bairro. Fazem abuso que ninguém vê e é assim que as pessoas vivem. Daí a importância de contar a verdade do que acontece aqui dentro e em qualquer sítio.”

O que realmente carateriza o bairro?

“Nós, o povo cabo-verdiano que aqui vive, onde reside a cultura.”

Consideras que é, de facto, perigoso? E se sim, quando e porque é que começou a ser perigoso?

“Qualquer bairro tem algum perigo. No entanto, pelo que sinto e vivo, não acho perigoso. Não sinto que aconteça nada, mas há de tudo. Há muita gente que entra aqui com alguém, apresenta o bairro e no dia seguinte pode andar aqui sem problemas, como se não fosse nada e em paz.”

Quais as estratégias usadas para combater o crime na Cova da Moura? E quais consideras que devia de haver?

“A associação Moinho da Juventude foi a melhor coisa que criaram aqui. Lá meteram um estúdio que dá para gravar, Kova M Studio, que dá oportunidade às pessoas do bairro para investirem em algo e para ocuparem o tempo dos jovens, dos idosos, até há um clube de futebol e o apoio aos idosos.

São essas iniciativas e criação de atividades que permitem às pessoas ocuparem o seu tempo e focarem em algo positivo, desenvolvendo capacidades e integrando-se na comunidade.

No entanto, falta ainda muita coisa, precisamos de apoio. Para conseguirmos manter o que já temos e dar mais oportunidades, precisamos de apoio de fora para tornar isso possível. Porque são essas oportunidades para os nossos jovens seguirem os seus sonhos e trabalharem nas áreas que querem que faltam no sítio.”

Fotografia cedida por Patrícia Pinto.
Fotografia cedida por Patrícia Pinto.

Cova da Moura é um dos sítios mais promitentes de Lisboa. Com a ascensão de artistas nas diversas áreas, há uma mensagem cada vez mais positiva do local. Cheio da riqueza dos PALOP, especialmente da cultura cabo-verdiana, é uma comunidade pronta para mostrar os seus talentos. Aqui, temos o Matxo, como o talento mais promissor do rap da Cova. No entanto, há muitos mais nomes a serem divulgados. Há a ideia de que a arte é o reflexo de uma sociedade. Sendo assim, não há sombra de dúvidas da beleza da Cova da Moura e das pessoas tão boas que nela habitam.

Fotografia cedida por Patrícia Pinto.
Fotografia cedida por Patrícia Pinto.

Artigo revisto por Inês Pinto

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