Opinião

A Vingança da Disney

O que é que aconteceu ao George Lucas? O que é que aconteceu ao homem responsável pela criação das melhores memórias de infância de meio mundo? O que é que aconteceu ao jovem cujo magnum opus revolucionou para sempre a cultura pop do planeta?

O realizador independente morreu para reencarnar um frio corporativista. O brilho da trilogia original da Guerra das Estrelas está fusco: os eternos efeitos especiais analógicos foram substituídos pelas imagens digitais absolutamente estéreis, aquando da realização das prequelas. O guião simplista mas charmoso da trilogia original foi enterrado para dar lugar ao jargão político e a um queijo-suíço argumentativo. A ideia, o conceito, a realização e a execução dos episódios I-III tem como objetivo singular a geração de dinheiro, através da produção em massa de brinquedos e videojogos.

Quando em 1999 Lucas obteve total controlo do processo criativo da saga que originou em 1977, o resultado foram três filmes capazes de manchar para sempre a reputação dos originais. O George precisava daquele desafio, daquele confronto de ideias, para saber filtrar o que devia ou não entrar nos filmes. Quando todos perderam a coragem de o enfrentar, dado o seu status, Lucas sentiu-se “perdido” e acabou por deixar fluir tudo o que saía da sua excessivamente fértil e esquizofrénica imaginação. Aposto dinheiro que o leitor não sabe que não foi Lucas a realizar “O Império Contra-ataca” e “O Regresso dos Jedi”. Quando removeu qualquer produtor, qualquer técnico, qualquer argumentista que lhe fazia frente, Lucas cometeu suicídio. Não vou listar todos os problemas ou inconsistências com a “Ameaça Fantasma”, o “Ataque dos Clones” e a “Vingança dos Sith”. Este não é o objetivo da crónica: não quero uma tese analítica exaustiva sobre as más práticas cinematográficas das prequelas. Sucintamente, refiro a atuação atroz do Hayden Christiensen como Anakin Skywalker (futuro Darth Vader), a violação da espiritualidade e misticidade da Força através da justificação que esta advém de “organismos celulares microscópicos” e a confusão do espectador, dada a ausência total da explicação de pontos fulcrais do plot dos filmes – para entendermos todo o contexto, teremos de consumir meia dúzia de adaptações literárias, de BD’s, videojogos etc… Só aí, as ações das personagens fazem o mínimo de sentido. Pagamos mais para perceber alguma coisa. É bom marketing, sem dúvida.

Para haver “Uma Nova Esperança”, precisava-se de sangue fresco.

Em 2012, a Disney comprou os direitos da Guerra das Estrelas a George Lucas. Primeiro pensei que se tratasse apenas de uma forma de fusão de empresas, tal como a Google fez com o Youtube. Depois veio o anúncio de uma nova trilogia de filmes. Automaticamente correu uma onda de ansiedade pelo meu corpo: outra vez não. “A ganância de Lucas não tem fim”, foi o meu pensamento na altura.

Larguei a pedra gigante que carregava, quando soube que o realizador do Episódio VII da Guerra das Estrelas ia ser JJ Abrams. Primeiro porque George Lucas não estaria envolvido no processo criativo e depois porque sempre tive um carinho especial pelo JJ, visto ter realizado a excelente re-imaginação do Star Trek.

Consta que Lucas tentou dar algumas ideias ao novo grupo de produção e, inclusive, ao JJ Abrams. Nenhuma foi aproveitada. A Disney foge de Lucas como se de um leproso se tratasse. É uma nova imagem que querem para a saga, uma nova génese. Querem apagar da memória do espectador qualquer vestígio das prequelas. Temem, com fundamento, que Lucas tente dar o seu pequeno “toque de midas”, tal como o fez ao mais recente Indiana Jones.

Estou impaciente, mas cauteloso. Uma coisa sei, pelo menos – é impossível o JJ fazer pior que isto.

CRÓNICA - A Vingança da Disney - João Carrilho (corpo do artigo)

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