A Enologia para Principiantes – Pt. 2
No último artigo falámos sobre os diferentes tipos de vinho, como harmonizá-los e, também, sobre a perlage e a doçura. Agora, nesta segunda parte da enologia para principiantes, vamos falar sobre outros aspetos do vinho, nomeadamente a cor, os taninos, a acidez, o álcool e a temperatura de serviço.
A cor
A cor do vinho é muito mais do que uma componente estética: permite saber características do vinho, como a acidez ou até a idade.
Começando pelo início: as antocianinas são os compostos fenólicos do vinho que lhe dão cor. Como? Estas antocianinas absorvem as ondas que refletem as cores na faixa de luz visível para os humanos, gerando uma coloração vermelha e azulada. No caso do vinho branco, a fraca presença do mosto – o sumo da uva antes de ser fermentado – reage com ácidos orgânicos do vinho, gerando uma coloração verde, amarela ou dourada.
Ora, compreendida esta parte mais científica, onde é que está, então, a cor? Normalmente está na película da uva, aquilo a que os comuns mortais chamam casca – apesar de em certas castas, como a Alicante Bouschet, também haver matéria corante na polpa. E é aqui que entram as antocianinas: quanto mais longa a maturação, maiores as antocianinas da uva e, consequentemente, maior a intensidade da cor.
Quando disse que a cor permitia saber, logo à partida, o nível de acidez de um vinho, não estava a brincar. Um vinho com uma cor vermelha terá um pH mais baixo e, logo, uma acidez mais elevada, enquanto que um vinho mais arroxeado, com tons mais azuis, será menos ácido.
Também não estava a brincar quando disse que a cor do vinho permitia ter uma noção da idade. Isto acontece porque, com o passar do tempo, o vinho vai oxidando e os polímeros – os responsáveis pela oxidação – têm uma cor acastanhada. Assim, um vinho tinto de tom acastanhado ou um branco escurecido são, por isso, vinhos velhos.
Vamos agora falar do triângulo de prova de um vinho: a acidez, os taninos e o álcool. Os três juntos determinam o equilíbrio e harmonia desta nossa bebida.
A acidez
A acidez do vinho é medida em gramas/litro de ácido tartárico, porque a uva é um fruto rico neste ácido, tendo também muito do málico, mas quase nenhum ácido cítrico. Ora, um ácido em solução liberta hidrogénio, gerando um pH mais baixo e, logo, dando potência à acidez do vinho.
Outra coisa que influencia a acidez é a fotossíntese das videiras, porque esta impacta a degradação dos ácidos dos bagos.
Nos vinhos há três tipos de acidez que podem ser analisadas: a total, a fixa e a volátil. Estas estão regulamentadas por lei, mas vou poupar-vos à explicação matemática dos seus cálculos. No entanto, é importante saber que a acidez do vinho é crucial para se poder equilibrar o teor em álcool, em açúcar residual e, no caso dos tintos, equilibrar também os taninos. É importante perceber que um vinho bem equilibrado envelhecerá muito melhor quando fechado numa garrafa.
Os taninos
Vamos começar com o que é importante nos taninos: fazem bem à saúde. Os taninos têm muitos antioxidantes e provocam o aumento do colesterol bom, funcionando ainda como anti-trombose, reduzindo os AVC e diminuindo o desenvolvimento da arteriosclerose. Ou seja, beber vinho tinto é ainda melhor do que ir ao médico, certo? Errado. O vinho não vive só de taninos… Mas já lá vamos.
Os taninos podem ser condensados, o nome dado aos que provêm da uva, e hidrolisáveis, os que provêm de fora – ou seja, as barricas de carvalho, as aparas, etc. – ,e são um dos compostos fenólicos mais importantes na enologia. O outro composto são as tais antocianinas de que já falámos e que dão cor ao vinho tinto.
Ora, estes nossos amigos, além de contribuírem na coloração, são os responsáveis pelo sabor amargo desta bebida e a sensação ao beber, que pode ser seca, macia, áspera, como se a língua tocasse em veludo… Mas os taninos não são os únicos responsáveis por isto: também a maturação da uva ou a qualidade da barrica de estágio. Assim, se já provaram vários vinhos tintos podem ter percebido que os vinhos mais ácidos são normalmente mais amargos e mais ásperos, enquanto os vinhos mais doces são menos.
Já vimos, então, que os taninos são um dos compostos fenólicos dos tintos através dos quais ocorre o envelhecimento. Com o passar do tempo o vinho perde a cor e a doçura, mas ganha suavidade e elegância.
O álcool
Contrariamente aos taninos, o álcool é matreiro porque é facilmente tóxico e de rápida absorção pelo aparelho digestivo. O consumo baixo ou moderado de álcool pode diminuir doenças coronárias, mas, por outro lado, o seu consumo excessivo gera muitas doenças e leva à dependência.
No vinho, o álcool presente é o etanol/etílico e surge durante o processo de levedura da uva, tornando o açúcar em álcool. Ora, se este componente do vinho é basicamente açúcar transformado, quanto maior o teor de álcool, maior a doçura do vinho. Mas também, maior a gordura.
Portanto, o álcool surge naturalmente no processo de fermentação do vinho, mas também pode ser acrescentado. Abafados é o nome que damos àqueles vinhos a que se acrescentou álcool antes da fermentação começar, enquanto que aos licorosos ou generosos, como o vinho do Porto, se acrescenta álcool durante o processo.
As leveduras
São fungos e estão por todo o lado: na uva, no ar, no chão, nas patinhas dos insetos… E como se não bastasse há as leveduras “boas” e as “más”. E as más podem ser mesmo muito más – uma má bactéria de levedura pode arruinar uma colheita. A Saccharomyces cerevisiae, no entanto, é uma das boas e a principal responsável pela fermentação alcoólica, ajudando também a aromatizar o vinho. Por estes motivos, desenvolveram-se em laboratório as LSA, leveduras secas ativas, que permitem apurar o vinho. Claro que isto levou a uma divergência quanto à elaboração do vinho: leveduras nativas, que expressam o terroir (vinha, casta, clima do ano e solo) ou leveduras selecionadas, que permitem o máximo do sabor, garantindo o aproveitamento da colheita e muito provavelmente as vendas, mas quebrando a autenticidade?
A enologia é realmente um mundo muito complexo, do qual já desvendámos algumas partes, mas… mais está para vir!
Fonte da capa: Pinterest
Artigo revisto por Beatriz Merêncio
AUTORIA
A determinada altura percebeu que o melhor era levar a vida com leveza e humor e isto está presente também na sua escrita. Contudo, como acontece a todos, às vezes também se sente confusa, mas escrever sobre o que está a sentir ajuda-a sempre a clarificar e arrumar as ideias na cabeça. Na ESCS Magazine encontrou um espaço onde pode escrever sobre vários temas que são do seu interesse.