Opinião

As Lacunas de um Ensino Viciado

Quantos de nós já nos devemos ter questionado sobre o sistema de ensino que perdura em Portugal e o porquê de a educação clássica estar de pedra e cal implantada no nosso país sem reforma aparente? Educação essa que é limitadora, pouco inclusiva e com pouca abertura para a inovação.

A questão pandémica talvez tenha vindo evidenciar as lacunas do sistema de ensino português ao mostrar o quão rudimentar esta ainda se mantém apesar do contexto tecnológico e, consequentemente, de mudanças e a exigência de capacidade de adaptação, evolução e aprendizagem constante em que se insere.

Como o Jornal Renascença apontou, o Conselho Nacional de Educação (CNE) reconhece que é necessário adaptar os currículos e as formas de ensino aos novos modelos da sociedade do conhecimento e da informação. Além disso, a reforma digital não deve limitar-se à sua digitalização, mas estender-se para a produção de novos conteúdos. Reforça-se a importância de que todas estas mudanças devem ser acompanhadas pela formação adequada e acompanhamento técnico e pedagógico dos professores. A educação em Portugal deveria permitir uma educação inclusiva, inovadora e adaptada às exigências do mundo dos dias de hoje, porque com o sistema de ensino atual as crianças e os adolescentes não estão a ser devidamente preparados para aquilo que lhes espera fora da sua bolha.

No entanto, o problema não começou com o aparecimento da pandemia – a falta de inovação, excesso de tradicionalidade e fraca inclusão no ensino português já eram notórios. É urgente romper com este sistema de ensino viciado. Nos tempos que correm, não faz sentido continuar a manter-se exatamente o mesmo programa de textos e obras de há anos que já se perdeu a conta. Não deveria começar a incluir-se textos e livros mais contemporâneos que, consequentemente, abordem temáticas discutidas atualmente em vez de se limitarem a trabalhar as mesmas obras de há 500 anos atrás?

Acredito que uma das grandes lacunas deste ensino seja a falta de fomentação do espírito crítico e a falta de inovação. Estamos presos a um sistema que não é de todo moldável. Ensinam-nos a absorver a informação que nos transmitem sem nos dar hipótese de a questionar. Aprendemos a decorar em vez de a pensar. Parece-me que o ensino português funciona como um modelo de ensino unilateral e de pura transmissão. Pelos motivos anunciados, o problema que aponto aqui é que o sistema de ensino está pensado como se funcionássemos como máquinas e não como seres pensadores. O sistema de avaliação não está preparado para os alunos pensarem, mas para decorar informação e a despejarem nos testes, desprovendo-se, assim, de pensamento crítico sobre que tema for.

Educação a mais | Imprensa Falsa
Fonte da imagem: imprensafalsa.com

Além disso, a educação sexual é um tema que continua muito à margem nas escolas, onde não é passada a importância do consentimento, respeito e muito menos é feita a sensibilização para a gravidade da violência imposta pelo patriarcado. A falta de consciência social, de empatia e do espírito ativista deve-se a este cenário redutor do conhecimento. Neste sentido, perpetuam-se comportamentos abusivos, preconceituosos e desrespeitosos na sociedade.

A permanência deste sistema de ensino “obriga” os jovens a procurar formas para se desenvolverem mais fora do contexto escolar, uma vez que nele não têm acesso às ferramentas necessárias para poderem ser competitivos e conseguirem acompanhar a imparável evolução. Estas formas exteriores ao sistema de ensino passam por: projetos externos, nomeadamente projetos das câmaras ou promovidos por empresas; leitura de livros mais contemporâneos que não integram o programa de ensino; pesquisa na Internet sobre determinados temas que não são abordados na escola; núcleos; iniciativas empreendedoras como Júnior Iniciativas e Júnior Empresas. Este último permite aos jovens universitários espalhados por todo o país ter uma experiência mais próxima do mercado de trabalho enquanto ainda tiram o curso. No fundo, pôr as mãos na massa e aprender fazendo, como é o caso da Júnior da nossa faculdade – a Bright Lisbon Agency.

Porém, este fenómeno é também por si problemático, porque esta proatividade não é garantida em todos os jovens. Não se pode generalizar que todos tenham condição de o ser, pois há fatores que podem impedir esta procura externa, nomeadamente: falta de acompanhamento dos pais ou de intelectualidade; problemas psicológicos (depressão, ansiedade, dislexia, etc); episódios de bullying ou cyberbullying; falta de recursos, entre outros. Deste modo, torna-se um desenvolvimento intelectual desequilibrado e injusto, sustentando as desigualdades de oportunidades e, consequentemente, desigualdades sociais.

Até quando é que nos vamos contentar com um sistema de ensino completamente desenquadrado das exigências do mundo moderno? Até quando é que vamos aceitar a ensinarem-nos a ver a vida a ser vivida como se estivéssemos do lado de fora da tela em vez de a viver no mundo atual? Quem faz o sistema continuar de pé somos nós, porque não o questionamos. Por isso, somos nós que podemos gerar mudanças. Quando é que estás disposto a aprender a pensar por ti?

É professor? O “Nobel” da Educação está de volta – Observador
Fonte da imagem: Observador

Fonte da imagem de destaque: revistamelhor.com.br

Artigo revisto por Ana Rita Sebastião

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