Grande Entrevista e Reportagem

Sou estudante e vivo uma pandemia. E agora?

Uma pandemia deu-se e fomos todos para casa, mas continuámos sempre a trabalhar. Quer estejas no ensino básico, quer estejas no ensino secundário ou superior, os efeitos do confinamento foram notoriamente negativos.

Nunca pensámos que um ano depois da última apresentação presencial daquele trabalho chato estaríamos por casa a fazer as belas das apresentações, testes ou exames de forma online. Nunca digas nunca!

Francisco José Oliveira Silva. Fotografia cedida pelo mesmo.

O Francisco tem 19 anos e está a acabar o 12.º ano, no Colégio Rainha Dona Leonor. Em primeiro lugar, sente que a sua atenção nas aulas online em nada tem a ver com a atenção durante as aulas presenciais. Quem mais?

Para além disso, conta que a adaptação das aulas ao ensino à distância não foi algo fácil, mas que com o passar do tempo se foi habituando à nova realidade. Acrescenta que muitas vezes teve dificuldade no acesso à Internet, por existirem muitas pessoas ligadas à mesma rede.

Adicionalmente, o estudante sente que estando tanto tempo dentro de casa o leva a ficar aborrecido e não tem vontade de ter aulas, pois a rotina acaba por ser sempre a mesma e, não tendo contacto com o exterior nem com os amigos, sente que o seu rendimento não é tão proveitoso.

Constata que, numa sala de aula, quando se distrai, não há muito que possa fazer e, por isso, mais vale aproveitar as horas para trabalhar. Por oposição, quanto à sua concentração nas aulas em regime online, há uma maior possibilidade de distração.

O Francisco considera que o impacto negativo de ser um estudante a viver em pandemia deve-se ao facto de estar numa idade onde a comunicação e o contacto com as pessoas é essencial, e, por consequência do confinamento, tornou-se impossível, ainda que contacte com os seus amigos pela Internet ou faça mesmo chamadas. Acrescenta: é totalmente diferente de estares com uma pessoa

Por um lado, considera ter saído prejudicado com o ensino à distância, devido ao facto de alguns professores não estarem preparados para este novo tipo de ensino. Por outro, diz que alguns outros alteraram as percentagens de algumas avaliações e aumentaram noutras para não prejudicar tanto os alunos.

Por fim, o Caldense garante que conseguiu manter as rotinas que tinha antes do confinamento.

Como não tinha de me deslocar muito para a escola e para casa, consegui distribuir mais o meu tempo para trabalhos de escola e para coisas que gostava de fazer”.

Sabrina Alexandra dos Santos Vieira. Fotografia cedida pela própria.

A Sabrina tem 20 anos e estuda na Faculdade de Arquitetura de Coimbra.

Primeiramente, a estudante conta que a maior diferença que sentiu em relação à sua aprendizagem se deveu ao aumento significativo de trabalhos propostos pelos docentes, o que considera ter condicionado, em parte, o bom desempenho e aproveitamento em algumas cadeiras.

Por estudar Arquitetura e por ser uma área de estudos bastante prática, conta que o ensino à distância dificultou bastante a comunicação com os seus professores.

Desabafa que a ausência de uma rotina mais dinâmica, como o simples facto de ter de se deslocar até à faculdade para ter aulas, resultou em alguma desmotivação e frustração, a uma certa altura.

Sabrina afirma que o impacto mais negativo de ser uma estudante a viver uma pandemia foi, não só o facto de o seu aproveitamento durante as aulas não ter sido melhor, mas também a privação de viver o lado mais académico, algo que a inquieta.

Para ela, os seus dias eram passados maioritariamente à frente do computador a assistir às aulas online, depois tentava despachar alguns trabalhos e, durante os tempos livres, distribuía o tempo para cuidar de si própria e cumprir algumas tarefas domésticas.

Naturalmente, sentiu que o que mais a prejudicou com o ensino à distância foi o excesso de stress e a interferência na sua sanidade mental.

Ainda assim, conta que os hábitos que a ajudaram a conseguir lidar melhor com o confinamento foram a prática diária de exercício físico, tal como ter sempre um tempinho para estar em contacto com a natureza.

Por um lado, considera que existiu uma certa adaptação por parte dos docentes, no sentido em que cancelaram a obrigatoriedade de maquetes em algumas cadeiras, por exemplo. Mas, por outro lado, “acho que exigiram muito mais de nós e o nosso dia continuou a ter apenas 24 horas, conta.

Em jeito de conclusão, Sabrina garante que a última entrega final de projeto foi o trabalho que lhe deu mais prazer fazer durante a pandemia, visto que depois pôde finalmente descontrair.


O Hugo tem 22 anos e está no 2.º ano do Mestrado Integrado em Medicina, na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.

Em primeiro lugar, o estudante de Medicina conta que o seu processo de aprendizagem ideal envolve o estudo em espaços silenciosos, onde se consiga focar a 100% nos seus objetivos escolares, sempre intercalados com pausas (onde vai à cafetaria ou simplesmente apanhar ar e falar com amigos) e por momentos de descanso e de lazer exteriores à esfera académica, como dá o exemplo das atividades extracurriculares e festas com amigos.

Hugo Miguel Seno. Fotografia cedida pelo próprio.

Conta que a pandemia veio alterar por completo a dinâmica de trabalho que tem vindo a construir, obrigando-o a adaptar-se a novas estratégias de estudo. “Em casa, ainda me é difícil manter o nível de produtividade que tinha anteriormente, havendo sempre inúmeros fatores de distração que me impedem de me manter tão concentrado como antigamente, diz.

A maior dificuldade de Hugo no acompanhamento de aulas em formato online deve-se ao facto de essas aulas exigirem um maior grau de concentração, visto que são menos dinâmicas, por comparação às presenciais. Além disso, admite que é sempre necessário saber lidar com possíveis fatores de distração por estar em casa. 

Se, por um lado, sente que a pandemia lhe impossibilitou a vivência de inúmeras experiências sociais e profissionais associadas ao contexto académico que talvez não serão possíveis de viver, por outro, sente que o confinamento lhe possibilitou investir mais tempo em hobbies que tinha deixado de lado quando ingressou na faculdade.

O estudante conta que durante o confinamento procurou estabelecer rotinas, tentava acordar o mais cedo possível para se focar nas suas obrigações académicas e despachá-las o quanto antes. Durante a tarde, tirava sempre uma hora para se dedicar ao exercício físico. Ao longo da noite raramente estudava, sendo o tempo que sempre tentou dedicar a si próprio, seja a falar com amigos em chamada, seja a jogar, seja a tocar guitarra ou a ver filmes, por exemplo.

Para além disto, o estudante de Medicina garante que onde saiu mais prejudicado com a pandemia foi na falta de experiência prática em algumas áreas do saber, dá ainda o exemplo:

Por exemplo, no Mestrado Integrado em Medicina, nos anos iniciais, é importante adquirir alguma experiência laboratorial – saber usar o microscópio, saber mexer em “utensílios” laboratoriais…Que acabou por nos ser privada ou bastante reduzida”

Expressa que o que mais sentiu falta foi do contacto pessoal e todas as experiências sociais. Mas, ainda assim, conseguiu manter as suas rotinas anteriores à Covid: A estratégia passou sempre por traçar objetivos diários e semanais, ambiciosos e realistas tendo em vista os meus deveres profissionais e metas pessoais”.

Andreia Daniela dos Santos Vieira. Fotografia cedida pela própria.

Andreia tem 26 anos e é Mestre em Química pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra.

Quando a pandemia começou, Andreia já estava a frequentar o último ano do Mestrado, no ano de estágio, que, no seu caso, foi uma elaboração de um projeto de investigação, por isso, assegura que a pandemia não teve impacto na sua experiência de aprendizagem propriamente, pois já não tinha aulas. Ainda assim, garante que a maior diferença que sentiu em relação ao pré-Covid em relação ao seu estágio foi a falta de tempo.

Estive, de 6 de março até 26 de maio, sem conseguir frequentar o laboratório e depois quando voltei só podia trabalhar semana sim, semana não. Por isso sem dúvida que a corrida contra o tempo foi a maior dificuldade que tive”.

A atual trabalhadora conta que o seu rendimento baixou imenso desde março até maio, sentindo-se muito desmotivada, pelo facto de o seu trabalho no laboratório ter parado. Assim, não sabia quando ia voltar nem o que iria conseguir fazer no tempo que lhe restava.

No entanto, sente que o impacto positivo de ser estudante numa fase de pandemia foi a possibilidade de ter passado muito tempo em casa, o que já não acontecia desde que foi para a faculdade. Consegui aproveitar muito bem o tempo com a minha família”. 

Adicionalmente, conta que durante o confinamento tomou a decisão de fazer mais pela sua saúde e bem-estar e tentar recuperar tudo o que tinha “perdido” por falta de tempo. Assim sendo, dedicou-se a coisas simples de que gostava e nunca fazia. Começava por fazer exercício todos os dias durante a manhã, cozinhou muito (algo que adora) e durante o resto do dia fazia aquilo que lhe apetecia na altura. “Todos os dias eram diferentes, diz.

Desabafa que sentiu falta de falar com alguém fora de casa, dos cafés depois de jantares com amigos, mas conteve-se. Segurança e responsabilidade em primeiro lugar.

Acrescenta ainda que estranhamente foi muito mais saudável durante o confinamento do que era antes. Criei hábitos mais saudáveis e úteis

A experiência de cada estudante varia, mas, como leste, há muita coisa positiva que pode ser criada ao estarmos em casa. Procura hábitos antigos de que sintas falta, volta a pegar na tua guitarra, cozinha para a família, corre com o teu animal de estimação, faz roupinhas ou descansa apenas. Sai desta pandemia com uma rotina mais saudável e positiva.

Artigo revisto por Maria Ponce Madeira

AUTORIA

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Sempre quis pilotar aviões, mas a vida mudou-lhe os planos e descobriu o prazer na escrita. Movida a desafios e curiosidade, a Mariana adora correr, meditar e trabalhar em multimédia. Pensa no futuro mas vive muito o presente, confia na vida e sabe que vai ter sempre um lugar para a escrita. Nasceu em Lisboa mas vive nas Caldinhas, “o oeste é vida”, garante. Perde-se no mar, mas o surf dá-lhe vida.