Música

L’exception culturelle: em defesa da música e dos artistas franceses

Há 3 meses vim viver para a França. Durante a minha estadia descobri como o governo francês apoia a sua arte, os seus músicos e a sua música. O país como um todo defende a sua música e esforça-se para mantê-la viva. Em França existem condições necessárias para que bons músicos tenham sucesso e vivam da sua música. A França dá o exemplo, a Portugal e ao resto do mundo, do que é valorizar a cultura. 

Quando me falaram de L’exception culturelle soube que tinha de escrever sobre isso. L’exception culturelle é uma intervenção estatal para proteger a cultura francesa do capitalismo de livre mercado, da influência externa e da língua inglesa. Também se destina a manter a herança artística da França. Na prática, isto significa que o governo francês gasta 14 bilhões de euros por ano no mundo da cultura, o que representa um grande investimento, principalmente se comparado ao governo português, que é o terceiro da UE que menos investe em cultura.  

O governo francês também inventou o Passe de Cultura, que é um sistema de acesso a atividades culturais para jovens entre os quinze e os dezoito anos. Este vem na forma de uma aplicação móvel e da web gratuita, e permite que jovens inscritos disponham de um crédito que podem utilizar de forma autónoma, atribuído em função da sua idade, para que possam reservar ofertas culturais perto de casa. Uma vez aceite, é creditado na conta um montante de 300€ e o  utilizador deve então selecionar na aplicação as atividades, saídas, compras de equipamentos ou bens digitais e pagá-los diretamente online. O valor de 300€ pode ser utilizado uma ou mais vezes, consoante a atividade ou compra em causa. 

Mesmo não sendo uma ajuda direta aos músicos -, pois não se aplica apenas à música, mas a todas as atividades culturais -, indiretamente acaba por ajudá-los porque os jovens podem usar esse dinheiro para ir a concertos ou para comprar CDs. Entendo que a intenção é incentivar os jovens a envolverem-se na arte e na cultura, mas é um pouco bizarro dar tanto dinheiro a pessoas tão jovens. Existe também o risco de os beneficiários acabarem por gastar o dinheiro em concertos de artistas internacionais, o que acaba por não ajudar os artistas nacionais.

O governo também estabelece regras que as estações de rádio francesas devem cumprir. Para estações de rádio privadas, existem regras para a transmissão de músicas em francês. Prevê que “a proporção substancial de obras musicais em expressão francesa ou executadas em uma língua regional em uso na França deve atingir um mínimo de 40% de canções em expressão francesa”. Aparentemente a intenção é proteger a língua francesa, provavelmente da língua inglesa que domina o mundo da música. Mesmo que a intenção não seja promover os artistas, inevitavelmente acaba por fazê-lo. Estão também previstas proporções específicas para algumas rádios: uma para as rádios especializadas na promoção de jovens talentos, que prevê a obrigatoriedade de emissão de 35% de canções em língua francesa e 25% de novos talentos, outra para as chamadas rádios “patrimoniais”, que prevê a obrigatoriedade de transmissão de, pelo menos, 60% de canções em francês e uma percentagem de novas produções de até 10% com, em média, uma nova produção em francês por hora, sendo avaliado o cumprimento dessas duas obrigações mensalmente para horas significativas de audição. Em Portugal também existe a lei da rádio, mas a quota é 30% de música Portuguesa – sem especificar a língua cantada na música. 

Fonte: French culture An ‘exception’ to be protected

As pessoas que trabalham nas artes (atores, diretores, músicos, palhaços, maquilhadores, …) são conhecidas como les intermittents du spectable. Por se considerar que estas profissões são instáveis, os les intermittents du spectable recebem dinheiro quando não estão a trabalhar, dinheiro esse que é subsidiado pelo Estado e por contribuições. 

Este investimento ajuda os músicos a produzirem e a promoverem a sua música. Parece-me que, com todos os apoios, seja mais fácil para os músicos franceses terem estabilidade financeira do que para os músicos portugueses. É claro que o investimento não poderá ser o mesmo, visto que a riqueza e dimensão dos dois países não é igual, mas Portugal pode inspirar-se em algumas medidas francesas. Apesar de algumas medidas serem um pouco excessivas, o valor dado às artes é louvável. 

Fonte da capa: Exame

Artigo revisto por Mariana Saião

AUTORIA

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A Catarina tem uma paixão enorme pela escrita e pela criação, estando a licenciar-se em jornalismo na ESCS. Gosta de juntar palavras para contar histórias e estima ver as suas ideias em tinta e papel. Juntou-se à ESCS Magazine para fazer o que mais ama.