Opinião

Venham com História(s)!

Ouve-se muitas vezes a célebre expressão “Não me venham com histórias!” ou, quando queremos realçar a nossa incredulidade: “Por favor, achas que acredito nisso? Não me venhas com tretas” (sim, há algumas versões que se adaptam ao nosso grau de cansaço relativo a coisas que se assemelham mais a contos com pontos acrescentados que a verdades factuais).

No entanto, há casos em que as histórias ou, melhor dizendo, a História, pode e deve ser invocada, e o significado das frases supracitadas perde-se, porque o necessário é ouvir muita mas MUITA História. Por vezes, achamos que uma situação não tem precedentes ou que algo acontece hoje de modo distinto ao de ontem. Encontramo-nos enganados, porque a Teoria da História Cíclica não serve para assustar as crianças ou os adultos descrentes. Resumidamente, quem a defende assume que tudo o que acontece já aconteceu de alguma forma, numa espécie de “re-acontecimentos”. Obviamente que a História não é uma ciência exata e a intervenção humana constitui um elemento para que a mesma não seja 100% linear. Contudo, quero abordar, neste artigo, os momentos em que associamos o presente ao passado, traçando uma linha contínua entre ambos.

No final de setembro, a Europa apercebeu-se de que o partido Alternativa para a Alemanha havia chegado ao Bundestag (Parlamento) com 13% dos votos e que, para surpresa geral, constitui o primeiro partido de extrema-direita a ter algum poder no pós segunda-guerra. As justificações para esta pequena grande e alarmante “vitória” da parte dos cidadãos ouvem-se: “O AfD percebeu melhor do que os outros que as pessoas já não se sentem seguras” ou “concordamos com as ações do partido para diminuir a influência do Islão na Alemanha”.

Recuando no tempo, chegamos rapidamente aos anos 20, 30 e 40 do séc. XX, em que Adolf Hitler começou por ser líder do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, mas ascendeu a chanceler do reich e, posteriormente, a líder da Alemanha Nazi. As suas premissas? Manter uma raça superior (ariana), exterminar os “degenerados” (judeus, homossexuais, negros, ciganos, pessoas que apresentassem incapacidades físicas e/ou psicológicas etc.) e materializar tudo isto com o Holocausto – um flagelo, um extermínio de seis milhões de judeus e de cinco outros milhões de pessoas com que Hitler não se identificava e que achava que tinham de desaparecer.

Se tentarmos estabelecer um paralelismo entre o Alternativa para a Alemanha e o NSDAP, podemos ter algumas dificuldades, na medida em que os objetivos do primeiro (que são habitualmente apresentados) passam por medidas como a supressão do euro e a substituição do mesmo por uma moeda nacional, ou pela alteração dos tratados europeus. A questão é que a AfD divide-se em duas fações: aquela mais focada nas questões económicas (liderada por Bernd Lucke) e aquela que apresenta um discurso totalmente nacionalista, liderada por Frauke Petry. Frauke, química e executiva alemã, defende um controlo rígido das fronteiras e a restrição da entrada de muçulmanos na Alemanha (aliás, não é por acaso que estabelece uma estreita relação com o PEGIDA, ou seja, com os Europeus Patriotas contra a Islamização do Ocidente). Mas o perigo não fica por aqui – designa os media como “imprensa mentirosa” e insiste que a polícia das fronteiras alemãs deva disparar contra os refugiados que tentam entrar clandestinamente no país.

Existem características da extrema-direita que nos deviam deixar mal dispostos só de as lermos, como a crença no domínio de uma sociedade elitista sobre as massas inferiores ou as políticas anti-imigração e anti-integração.

Hitler costumava dizer: “Que sorte para os ditadores que os homens não pensem” – decidi “vir-vos com História”, para que, acima de tudo, compreendamos que “as histórias da Alemanha” constituem o espelho daquilo que poderá ocorrer no resto da Europa.

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