Literatura

E se a morte tivesse hora marcada? Em “Os Imortalistas”, Chloe Benjamin dá-nos a resposta

No livro do bookclub deste mês nem precisamos de ler a contracapa para sabermos que precisamos de ler. Em “Os Imortalistas”, Chloe Benjamin agarra-nos pela garganta, qual plot twist inesperado e provoca-nos com uma ferroada de curiosidade à qual ninguém consegue resistir.

Aquilo que sabemos no início deste jogo é simples: quatro irmãos (os Gold) aborrecidos num verão quente de 1969, que tem lugar no Lower East Side, de Nova Iorque, não conseguem resistir à tentação de visitar uma mulher que prevê a data da morte das pessoas. 

Antes de partirmos para mais, preciso de deixar aqui esclarecido que este livro mexe com a curiosidade mais sombria de todos nós. De uma forma ou de outra, já nos apanhámos a percorrer este caminho “onde, quando, como, porquê, quem?” – um verdadeiro lead de uma peça jornalística -, por isso, nada mais natural para “Os Imortalistas” do que o ter chegado ao número #1 do The New York Times.

Para além desta premissa incrível, que é um instant graber, a autora discutiu já como as outras temáticas presentes no livro a ajudaram a moldar o tom melancólico do mesmo, bem como a dar credibilidade à profecia que cada um dos irmãos Gold recebe. 

Saúde, sexualidade, religião (no caso dos irmão Gold, o Judaísmo), profissão, relações, família, estão entre os muitos fatores, na qualidade de coisas que fazem intrinsecamente parte de nós e com as quais lidamos no dia a dia que definem a forma como vivemos e, consequentemente, morremos. 

Todos estes tópicos estão profundamente enraizados na vida da própria autora, em especial a família (ela descreve a sua como não convencional) e a religião (os seus avós eram Judeus); aliás, a própria autora utilizou muito dos bisavós, como as profissões aquando da chegada à América, em alguns dos personagens que desenvolveu em “Os Imortalistas”.

Chloe Benjamin não é um nome estranho na ficção. Em 2013, lançou  “A Anatomia dos Sonhos”, que lhe rendeu um Edna Ferber Fiction Book Award mais tarde, e, antes ainda de lançar “Os Imortalistas”, completou um Mestrado em ficção, o que provavelmente explica o seu amor pela escrita criativa. 

Como já comecei a mergulhar nesta história, sei que a casa de partida do livro começa com os quatro, mas que depois se divide. Cada capítulo é reservado para cada um deles, mas não esperem capítulos curtos – é como se dentro deste livro habitassem, de facto, quatro livros distintos. 

Se não ficou claro até agora, este livro move-se porque se emaranha profundamente com a nossa necessidade humana de dar resposta e sentido a tudo, por isso, qual não é a minha surpresa, sendo que este livro parte da premissa de dar uma resposta certeira a um desejo obscuro, quando descubro que a autora coloca a “incerteza” como palavra que o define. 

Talvez a “incerteza” seja esse desejo de saber e, neste caso, mesmo com a resposta, a angústia que se apodera de cada um dos personagens. Podemos só imaginar como seria ser-nos dado um dia, um mês, um ano e ir vivendo até que essa data se começasse a tornar real. Acreditaríamos ou não? Quanto tempo aguentaríamos sem que a água exercesse tanta pressão que rebentasse a barragem? 

Ouvimos várias vezes que a ignorância é uma bênção e eu não tenho dúvidas de que é essa uma das principais mensagens do livro, porque até que ponto o que aquela vidente lhes disse não moldou a forma como viveram ou como olharam para a linha temporal das suas realidades? Talvez este romance se mova entre a solidez de uma previsão que, embora diferente para todos, contém em si a mesma mensagem e a forma como cada indivíduo com todas as suas particularidades, forças e fraquezas lida com o conteúdo daquilo que lhe foi dito.

De certa forma, isso faz-nos pensar no impacto daquilo que cada um de nós diz e recebe constantemente dos outros e como isso nos molda, como nos constrange e nos faz viver e experienciar o mundo.

Estou ansiosa pelo fim do mês, para poder falar mais com vocês sobre esta história e principalmente sobre estes personagens que parecem ter tanto daquilo que nos caracteriza enquanto pessoas.  

Fotografia de Imagem de Capa de Sara Cardoso

Artigo revisto por Inês Pinto

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