Leves na mão, pesados na mente
Gostavas de ser mais como o teu amigo que está sempre a ler e fá-lo por gosto? No entanto, sempre que pegas num livro, não consegues deixar de sentir uma sensação de sacrifício? Em parte, tal pode dever-se à perceção de veres tantas páginas à tua frente. Sentir o peso e a grossura do livro pode ser, de algum modo, intimidante.
Ler trabalha a mente, mas eventualmente cansa os olhos de qualquer um. E livros há-os aos milhares. Desde os mais volumosos aos que te cabem no bolso das calças. E é precisamente destes últimos que vamos falar, porque o objetivo é incentivar a leitura e não assustar tudo e todos. Para os menos habituados, há que começar devagarinho e ir aumentando a dose pouco a pouco. Ou simplesmente manter-se sempre pelos mais curtinhos. Afinal, um livro grande não é sinónimo de um grande livro. Assim, ficam aqui sugestões de livros fáceis para quem quer ler alguma coisa, mas sem grande compromisso, e para aqueles que, já cansados de livros enormes ou simplesmente de maus livros, podem encontrar leituras marcantes pela positiva.
O Senhor Ibrahim e as flores do Alcorão
De Eric-Emmanuel Schmitt
Como antecipa o próprio título, esta é a história do Senhor Ibrahim. No entanto, é ainda mais a história de Momo. Momo é um menino judeu que vive sozinho com o seu pai. Este é uma figura fria e distante na vida de Momo, até que chega o dia em que uma grande desgraça se dá na vida desta criança. É essa mudança de eventos que irá levar Momo à mercearia do Senhor Ibrahim, um velho senhor árabe, que é, desde o início, uma personagem carinhosa e acolhedora na vida do menino judeu.
Eric-Emmanuel Schmitt construiu aquela que é uma maravilhosa e comovente narrativa entre estas duas pessoas com vidas tão distintas, mas que acabam por ser tão próximas. Em poucas páginas, o leitor embarca numa viagem peculiar e que irá deixar uma lágrima no olho daquele que seja mais sensível.
Um livro para ler e reler. Como aliás, eu própria já o fiz.
Autobiography of Red
De Anne Carson
Esta, infelizmente, não é exceção às restantes obras de Anne Carson que não se encontram traduzidas para português. No entanto, é uma ótima escolha para quem domina o inglês ou, inclusivamente, gostaria de aperfeiçoar o domínio da língua. O vocabulário não é difícil e, como muitas das restantes obras aqui apresentadas, é extremamente curta e, por isso, fácil de começar e acabar. Esta obra é tudo menos entediante, até porque é uma história nada dentro daquilo a que estamos habituados a ver nas bancas.
A poetisa premiada pegou num mito grego antigo e transformou-o numa história pouco convencional entre dois jovens rapazes. Intercalado entre poema e prosa, temos a personagem Geryon que, além de ser um jovem, é ainda um monstro vermelho com asas.
Abusado pelo irmão e sem amor por parte da própria mãe, Geryon arranja conforto na sua câmara fotográfica e num rapaz chamado Herakles. Mas esta história de amor juvenil é também uma história de grande tristeza. A narrativa não é estática e salta entre este período inicial e o momento em que, anos mais tarde, os dois rapazes se reencontram.
Coroado com o título de “Livro Notável do Ano”, pelo The New York Times, é ainda descrito pelo The New York Times Book Review como uma “profunda história de amor, sensual e engraçada, potente, musical e frágil”.
O Alienista
De Machado de Assis
Machado de Assis é um nome poderoso por si só e este é, sem sombra de dúvida, um clássico da literatura brasileira. Simão Bacamarte é um médico que decide passar a ser psiquiatra e que começa um estudo acerca da loucura. O espaço da narrativa é Itaguaí. Aqui, Bacamarte funda uma casa intitulada de A Casa Verde, um hospício. A obra publicada em 1882, retrata um típico hospício desta época, onde se irão realizar experiências nos vários pacientes.
Uma série de acontecimentos que nos fazem questionar sobre comportamentos desviantes, a loucura, e sobre o que é, afinal, a normalidade.
O Velho e o Mar
De Ernest Hemingway
Quem não leu O Velho e o Mar deve pelo menos já ter ouvido falar deste clássico da literatura inglesa. O excecional Ernest Hemingway tem este como um dos seus romances mais conhecidos. Um livro curtinho, mas nem por isso menos sensacional. Dependendo das edições, é ainda possível encontrar pontualmente algumas ilustrações ao longo das páginas.
O personagem principal é Santiago, um velho pescador cubano. Depois de três meses sem conseguir pescar absolutamente nada, parte para o mar com o intuito de não voltar sem ter apanhado peixe.
O pescador cubano, que sofre de cancro da pele, irá deparar-se com uma grande luta em alto mar, com um enorme espadarte, que durará dias e dias. Será capaz de o trazer até terra?
Nesta aventura poética, Hemingway retrata a capacidade do homem para fazer face às dificuldades e adversidades da vida real. Uma obra para lá de comovente e que promete suscitar interesse nos leitores, tal como o autor tem vindo a fazer há mais de meio século.
O Velho e o Mar foi reconhecido com o Prémio Pulitzer, de 1952, e, dois anos mais tarde, valeu a Hemingway a conquista do Prémio Nobel da Literatura.
Os da Minha Rua
De Ondjaki
Ondjaki, escritor angolano, é um dos mais conceituados escritores da língua portuguesa. Em 2013, foi agraciado com o Prémio José Saramago pelo livro Os Transparentes. Porém, ao contrário deste último, Os da Minha Rua é uma obra que cabe no bolso. A história é autobiográfica e, tal como o nome indica, é sobre a rua e afins, bem como todos os que dela fazem parte e que fizeram também parte da infância de Ondjaki, em Luanda.
Um olhar pela contracapa permite-nos perceber a humanização do espaço “rua” na vida do autor: “Há espaços que são sempre nossos. E quem os habita, habita também em nós. Falamos da nossa rua, desse lugar que nos acompanha pela vida. A rua como espaço de descoberta, alegria, tristeza e amizade”.
God is Dead. God Remains Dead. And We Have Killed Him.
De Friedrich Nietzsche
Nietzsche ficou conhecido por muitos aspetos, mas esta frase é provavelmente das mais icónicas dele. O filósofo devastou a religião com inúmeras consequências sistémicas para as gerações que lhe sucederam.
Com Deus morto, este livro traça aquele que seria um futuro sem esta entidade superior a tudo e a todos. Ao fim e ao cabo, para o autor, o futuro da humanidade revela-se brilhante, pois todos os seres humanos iriam passar a ser responsáveis pelos seus próprios destinos. Este pequenino livro faz parte da coleção Penguin Great Ideas Series. No total, são 20 livros com uma lista variada de pensadores que contribuíram para o mundo dos dias de hoje.
Why Vegan? So the only question is: do animals other than man suffer?
De Peter Singer
À semelhança do livro anterior, também este faz parte dos pequeninos livros da Penguin Great Ideas Series. Os autores dos 20 livros variam entre estóicos, anarquistas, feministas, profetas, budistas e ainda aqueles que utilizam a sátira como principal forma de expressão.
No livro Why Vegan? temos acesso a uma compilação dos mais variados ensaios de Peter Singer na sua luta contra a exploração animal. Desde o início que a humanidade falhou em perceber quais as consequências daquilo que fazemos a outras espécies. Esta coletânea desperta-nos para aquela que é a gigantesca ameaça dos nossos hábitos à saúde pública e ao meio ambiente.
Reunindo cerca de cinco décadas de escrita, esta publicação inclui uma introdução, bem como nove ensaios. Este é um livro que promete mudar hábitos e alertar-nos para a grande tirania dos homens.
Mr Salary
De Sally Rooney
Sally Rooney tem sido um nome com grande projeção nos últimos tempos, e não é para menos. Depois das aclamadas obras como Normal People, Conversations With Friends e, mais recentemente, Beautiful People Where Are You, Sally Rooney tem um livrinho da espessura de um mindinho. Intitulado Mr Salary, já se encontra traduzido para português com o título Sr. Salário.
Pouco se pode dizer sem rapidamente contar a história toda, por isso convém ser o mais sucinto possível. Sukie vive com Nathan há alguns anos, depois de a mãe morrer e pelo pai ser uma pessoa bastante complicada. Agora os dois encontram-se num curto período da sua vida que se revela inevitável.
Sally Rooney é consistente no que toca à sua minúcia na construção do diálogo entre duas pessoas e mais ainda a criar tensão sexual e dinâmicas de poder e fragilidade.
Fonte da capa: Inês Alegria Ferreira
Artigo revisto por Catarina Peixe
AUTORIA
Lembro-me que em pequena tinha o desejo de pisar cada pequeno recanto do mundo. Assim que pude fugi da minha terra natal, onde a única coisa de que ainda tenho saudades é de comer tripa com chocolate enquanto apanho com um vento gelado no rosto e olho por entre o casaco para o mar bravo. Vim para Lisboa com o intuito de estudar algo que me fizesse realmente sentir feliz e realizada. Nos meus tempos livres o mais provável é encontrarem-me pelas ruas de Lisboa a tirar fotografias ou então enfiada numa biblioteca com uma pilha de livros à minha frente.
Gostei bastante.
Um beijo