Cinema e Televisão

Na sombra do guerreiro

Eastwood à procura da redenção num dos grandes filmes americanos deste século. A última obra prima do americano que soa a despedida. Paira na sombra o inesquecível “Bill Munny”, de Imperdoável.

(Fonte IMDB)

Em Grand Torino, tudo gira à volta da redenção. Inicialmente, Eastwood nem queria interpretar o papel do protagonista, Walt Kowalski, mas acabou por ceder à tentação de voltar a interpretar um “velho durão”. Kowalski é um veterano da guerra da Coreia – vive sozinho, é reformado, acabara de perder a mulher e tem os filhos ausentes. Para além da sua cadela Daisy, a sua arma é a única coisa na qual confia. Dos antigos vizinhos, nenhum ficou. O bairro é agora habitado, principalmente, por imigrantes asiáticos, os quais Walt despreza profundamente. Um dia, Thao, um dos seus jovens vizinhos, é pressionado por um gangue e tenta roubar o precioso Ford Gran Torino de Walt. Este impede o furto, tornando-se o herói involuntário do bairro, o que o força a entrar no mundo da comunidade que ele tanto despreza.  Durante todo o filme, Eastwood monta e desmonta os grandes estereótipos da sociedade americana – ei-lo durão, mas a ceder levemente a eles enquanto a narrativa avança, ao jeito de uma redenção.

Há toda uma tensão no ar, como se fosse um dos westerns de Eastwood. No entanto, em Gran Torino não são os tiros que nos impressionam, mas sim a simplicidade com a qual se trata das coisas, como na magnífica cena em que Kowalski introduz o jovem Thao ao seu barbeiro – uma das grandes cenas da história recente do cinema – ou quando este salva a irmã de Thao de uns rufias do bairro.

( Fonte Movieplayer)

É Eastwood a dar uma aula de cinema americano ao espetador sem lhe pedir nada em troca. É formidável a forma como nos leva, no filme, a um destino inevitável, a um sacrifício final, tal como em Imperdoável, outra obra prima do cinema americano. “Bill Munny” espreita pelas ruelas do bairro de Kowalski como se acenasse ligeiramente ao espetador. Como se, por momentos, o “mundo” de Imperdoável se intrometesse no de Gran torino.

Após Gran Torino, Eastwood voltou a realizar, mas nunca sem a tenuidade deste assombroso filme. Já se sabe que no seu próximo filme, A Mula, voltará à representação, juntando também a direção. Talvez isso nos dê uma secreta esperança de que a perfeição do bairro por onde Kowalski deambulou se volte a repetir, mesmo que por breves momentos, como uma última dança numa obra prima.

Artigo revisto por Sara Tomé

AUTORIA

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Olá, sou o Luís, tenho 27 anos e nasci em Cascais. Vivo desde, quase sempre, em Sintra e sinto-me um Sintrense de gema.  Adoro cinema - bem, adorar não é a palavra adequada, venerar parece-me um adjetivo mais justo -  e sou também obcecado por política e relações internacionais. Gosto também muito de desporto.