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As fadas do lar

A carga mental que resulta das desigualdades na divisão das tarefas domésticas

Para a mulher fazer tudo aquilo que lhe é exigido (ou que exige a ela mesma) precisava de um dia com muito mais do que 24 horas. Partilhar o tempo entre o trabalho, a família e ela mesma nem sempre é fácil, e só piora quando a divisão de tarefas entre o casal é desigual – e não é pouco. Será que a mulher tem de ser uma eterna fada do lar?

Elas crescem a brincar às “donas de casa” e eles crescem a brincar com carros. Elas aos 15 anos já devem saber ser mulherzinhas (o que quer que isso queira dizer) e eles podem ser imaturos porque os homens “crescem mais devagar”. Elas ficam em casa a tomar conta dos filhos doentes e eles têm o papel de ir trabalhar à mesma. Por que será que ainda existe um papel de mulher e outro de homem? Já evoluímos muito, mas ainda há muito mais por avançar.

Segundo um estudo divulgado em 2021, com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) e do Eurostat, 78% das mulheres trabalhadoras fazem no mínimo uma hora de trabalho doméstico por dia, enquanto apenas 19% dos homens o fazem. Isso quer dizer que 8 em cada 10 mulheres, mesmo depois de um dia inteiro de trabalho, chegam a casa e tratam de algo; já apenas 2 em cada 10 homens chegam do trabalho e continuam o dia com tarefas. Continuam a ser as mulheres a fazer o jantar e a dar banho aos filhos. Contudo, este novo conceito de “carga mental” relacionado com as questões de igualdade de género não é de agora – o trabalho não pago realizado pelas mulheres é um problema que se perpetua já há muito tempo e a maioria das pessoas começa a ter mais consciência sobre o assunto.

Mas o que é, afinal, a “carga mental”? Este termo é frequentemente utilizado para descrever uma situação de pressão psicológica dada pela sobrecarga de responsabilidades e tarefas. No caso das mulheres, recai constantemente nas responsabilidades domésticas, familiares e, não esquecendo, individuais – igualmente importantes. A conciliação destas três decisivas e distintas partes da vida é um tema dominante no universo feminino quando se fala sobre constituir uma família. A carga mental é um fator crucial para a organização social e económica, o que representa um verdadeiro obstáculo para o avanço e evolução de carreiras (e não só).

A verdade é que a carga mental que recai sobre as mulheres acaba por fazer com que se sintam mais cansadas e sem motivação para as outras coisas que também deveriam fazer parte do seu dia. “As mulheres estão exaustas. Não só porque fazem muito, mas também porque começam a sentir que não conseguem fazer tudo e entram na sensação de culpa e de vergonha”, explicou a psicóloga Ana Isabel Lage Ferreira numa entrevista à CNN Portugal (quem nunca ouviu que mulheres conseguem – ou devem conseguir – fazer tudo ao mesmo tempo?). Os simples atos de escolher com quem deixar o filho, decidir o que cozinhar para o jantar ou perceber que fatura é que tem de pagar, feitos repetidamente, levam a mulher a um ciclo de burnout e depressão. Nem todas passarão por estes dilemas, mas a grande maioria experiencia este tipo de sentimentos todos os dias. Para estas mulheres, revelamos uma informação: serão precisas cinco a seis gerações para que o trabalho não pago relativo a tarefas domésticas seja igual entre casais heterossexuais.

Não conseguimos precisar onde nem quando o problema começou, mas podemos dizer que estas práticas, inocentemente ou não, são passadas de geração em geração de uma forma quase “espontânea”. Quando chegamos a casa, quem está a passar a roupa a ferro? A mãe. E quem está a lavar a louça? A mãe. Em contrapartida, quem está no sofá a ver o jogo de futebol? O pai, a figura masculina da casa. Nem todos crescemos de igual forma, e sabe-se que o contrário também acontece. Mas não podemos deixar de falar da situação que é mais comum. O arrastar deste problema deixa a mulher numa situação delicada, cada vez mais exausta. Não existe tempo para ela, para o seu “me time”, e acaba por ficar para segundo plano na sua própria vida. Será isto aceitável?

Nós queremos que os nossos filhos cheguem a casa e vejam tanto o pai como a mãe a fazerem o jantar. Não queremos que o nosso futuro cresça a ver o errado; não queremos que eles acreditem na fábula que nos é contada desde sempre. Nós não queremos perpetuar este gigante problema. E tu, o que queres?

Fonte da capa: Pexels

Artigo revisto por Beatriz Neves

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