Cinema e Televisão

“Sin City”: O Prazer de Pecar

Bruce Willis, como John Hartigan, e Jessica Alba, como Nancy Callahan, o fruto proibido de Sin City. Fonte: IndieWire

Sin City (2005), dirigido por Frank Miller, Robert Rodriguez e Quentin Tarantino, é um filme de ação e suspense que dá vida a uma história em quadradinhos. Elaborado a partir de crónicas diferentes, concentra-se essencialmente no desenvolvimento de três personagens masculinas: Hartigan, um polícia que protege Nancy, uma stripper; Marv, um segurança em busca de vingança após o assassinato do seu verdadeiro amor e, por último, Dwight, um homem sedutor com um passado conturbado que se envolve com Ava, femme fatale, na sequência Sin City: A Dame To Kill.

Sem dúvida, Sin City, a cidade do pecado, acentua os estereótipos de género. Os homens são retratados como excessivamente machos e as mulheres como ajudantes atraentes. Verdade seja dita, o Superego da mente parece ausente em todos. Os homens procuram vingança e as mulheres desejam salvação. No entanto, nenhum deles parece preocupar-se com a moralidade ou com as consequências das suas ações.

Sigmund Freud, o filósofo do século XIX e fundador da psicanálise, diria que as personagens ignoram o seu Ego, a parte consciente do cérebro responsável por lidar com a realidade, porque se entregam ao seu Id, que representa o mundo inconsciente dos instintos e desejos. 

Efetivamente, até mesmo Hartigan, que recusou render-se à corrupção na qual a cidade está imersa, se afoga na própria pulsão de morte após rejeitar Nancy devido à diferença de idade. O seu caminho de autodestruição pode ser justificado pelo princípio do prazer, introduzido pelo neurologista austríaco. Baseado no facto de que os homens sentem a necessidade de concretizar os seus desejos primários e sexuais, o princípio explica o motivo da frustração de alguém incapaz de o fazer.

Além do modelo da estrutura psíquica da mente, observa-se outro aspeto fundamental: os homens sofrem, inconscientemente, da angústia de castração. Freud afirmou que esse processo psicológico é estimulado pela falta de apoio emocional durante a infância. Logo, apesar da aparência vigorosa, os protagonistas masculinos são mentalmente vulneráveis e temem que os seus órgãos sejam alvos durante as lutas. O vilão Roark Junior, o pedófilo sádico que sequestrou Nancy, não escapa das mãos de Hartigan. Os seus órgãos genitais são retirados, simbolizando a perda de poder.

A intensidade da obra cinematográfica é retratada através de um esquema de cores baseado em fotografia em preto e branco com toques de vermelho e amarelo, de forma a realçar certos elementos. O uso da cor é associado à dimensão poética e emocional do filme e estabelece uma ligação com a feminilidade. 

Josh Hartnett, como “O Coronel”, e Marley Shelton, como “A Cliente”, também conhecida como “A senhora do vestido vermelho”. Fonte: Internet Movie Database

Certamente, as mulheres adotam uma atitude subalterna à do homem. No filme, usam a sua sexualidade como indicador primordial da sua agência, parecendo desejáveis ​​a fim de atrair homens cuja personalidade protetora lhes agrada. Segundo a psicanálise, este comportamento é justificado pela inferioridade feminina. Apesar disso, muitas mulheres contribuíram para o avanço da teoria, transformando-a num método de tratamento psicológico. 

Além disso, como o título do filme sugere, uma miríade de crimes é cometida na cidade onde a intriga se passa. A influência de Anna Freud, na criação de Sin City, reside nos mecanismos de defesa que ela introduziu, sendo evocados pelos habitantes da cidade dos vícios. Abreviando, de acordo com a filha do neurologista, quando o Id se torna muito exigente, o Ego desenvolve mecanismos de defesa. Entre estes salienta-se a negação, o deslocamento em vez de sublimação e a automutilação.  

Como ilustração, quando Dwight é traído pela Ava, ele torna-se niilista. Isola-se e concentra-se nos seus desejos um mecanismo de defesa que o leva a entregar-se a caprichos tóxicos. Entretanto, cada personagem reage à dor de uma forma diferente. Nenhuma delas, talvez devido à ausência do Superego, toma a decisão de nutrir a sua vocação artística com as emoções negativas que sente.

Em conclusão, Sin City representa um mundo radical onde o Superego está longe de ser encontrado. Uma vez que os cidadãos não tiveram nenhuma moral instituída pelos seus responsáveis, não são capazes de separar o bom comportamento do mau comportamento. Como resultado, muitos assassinatos e incontáveis ​​pecados são cometidos. A inspiração dos cineastas nas teorias de Freud é percetível, especialmente por meio da referência implícita à divisão, em três partes, da estrutura da mente. Sem surpresa, Sin City é considerado um filme escrito por homens, sobre homens e para homens.

Artigo redigido por Marília Lúcia

Corrigido por Ana Janeiro

AUTORIA

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Aspirante a jornalista, nasceu no coração da Europa e foi laureada com o diploma do European Baccalaureate. O amor pela escrita está sempre presente na sua vida, sob a forma de diários de viagem e artigos de opinião. Sonha em ser redatora, vive da curiosidade e da criatividade. Desde nova, dedica-se a experiências que abrem os horizontes do seu mundo pessoal e profissional.